COVID-19: sem o SUS seria o caos
Publicado: 06 Abril, 2020 - 00h00
A descentralização do oferecimento dos serviços de Atenção à Saúde para Estados e Municípios se coloca neste momento como o ponto chave para o combate ao Covid-19 no território nacional. Imaginem se todas as decisões ficassem concentradas no governo central, com uma figura negacionista da ciência como o presidente Bolsonaro? Mas algo que salta aos olhos é a aprovação da sociedade para as ações que o Ministério da Saúde vem adotando à revelia do presidente da República, medidas adotadas à luz da ciência e das recomendações da Organização Mundial de Saúde(OMS).
O SUS vem respondendo à crise e à mobilização de servidores em cada cidade do país, de ontem parasitas, conforme chamado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, foram alçados a heróis da pátria. É bom que se destaque que do conjunto dos servidores são estes que amargam os piores salários.
O sistema público de saúde brasileiro realiza mais de 2,8 bilhões de atendimentos todos os anos, desde procedimentos ambulatoriais simples a atendimentos de alta complexidade, como transplantes de órgãos. Neste momento os Centros de Pesquisas,como a FIOCRUZ, Instituto Butantan e outros estão envolvidos em pesquisas avançadas sobre a doença do Covid-19 e na produção de kits para testes de detecção da presença do vírus.
A prestação de serviços de saúde à sociedade e a luta contra o coronavírus poderiam estar muito melhor senão tivesse sido derrubada a CPMF - Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, pela hoje base de apoio do governo Bolsonaro no Congresso Nacional, que já retirou da saúde mais de R$ 1 trilhão nos últimos dez anos.
Os ataques ao SUS são muitos nos últimos anos, a exemplo a Emenda Constitucional nº 95, que, aprovada pelo Congresso Nacional, congelou os gastos públicos por 20 anos. Só em 2019 retirou cerca de R$ 9,5 bilhões de investimentos na saúde pública.
A título de ilustração do que o desinvestimento de recursos no SUS vem causando, em fevereiro, o Brasil tinha 2,01 leitos por 1.000 habitantes, taxa menor do que a de países como Itália (3,18), Espanha (2,97) e Inglaterra (2,81). Essa taxa varia muito entre regiões e unidades da federação (1,6 no Amapá a 2,6 no Rio Grande do Sul).
A privatização dos serviços de saúde é outra face nefasta dos ataques ao sistema de saúde. Nos últimos anos assistimos os avanços das mais diversas formas de precarização das relações de trabalho. No Rio de Janeiro, nos últimos meses, milhares de trabalhadores da saúde ficaram sem salários, tudo fruto da ganância de muitos que tentam transformar a vida humana em um produto.
No Brasil a falta de fornecimento de EPIs - Equipamentos de Proteção Individual aos trabalhadores da saúde expõe a naturalidade do descaso com a vida humana.
Em plena pandemia do COVID19, que no território nacional ainda não chegou ao ápice, as entidades que representam os hospitais e empresas privadas de saúde tiveram a coragem de procurar o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a utilização dos seus leitos e unidades hospitalares para atender o povo, chamando de confisco no texto da Ação Direta de Inconstitucionalidade, o que é desumano. O que estas empresas não dizem é que vendem serviços para os que compram planos de saúde que por muitas vezes não entregam.
Na TV as empresas da saúde privada alardeiam campanhas de solidariedade contra o coronavírus, esbanjam simpatia, mas no mundo real vão à Justiça para evitar a utilização das suas estruturas para atendimento da sociedade.
Em um caso como este da atual pandemia, o SUS deveria lançar mão de todos os leitos e instalações da rede privada de saúde, como outros países já fizeram, como a Espanha o fez quando estatizou todos os hospitais privados do País, assim como deveria o governo usar o parque fabril brasileiro para fabricação de EPIS e insumos para atendimento das vítimas da doença do COVID19.
Aos heróis da saúde o Brasil precisa legar a gratidão que não se pode resumir aos pequenos gestos que muito nos afagam, mas é necessário que o Congresso Nacional aprove: a criação de pensão especial por morte em favor dos dependentes daqueles trabalhadores da saúde que perderem as suas vidas no combate ao coronavírus, a fixação da jornada de trabalho de 30 horas para enfermagem e reparar a injustiça cometida contra os trabalhadores da saúde na Reforma da Previdência, quando mudaram as regras para aposentadoria especial dos servidores que atuam em atividades insalubres.
Sandro Cezar é servidor do Ministério da Saúde, presidente da Central Única dos Trabalhadores no Estado do Rio de Janeiro - CUT/RJ e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social - CNTSS/CUT