Afetação moral: A estratégia da direita para atacar a cultura
Publicado: 13 Setembro, 2017 - 00h00
O termo “afetação moral” foi cunhado por Friedrich Nietzsche, filósofo alemão morto em 1900, em sua obra “Genealogia da Moral” de 1887, para definir a forma truculenta como as correntes idealistas da chamada “raça ariana” (sonho perseguido pelos nazistas liderados por Adolf Hitler) alimentavam seu antissemitismo e todas as formas de preconceitos contra tudo aquilo que julgavam imoral. Reflete a busca incessante destes setores de atingir moralmente seus oponentes, como meio para influenciar a opinião pública a seu favor. Para Nietzsche, frente a este objetivo, tais correntes utilizavam as “formas mais baratas de agitação para incitar o gado de chifres que há no povo”.
Não por outra razão, o General Nazista Joseph Goebbels, responsável pela propaganda nazista que levou o povo alemão a apoiar as loucuras de Hitler, afirmava que uma mentira repetida continuamente, vira verdade. Pois bem, porque faço esta referência? Porque esta semana fomos surpreendidos, com a notícia amplamente divulgada pela mídia, que o Santander Cultural na cidade de Porto Alegre, antecipou em 30 dias o encerramento da exposição “Queermuseu – cartografias da diferença na arte brasileira”.
O cancelamento da referida exposição deu-se em função de protestos de grupos religiosos e militantes do MBL que argumentam tratar-se de um evento que fomenta a imoralidade na sociedade brasileira, já que (na avaliação deles) fazem analogia à pedofilia e a zoofilia. Tais argumentos deixariam Nietzsche (que não era nenhum esquerdista) enojado, já que certa vez afirmou que “somente a arte pode transfigurar a desordem do mundo em beleza e fazer aceitável tudo aquilo que há de problemático e terrível na vida. Ou seja, estes grupos fundamentalistas não
compreendem que também é função da arte provocar reflexões sobre a realidade como ela se apresenta. Que para se compreender uma obra de arte, faz-se necessário compreendê-la também na sutileza da sua subjetividade e não apenas com a racionalidade perversa de moralistas de plantão que têm somente a intenção de impor a sua visão de mundo.
Quando afirmamos que hoje na sociedade brasileira a democracia corre um sério risco, não é apenas porque estamos vivendo mais uma
experiência de golpe no Estado de Direito. É porque também, há um forte movimento conservador e neofacista que percebe no campo da cultura um novo espaço de disputa de valores, entre os quais se localiza a liberdade de expressão. É preocupante neste contexto, assistirmos um Mirosmar da vida (vulgo Zezé di Camargo) vir a público afirmar que o Brasil nunca viveu uma ditadura militar de verdade e sim uma experiência de “liberdade vigiada”. Saber que em cidades importantes como Campinas, projetos anti-cidadania como o “projeto escola sem partido” que afronta a autonomia do processo de ensino-aprendizagem, em todos os níveis de ensino, tornar-se-á a principal diretriz do Plano Municipal de Educação.
São reflexos da chamada “afetação moral” desencadeada pela nova direita brasileira para impedir o avanço do pensamento crítico em todos os campos, em particular no campo da cultura e da educação. Frente a estes ataques, em particular do MBL, e a covardia das instituições que se rendem às pressões desta nova escola fundamentalista de direita em nosso país, não podemos nos calar. E a Secretaria Nacional de Cultura da CUT não apenas se soma aos movimentos de solidariedade ao curador da exposição Gaudêncio Fidélis, como se coloca ao lado dos movimentos sociais que acreditam que é pelo fomento ao pensamento crítico que alcançaremos a sociedade livre, democrática e com profundo
respeito à diversidade que almejamos. Não podemos ser reféns do conservadorismo hipócrita que busca, de todas as formas, afetar o funcionamento das instituições que têm como objetivo promover reflexões sobre nossa realidade a partir das artes. A cultura sempre resistirá!