Em dia com a luta pela eliminação de toda forma de violência contra as mulheres
Publicado: 04 Dezembro, 2017 - 00h00
ONU estabelece “16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres” entre novembro e dezembro e cobra das Nações políticas públicas e ações que garantam os direitos de gênero
A violência contra a mulher se mantém como um fenômeno fortemente presente na sociedade independente da classe social, idade ou raça de sua vítima. As lutas das mulheres e dos movimentos sociais de defesa de direitos têm sido intensas e fundamentais para que casos desta natureza sejam denunciados, seus agressores punidos e episódios assim deixem definitivamente de existir em todo o planeta. 25 de novembro foi um dia alusivo à resistência e denúncia contra todo tipo de arbitrariedades que atingem as mulheres. Em várias cidades brasileiras houve manifestações por conta do “Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres”, também conhecido como Dia Laranja por escolher esta cor como símbolo da luta.
A data é uma das muitas que expressam um sentido intenso de simbologia para as mulheres em suas árduas batalhas contra as diversas formas de violência presentes em seus cotidianos. Foi neste dia, em 1960, que as irmãs Pátria, Minerva e Maria Teresa, conhecidas como “Las Mariposas”, foram assassinadas a mando do ditador Leônidas Trujillo, da República Dominicana. As três combatiam a ditadura em seu país. Foram estranguladas, tiveram ossos quebrados e seus corpos jogadas em um precipício para simular acidente de carro. Em 1999, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas instituiu este tributo a estas três mártires.
Este ano, as homenagens estão inseridas na agenda global criada pela ONU – Organização das Nações Unidas e classificada como “16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”, com início em 25 de novembro e se estendendo até 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos. O lema atribuído para este período é “Não deixar ninguém para trás: acabar com a violência contra as mulheres e meninas”. O combate à violência de gênero está presente nas discussões dos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que estabelece metas para serem atingidas até 2030. Do total de 17 temas, há cinco deles que trata diretamente da igualdade de gênero, mas com transversalidade em todos os demais.
Em cerimônia na ONU, por ocasião do 25 de novembro, foi celebrada a data com o foco na eliminação das violações de direitos a partir das defesas por igualdade de gênero e por empoderamento da mulher. Em pleno século XXI, os números de violações são alarmantes em todo o planeta. A violência de gênero afeta suas vítimas física, psicológica e materialmente e reverbera desestabilizando famílias, comunidades e a sociedade, uma vez que fere direitos, avilta a dignidade humana e destrói as relações sociais e familiares.
Violência de gênero: fenômeno mundial
Estudos da ONU destacam que a violência de gênero é um fenômeno mundial que deve atingir uma em cada três mulheres do planeta. A violência nas próprias casas tem sido a principal causa de lesões sofridas por mulheres com idade entre 15 e 44 anos. Atualmente, cerca de 35% da população mundial feminina já foi vítima de violência de seu parceiro ou sofreu agressão sexual por parte de outras pessoas. Ampliando o espectro para variados tipos de violência em algum momento de suas vidas, a ONU diz que este número de vítimas sobe para 70% das mulheres, “independente de nacionalidade, cultura, religião ou condição social”.
Para as mulheres da América Latina esta situação é também muito grave. A OPAS – Organização Panamericana de Saúde, com dados de 2013, definiu como pandêmica a violência de gênero nesta região: "entre um quarto a metade das mulheres declararam ter sofrido alguma vez violência por parte de um companheiro íntimo". Estudos dizem que o Caribe concentra três dos 10 países com as maiores taxas de estupros de mulheres e meninas. A América Central, por sua vez, o feminicídio é devastador atingindo índices considerados epidêmicos.
No Brasil, infelizmente, os números não fogem deste triste padrão. De acordo com o Ministério da Saúde, 47 mil brasileiras foram vítimas de feminicídio nos últimos dez anos, sendo que 74% delas são negras ou pardas. O IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplica afirma que há um feminicídio a cada 90 minutos no país. A Fundação Perseu Abramo, com dados de 2010, apresenta que o Brasil registra cerca de cinco espancamentos a cada 2 minutos. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública menciona que a cada 11 minutos uma mulher é estuprada. O Ministério da Saúde aponta que, em média, 10 estupros coletivos são notificados diariamente em seu sistema.
Brasil: Atlas desmascara violência
O Atlas da Violência 2017, feito pelo IPEA e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que analisou os homicídios entre 2005 e 2015 a partir de dados do Ministério da Saúde, aponta que 4.621 mulheres foram assassinadas no Brasil em 2015. Houve uma redução no período da pesquisa de 7,4% de mortes entre mulheres brancas, atingindo 3,1 mortes para cada 100 mil mulheres brancas. Já a mortalidade de mulheres negras teve um aumento de 22%, atingindo 5,2 mortes para cada 100 mil mulheres negras. No caso de mortes por agressão, o percentual de mulheres negras era de 54,8% em 2005 e foi para 65,3% em 2015. O estudo sinaliza claramente que a diferença racial também interfere nos indicadores de violência de gênero.
A ONU Mulheres divulgou agora em novembro pesquisa elaborada pela Universidade Federal do Ceará, o Instituto Maria da Penha e o Institute for Advanced Study in Toulouse que detecta que 27% das mulheres nordestinas, com idades entre 15 e 49 anos, já foram vítimas de violência doméstica ao longo da vida. Observou-se a repetição do padrão de violência doméstica nas famílias onde a mulher e/ou seu parceiro foram expostos à violência na infância. Os dados são claros: quatro a cada dez mulheres que cresceram em um lar violento sofreram o mesmo tipo de violência na vida adulta. Das mulheres vítimas de violência doméstica, 55% relataram que os filhos presenciaram o episódio ao menos uma vez.
O estudo da ONU sobre violência contra as mulheres na América Latina e Caribe diagnosticou que as agressões contra mulheres persistem mesmo com a aprovação de leis rígidas para inibi-las. O parecer da entidade sugere que um dos caminhos para quebrar este quadro avassalador é implementar ações que fortaleçam as instituições e garantam recursos para políticas públicas de combate à violência e de empoderamento das mulheres. É de comum acordo entre as entidades nacionais e internacionais e os movimentos sociais que é preciso atuar fortemente contra a impunidade dos agressores e propor ações para tratar estes indivíduos.
Na busca de caminhos eficazes
No Brasil, uma grande conquistada se deu com a aprovação da Lei Maria da Penha, Lei 11.340/2006. A sua implementação possibilitou que a temática da violência doméstica contra a mulher fosse encarada de forma explícita independente de raça, credo religioso ou classe social. Depois de onze anos de criação desta legislação é fácil perceber sua visibilidade em todas as classes sociais que fazem uso dela como uma ferramenta de inibição da violência contra as mulheres. Mesmo assim, ainda é necessário defendê-la e fazer com que amplie sua justa aplicabilidade nos espaços institucionais e sociais.
Outro avanço no país foi a aprovação da Lei do Feminicídio, Lei 13.104/2015, que é o assassinato de uma mulher pela condição de ser mulher e quando o crime envolve “violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher”. A partir dela ocorre um aumento da pena mínima para autores de crimes de homicídio contra mulheres que passa de seis para 12 anos e a máxima, de 20 para 30. A ex-presidenta Dilma Rousseff assinou um decreto que incluiu o feminicídio no rol dos crimes hediondos.
O Atlas da Violência 2017 sinaliza para esta preocupação de fazer valer as Leis ao apontar que muitas das mortes poderiam ter sido evitadas. Esta afirmação baseia-se na evidência que estas vítimas sofreram várias situações de violência antes de chegar a um final trágico. A construção de políticas públicas capazes de prestar apoio e o atendimento adequado de forma ampla a partir de programas e ações de caráter multisetoriais, como indica a Lei Maria da Penha, além de educação de gênero, é uma maneira de alterar este quadro crescente de violência.
Em novembro, cerca de mil lideranças das entidades de trabalhadores de vários países que participaram do 30º Congresso Mundial da ISP – Internacional dos Serviços Públicos, em Genebra, se comprometeram com a luta das mulheres no combate à violência de gênero. Dirigentes da CUT – Central Única dos Trabalhadores e da CNTSS/CUT – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social estiveram entre estas lideranças. Queremos um mundo novo com igualdade de direitos, respeito e sem opressão a qualquer mulher em qualquer canto deste nosso planeta. Lutamos pela defesa dos direitos humanos e por uma sociedade capaz de sobrepor-se à violência e à impunidade. Vamos fazer valer o lema desta campanha mundial da ONU: “Não deixar ninguém para trás: acabar com a violência contra as mulheres e meninas”.