Previdência: uns dos problemas são os caloteiros
Dívidas, isenções, renúncias tributárias e cara de pau: como os setores mais ricos prejudicam as contas da Previdência
Publicado: 17 Outubro, 2016 - 17h04 | Última modificação: 18 Outubro, 2016 - 15h06
Escrito por: Isaías Dalle
A mídia e alguns especialistas só não reagiram de maneira mais ostensiva porque os números são fidedignos. Mas não gostaram nada de estudo divulgado no último dia 7 pelo Dieese, intitulado “Proposta das Centrais Sindicais para a reforma da Previdência Social”.
A principal razão é o fato de o estudo dar especial destaque para as dívidas que determinados setores empresariais têm com a Previdência, para as isenções tributárias, para manobras como uso do dinheiro para outras finalidades – através das Desvinculações de Receitas da União (DRU), por exemplo – e a ausência de aplicação de conceitos já previstos na Constituição Federal, como a tributação de recursos das loterias e jogos de azar.
Além de defender, mais uma vez, a ideia de que a Seguridade Social, vista globalmente, não tem déficit, o popularmente chamado “rombo”. Portanto, o Dieese, novamente, denuncia que a soma das contribuições menos o montante de benefícios pagos (contribuições – benefícios) é uma operação matemática que não representa a verdade sobre as fontes de financiamento da Seguridade, da qual a Previdência é integrante.
Confira a contabilidade mais recente da Previdência, neste gráfico trazido pelo estudo do Dieese:
As receitas da Seguridade superam as depesas...
... o que resulta em superávit (último quadro à direita)
Truque
Há outro truque do governo federal para “aumentar” as despesas. Em seus levantamentos mais recentes, está incluindo nos gastos da Previdência as aposentadorias e pensões pagas aos servidores públicos. Mas, na verdade, estes estão em outro sistema, com orçamento próprio. O Dieese apenas aponta essa manobra como falsa.
Concentrando-se no que é verificável, o Dieese, em nome das centrais, propõe, então, o combate e a correção de alguns desses problemas, medidas que trariam para a Previdência, de imediato, R$ 115, 3 bilhões.
A mídia tradicional e alguns economistas taxaram as medidas de “insuficientes”. Ora, ainda que fossem, argumenta o coordenador técnico do Dieese Clemente Ganz Lúcio, por que não adotá-las? Por que preferir primeiro apertar o cinto e pisar no calo dos trabalhadores e contribuintes menos afortunados?
“Temos de começar por algum lugar. O que estamos propondo é que as correções tenham início por cobrar aqueles que devem. Não é possível que sempre se comece com mais sacrifício aos mais pobres”, sentencia Clemente.
Para melhorar o desempenho
O Dieese pede o fim ou a revisão das desonerações previdenciárias das empresas. Em 2015, essas facilidades retiraram R$ 62 bilhões da Previdência. Só as desonerações sobre a folha de pagamento representaram uma perda de R$ 22, 4 milhões no mesmo período. Mudanças na legislação, mais recentes, devem reduzir essa ausência para R$ 15, 7 bilhões em 2016. Mas ainda é muito dinheiro.
Já as entidades filantrópicas devem deixar de contribuir em R$ 11,4 bilhões neste ano, também por conta das isenções.
Buraco é mais em cima
Atualmente, segundo o estudo, há uma dívida de R$ 374,9 bilhões – não resultante de isenções, mas de contribuições simplesmente não pagas. Calote, mesmo. Para recuperar esse dinheiro, as centrais sindicais reivindicam a criação de um programa de recuperação fiscal. O governo afirma classifica que apenas R$ 236,7 bi são recuperáveis.
No mato
O estudo das centrais, elaborado pelo Dieese, lança também questionamento sobre o regime de contribuição do agronegócio, que se beneficiarão de renúncias fiscais de R$ 6,6 bilhões em 2016. No entanto, em lugar de tratar dessa questão, o governo prefere apontar déficit nas aposentadorias dos trabalhadores rurais.
Já a proposta de destinar à Seguridade Social receitas vindas da regulamentação dos bingos e dos jogos de azar, assim como regulamentar a cobrança sobre os jogos legais – este último previsto na Constituição – prevê acrescentar R$ 15 bilhões anuais à Seguridade.
Tais medidas contidas no documento começaram a ser discutidas ainda com o governo Dilma, em setembro de 2015, mas as turbulências políticas frustraram os debates, ainda infrutíferos.