A água é um bem público, não pode ter controladores privados. Não pode ter dono
Edson Aparecido da Silva, assessor de saneamento da FNU, rebate argumento do coordenador do 8º Fórum Mundial da Água, que falou em privatização do serviço de distribuição da água
Publicado: 12 Março, 2018 - 10h54
Escrito por: Rosely Rocha, especial para o Portal CUT
O aceno do governo do golpista e ilegítimo Michel Temer (MDB-SP), de que pode outorgar o uso da água de forma descontrolada para servir aos interesses de grandes empreendedores, latifundiários e multinacionais colocou a questão como um dos centros dos debates do Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA2018), que acontecerá em Brasília, de 17 a 22 de Março.
“Nosso debate é exatamente pela água ser um bem público, ela não pode ter controladores privados. Não pode ter dono”, diz Edson Aparecido da Silva, assessor de saneamento da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), e integrante da coordenação do FAMA2018.
“É importante deixar claro que a água não pode ser privatizada, nos moldes de estradas, telefonia, e outros serviços públicos que já foram privatizados, porém o governo insiste em criar mecanismos legais que possibilitem a criação de condições para que o setor privado se aproprie desse bem”.
Edson rebate os argumentos do coordenador temático do 8º Fórum Mundial da Água, Jorge Werneck, que, em entrevista à Agência Brasil (EBC), disse considerar “equívoco o Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA) adotar como uma de suas principais bandeiras ser contrário à privatização da água. Que, no Brasil, por lei, a água é um bem público e dotado de valor econômico. Como bem público, explica, sua privatização é impossível. Só é privatizável o serviço público, e não o bem”.
Essa “confusa” declaração na verdade mostra que Jorge Werneck não vê problemas de o serviço de abastecimento de água e saneamento ser concedido ao setor privado para ser explorado de acordo com as regras do mercado.
“Somos totalmente contrários à privatização dos serviços de saneamento, contra o controle das águas pelo setor privado. A água deve permanecer em mãos públicas”, rebate Edson Aparecido.
“É preciso separar as duas coisas: a água superficial e subterrânea enquanto recurso hídrico e os serviços de saneamento. Por exemplo, o governo não pode vender o Aquifero Guarani, mas pode criar mecanismos na legislação em que o controle das águas passe ao setor privado, fazendo concessões renováveis por 20,30 anos, dificultando o acesso da água pela população”, explica o coordenador do FAMA2018.
Edson lembra que a privatização da água já está sendo defendida por setores conservadores como no Projeto de Lei do Senado (PLS 495/2017), do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que propõe alterar a Lei Nacional de Recursos Hídricos e criar o mercado de água, inclusive com uma consulta popular no site do Senado.
O lema do 8º Fórum Mundial da Água É “ Compartilhando Água”. E Edson pergunta “compartilhando de quem e para quem, com quem e para quê?”.
A visão do fórum das corporações é totalmente oposta ao FAMA2018 que defende a universalização dos serviços públicos, o acesso à água, independentemente da capacidade de pagamento do usuário, com criação de instrumentos políticos que garantam água para todos, fortalecendo o papel do Estado na prestação desse serviço.
“A privatização não vai alcançar a universalização porque eles trabalham com perspectiva de lucro e é por isso que o interesse do empresariado é no saneamento das grandes cidades e metrópoles, onde o serviço dá retorno financeiro. A água está diretamente ligada à saúde pública, ao desenvolvimento social. Não pode sair das mãos do Estado”, pondera Edson Aparecido.
FAMA2018 - “Água é um direito, não mercadoria”
Com este lema, o FAMA2018 construiu uma grande articulação entre os mais variados movimentos sociais que, de alguma forma, se relacionam com a água. Foram reunidos trabalhadores e trabalhadoras do campo, da cidade, povos quilombolas, indígenas, pescadores, os que mantêm com ela uma relação de religiosidade. Enfim, todos os povos que lidam com a água.
São trabalhadores e trabalhadoras mobilizados pelos Movimentos de Pequenos Agricultores (MPA), dos Atingidos por Barragens (MAB), MST e CONTAG, entre outros
Para a construção do FAMA2018 foram criados comitês em 20 estados brasileiros, organizados a partir da aliança desses movimentos, numa luta de baixo para cima.
“O maior desafio é o FAMA2018 não terminar no dia 22 de março. Ele permanece com a manutenção da organização, da unidade dos comitês criados. Nossa perspectiva é que os comitês continuem enquanto espaços de luta em defesa da água como direito e não mercadoria, em defesa da soberania nacional e dos direitos humanos“, afirma Edson.