Escrito por: Detrae

10 trabalhadores são resgatados em fazenda de café, em Vila Pavão (ES)

As condições de trabalho eram degradantes e a renda auferida estava distante de atingir um salário-mínimo mensal. Por cada saca de 60 kg de café colhido, era pago ao trabalhador R$16,00

Detrae
Alojamento onde foram encontrados os trabalhadores escravizados

Vinte e oito trabalhadores oriundos de Sergipe e Alagoas, foram levados a uma fazenda para a colheita de café em Vila Pavão, no Espírito Santo, atraídos por uma mulher com a promessa de trabalho com salário vantajoso, bom alojamento, alimentação farta e passagens de ida e volta, tudo por conta do empregador. Mas ao chegarem lá, levados por um ônibus fretado pelo proprietário da fazenda onde deveriam trabalhar se depararam com uma situação completamente diferente daquela que lhes fora prometida.

Aos poucos, eles foram percebendo que haviam sido completamente enganados e as promessas não iriam se cumprir. Dos 28, 18 conseguiram ajuda de familiares para retornar a suas cidades de origem. Outros 10 permaneceram até serem resgatados na semana passada por uma equipe coordenada por Auditores-Fiscais do Trabalho do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Alojamentos precários

Nas duas casas onde foram alojados, não havia camas, armários para a guarda de roupas e objetos pessoais, mesa e cadeiras para realizarem as refeições. Havia colchões, apenas, tão finos que mais pareciam colchonetes, que estavam estendidos no chão dos quartos. Nem roupa de cama era oferecida aos trabalhadores.

Em outra moradia, sem forro e com piso de ripas de madeira, havia vãos no chão e entre os telhados e as paredes dos cômodos, por onde insetos e outros animais podiam facilmente passar. Dois pequenos banheiros eram utilizados pelos trabalhadores. Um deles tinha piso em boas condições. O outro, era deplorável – as paredes não tinham revestimento lavável, o piso era de cimentos rústico e uma pequeno buraco, no alto de uma das paredes, servia como janela. A água para se banharem saía dos canos onde deveriam estar instalados os chuveiros. Uma caixa d’água, parcialmente tampada e instalada no alto de uma das casas, armazenava a água que alimentava os lavatórios dos banheiros, as pias das cozinhas e o único tanque das casas. Além disso, essa mesma água com lodo, sem qualquer tipo de filtragem, era consumida diariamente pelos trabalhadores.

Salário abaixo do mínimo

Não bastassem as condições degradantes nos alojamentos, os auditores também verificaram que a renda auferida pelos trabalhadores estava distante de atingir um salário-mínimo mensal. Por cada saca de 60 kg de café colhido, era pago ao trabalhador R$16,00.

Como a colheita era manual, ou seja, sem qualquer ferramenta que facilitasse a retirada dos grãos dos galhos dos pés de café, completar uma saca de café colhido era tão difícil e demorado, que na média eles mal conseguiam encher três sacas por dia. Nem 50 reais, portanto, eles conseguiam auferir depois de um dia de trabalho que começava antes das seis da manhã e se estendia até o finalzinho da tarde, sob o sol escaldante e mal alimentados.

Cobrança pela alimentação

Os trabalhadores pagavam pela alimentação e pelo valor da passagem de vinda, no total de R$ 350,00, que seriam descontado aos poucos, R$ 50,00 por semana. Por exemplo, um dos trabalhadores entrevistados pela equipe de auditores conseguiu completar sete sacas de café em uma semana, totalizando R$112,00 a receber; desse total, o empregador descontou R$ 20,00 referente à alimentação semanal e mais R$ 50,00 de parte da passagem de vinda. R$ 42,00 foi o que lhe sobrou na semana, portanto. Em quatro semanas, ou seja, um mês de trabalho, com alguma sorte ele conseguiria auferir uns R$ 200,00.

 A alimentação fornecida aos trabalhadores também era precária, com racionamento de proteínas e não balanceada, além de desproporcional ao esforço físico necessário na atividade de colheita de café.

Equipamentos de proteção individual indispensáveis para a execução segura das atividades, também não eram fornecidos gratuitamente aos trabalhadores, em contrariedade com as normas de saúde de segurança do Ministério do Trabalho e Emprego. Até mesmo a peneira, instrumento de trabalho, usada para a colheita do café, era descontada de cada trabalhador.

Empregador multado

O empregador autuado arcou com o pagamento das verbas salariais e rescisórias devidas aos trabalhadores e das passagens de volta para a cidade de origem de cada um deles. Os valores de reparação de direitos trabalhistas somaram aproximadamente R$ 26 mil reais e foram recebidos pelos trabalhadores na última sexta-feira (5/5/23), data em que eles retornaram para suas cidades de origem.

Atuação do Grupo Móvel

A operação foi iniciada em 3 de maio de 2023 e coordenada por Auditores-Fiscais do Trabalho do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, subordinado à Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (DETRAE), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com a participação do Ministério Público do Trabalho, do Ministério Público Federal, da Defensoria Pública da União e da Polícia Federal,

O GEFM atua em todo território nacional desde 1995, quando foi iniciada a política pública de combate ao trabalho escravo. Desde então, são mais de 60 mil trabalhadores e trabalhadoras resgatadas dessa condição e mais de 128 milhões de reais recebidos pelos trabalhadores a títulos de verbas salariais e rescisórias durante as operações.

Os dados consolidados e detalhados das ações concluídas de combate ao trabalho escravo desde 1995 estão no Radar do Trabalho Escravo da SIT, no seguinte endereço: https://sit.trabalho.gov.br/radar

Denúncias

Denúncias de trabalho análogo ao de escravo podem ser feitas de forma anônima no Sistema Ipê, no seguinte endereço: https://ipe.sit.trabalho.gov.br/ .