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Artigo

Segurança e saúde dos trabalhadores colocadas em risco com MP nº 927

Publicado: 01 Abril, 2020 - 00h00

O governo Bolsonaro demonstra novamente sua perversidade ao se contrapor e aplicar medidas opostas às tomadas pelas demais nações que organizam suas redes de saúde e preparam suas economias para proteger da melhor forma possível seus cidadãos e cidadãs e, com isto, salvar o máximo de vidas e preservar empregos e direitos neste momento de pandemia do coronavírus (Covid-19). O Brasil foi surpreendido no domingo, 22/03, com a publicação da famigerada e aviltante Medida Provisória nº 927, que se configura como mais um ataque brutal aos direitos trabalhistas e à condição de cidadania e sobrevivência da classe trabalhadora.

Bolsonaro/Guedes, mentores desta política maldosa e irresponsável, só não contavam com o volume das reações negativas provenientes dos mais variados setores da sociedade, que imediatamente se colocaram contrários ao conteúdo da MP. O resultado foi que, em menos de 24 horas de sua publicação, o governo foi obrigado a se comprometer a extirpar do texto o Artigo nº 18, que estabelecida suspensões dos contratos de trabalho e dos salários por até quatro meses. Medidas que seriam tomadas a bel-prazer pelo empresariado a partir de um “acordo” individualizado jogando, assim, os Acordos e Convenções Coletivas às favas. Mais um retrocesso descomunal oriundo de mentes inescrupulosas que atuam neste governo.

Os países atingidos pela crise e possuidores de governos com políticas e projetos civilizatórios, que não é o caso do mandatário que hoje ocupa o Palácio da Alvorada, preparam pacotes econômicos para preservar empregos, suspender o pagamento de contas e salvar vidas e empresas. O Reino Unido bancará 80% dos salários da iniciativa privada. A Espanha empenhará cerca de 20% do seu PIB – Produto Interno Bruto para salvar sua economia, garantindo moratória para hipotecas, ajuda financeira a trabalhadores e empresas e isenções para os serviços públicos. Os EUA terão um pacote de US$ 2 trilhões, o maior de sua história, para salvar empresas, implantar medidas sociais e ajudar com cerca de US$ 1 mil mensais as famílias mais vulneráveis economicamente.

São exemplos das muitas medidas que serão implementadas para garantir saúde, vida e dignidade dos cidadãos e cidadãs, assim como minimizar os efeitos da crise sanitária nas atividades econômicas destas nações atingidas pelo Covid-19. O caso brasileiro foge grosseiramente desta regra e o governo colocou na conta da classe trabalhadora a somatória dos danos causados por sua política econômica desastrosa, posta em prática de forma ditatorial por um ministro cuja capacidade é questionada a cada medida que toma, e pela crise oriunda da pandemia de coronavírus. A MP de Bolsonaro/Guedes é mais um de seus pacotes criminosos que destila maldade e desprezo contra a classe trabalhadora.

A CUT – Central Única dos Trabalhadores se manifestou de imediato contra as medidas classificando-as como MP da Morte e apresentou uma série de sugestões voltadas à defesa dos trabalhadores formais e informais, o combate eficaz ao coronavírus e a preservação dos empregos. Em 25 de março último, reiterou suas indicações em Resolução da Executiva Nacional onde exige a defesa intransigente da vida, direitos, respeito ao povo e que o Congresso aprove propostas em defesa da sociedade e devolva a MP nº 927. Também cobra das esferas federal, estaduais e municipais a defesa dos trabalhadores e da população e a manutenção da estratégia de isolamento social para minimizar o contágio do vírus. Destaca que não é mais possível manter Bolsonaro no governo e saúda as manifestações populares que, espontaneamente, pedem o fim deste desgoverno.

A Resolução aponta as seguintes medidas: revogação da EC 95, suspensão da Lei de Responsabilidade Fiscal e do pagamento da dívida pública; ampliar os recursos para a saúde, garantir EPIs - Equipamentos de Proteção Individual para trabalhadores da saúde, da imprensa e demais atividades que não possam ser suspensas; garantir emprego, salários integrais e direitos dos trabalhadores formais, inclusive dos afastados por contágio, e renda dos que estão na informalidade; garantir renda mínima emergencial de um salário mínimo para todos os trabalhadores desempregados, informais, por conta própria e de aplicativos; suspender o pagamento de contas e dos cortes de serviços públicos e a obrigação de pagamento de outras despesas pelo período que durar a crise; apoio a agricultura familiar com crédito emergencial; assegurar equipes de Atenção Básica de Saúde nos assentamentos agrários e comunidades rurais; criar um Fundo de Emergência com dinheiro do Estado, do setor privado e da taxação dos super ricos para prover as medidas acima apresentadas.

Novos ataques contra os trabalhadores

A MP vai na contramão de qualquer iniciativa sensata e crava sobre os ombros da classe trabalhadora, além do artigo que foi derrubado por conta das contestações, sete outras iniciativas: teletrabalho; antecipação de férias individuais; concessão de férias coletivas; aproveitamento e a antecipação de feriados; banco de horas; suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; deferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Todos os itens atribuem de má-fé consequências econômicas aos trabalhadores que vêem subtraídos recursos pré-existentes e direitos próprios e eximem de qualquer custo o governo e o empresariado. Bolsonaro e Guedes optaram por prejudicar a classe trabalhadora colocando sobre ela o custo total da ajuda que o governo deveria implementar para minimizar os prejuízos da sociedade e estabelecer mecanismos de sobrevivência neste momento da crise sanitária.

De todas estas iniciativas, uma delas merece um olhar mais cuidadoso por seu caráter mal-intencionado ao responsabilizar os trabalhadores por possíveis danos e desdobramentos da contaminação com o Covid-19. Esta indicação sórdida está registrada no Artigo nº 29, quando o texto define que “os casos de contaminação pelo coronavírus (Covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal”. Aqui o governo exacerba ao impor ao trabalhador a responsabilidade de comprovar “a casualidade entre trabalho e doença”, o que explicitando melhor seria o seguinte: o profissional vítima da contaminação terá a obrigação de provar que contraiu a infecção em decorrência da função que desenvolve.

Um critério nada honesto idealizado na MP para eximir os governos e empregadores de suas obrigações ao mesmo tempo em que desconsidera a infecção por Covid-19 como acidente de trabalho. É um absurdo sem tamanho pedir nexo causal neste momento de pandemia em que os profissionais são obrigados a exercerem suas funções consideradas essenciais para combater a proliferação do Covid-19 e cotidianamente estão expostos ao vírus. É por conta desta atuação responsável que muitos trabalhadores estão sendo infectados e se tornam vítimas da enfermidade que estão tentando curar dos demais cidadãos. A frieza de Bolsonaro e Guedes, que pretendem imputar ao trabalhador infectado a culpa pela infecção, é mais um exemplo da monstruosidade deste governo e de suas políticas.

Ao apresentar esta determinação, Bolsonaro e Guedes passam por cima do RE – Recurso Extraordinário nº 828.040/DF, do STF – Supremo Tribunal Federal, que define exatamente o caminho inverso: é responsabilidade dos empregadores, nos casos de exposição a ambientes e situação de risco de seus funcionários, a obrigatoriedade de comprovar que a contaminação não possui nexo de causalidade coma atividade desenvolvida. O Artigo nº 29 é taxativo em sua intenção de não considerar as infecções uma responsabilidade ocupacional se não for comprovado nexo causal. O trabalhador, que já é prejudicado pelo contágio desta doença cujo índice de mortalidade é bem expressivo, também será punido de outras formas por esta MP.

De imediato, por tentar obrigar que assuma as consequências da contaminação sem que tenha acesso aos direitos estabelecidos na legislação trabalhista para casos desta natureza. Outro momento se manifesta caso seja necessário o requerimento de aposentadoria, pois o profissional terá reflexos no valor do benefício a que tem direito. Basta recordar que com a Reforma da Previdência passa a ocorrer a diferenciação do valor do benefício por invalidez em decorrência ou não de acidente de trabalho. Por invalidez previdenciária o benéfico gira em torno de 60% da média salarial. Já por acidente de trabalho o benefício contempla 100% do salário. Percentuais que serão repassados na pensão em caso de falecimento do segurado.

A MP traz outras medidas que colocam em risco a segurança e a saúde do trabalhador ao suspender exigências durante todo o período considerado de calamidade pública, que expira apenas em dezembro. O governo quer eliminar a obrigatoriedade de realização de exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, deixando apenas o demissional. O texto da Medida indica ainda que há possibilidade de um médico do PCMSO – Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional solicitar um exame complementar, mas, ainda assim, dependerá do empregador, que é preservado da responsabilidade sobre qualquer situação de risco do trabalhador, a realização ou não. Até mesmo o exame demissional poderá ser dispensado em favor do empregador.

Flexibilização de direitos traz riscos graves

A NR – Norma Regulamentadora nº 07 explicita que os exames complementares são uma garantia para certificar que não há exposição a agentes nocivos. A Norma estabelece que a realização pode ocorrer em prazos diferenciados conforme o grau de risco da exposição. Se olharmos para os profissionais da saúde que vivem expostos diretamente a situações de contágio do Covid-19 esta medida é criminosa por colocar em risco suas vidas e de seus familiares. É fato notório que o governo Bolsonaro vem atuando sistematicamente na desconstrução das NRs com a finalidade de flexibilizar e até eliminar critérios e procedimentos que defendem os trabalhadores durante todo o processo laboral.

Outro ponto de relevância para os processos de segurança do trabalho é relativizado pela Medida Provisória. Desta vez são as diversas indicações presentes em NRs que estabelecem a necessidade de treinamento presencial periódico e eventual. A MP abre o precedente de ser descartado ou realizado por meio de EAD – Ensino à Distância, inclusive em alguns casos com 100% do conteúdo sendo ministrado desta forma. Sobre as CIPAs – Comissões Internas de Prevenção de Acidentes, o governo propõe a não realização de eleições durante o tempo que perdurar o estado de calamidade pública. Até mesmo os processos eleitorais que estiverem em curso poderão ser suspensos.

O governo federal ainda flexibiliza o papel dos auditores fiscais do trabalho, do Ministério da Economia, ao estabelecer que durante o prazo de 180 dias, a partir da publicação da MP, em 22/03, estes profissionais passarão a exercer a função orientadora, retomando sua atuação fiscalizadora apenas em algumas situações pontuais contidas no texto da Medida. A limitação da função dos auditores abre precedente preocupante que colocará em risco a vida dos trabalhadores que forem expostos a situações perigosas, de contágio e consideradas inadequadas durante o desenvolvimento de suas funções.

A MP nº 927 é mais uma iniciativa desumana deste governo para retirar direitos em um momento em que o país passa por crises nas esferas política, econômica e sanitária. Enquanto grande parte do planeta se une de forma solidária e humanizadora este governo opta pela maldade e perversidade. O retrocesso desencadeado com esta MP coloca em risco a renda e a subsistência dos trabalhadores e, consequentemente, as suas vidas e de seus familiares. Também não apresenta propostas que olhem para a realidade dos cerca de 40 milhões de trabalhadores que estão na informalidade e os mais de 12 milhões sem emprego. Seus efeitos são estarrecedores no cotidiano das pessoas e fere de morte garantias trabalhistas e cidadãs mínimas instituídas com a Constituição Federal Cidadã de 1988. É preciso urgentemente revogá-la e construir um consenso entre os campos progressistas para que sejam apresentadas propostas que não ataquem os trabalhadores e possam resgatar o desenvolvimento econômico e social do país. É preciso urgentemente preservar vidas e emprego.