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A cada 10 pessoas mortas pela polícia, 8 são negras. Entidades cobram Estado

Em audiência pública promovida pelo Ministério Público Federal, sociedade civil reivindica ações urgentes e efetivas contra assassinatos de negros

Publicado: 04 Dezembro, 2020 - 09h23 | Última modificação: 04 Dezembro, 2020 - 19h42

Escrito por: Cida Oliveira/ RBA

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Ações para conter a violência racial e por parte da polícia e barrar a escalada de assassinatos de negros em todo o país foram cobradas com veemência em audiência pública realizada pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC/MPF) nesta quinta-feira (3). Representantes de organizações de defesa dos direitos humanos, do movimento negro e especialistas em segurança pública reivindicaram também medidas urgentes e efetivas do Ministério Público Federal no enfrentamento à violência de abordagens desnecessárias, violentas – especialmente de jovens – que geralmente terminam em assassinato e impunidade.

De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, as mortes decorrentes de intervenções policiais têm aumentado. Em 2018, das 6.175 ocorrências, 75,4% eram pessoas negras. Em 2019, o número de ocorrências subiu para 6.357 e o percentual saltou para 79,1%. O número é mais de dez vezes maior que o de policiais mortos, evidenciando o uso excessivo de força policial. Além disso, houve redução nas mortes desses agentes. Em 2018 foram 313 e em 2019 o número caiu para 172. Ainda segundo o Fórum, policiais negros assassinados representaram 65,1% do total em 2019, mais do que em 2018, quando foi de 51,7% das vítimas. Trata-se de mais uma face do racismo no país.

Banir a violência racial e policial

Presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher e integrante da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, a deputada Andreia de Jesus (Psol) – primeira mulher negra no legislativo mineiro – defende uma ação civil pública contra a violência racial.

“O Ministério Público já tem informação suficiente para uma ação civil pública para banir práticas violentas da polícia e inibir que novas práticas aconteçam. A gente tem provas suficientes de que a corporação não tem observância da administração pública que preza pela transparência”, disse a parlamentar, após a participação dos convidados que falaram por quase duas horas, relatando casos e apresentando dados.

A parlamentar é autora de projeto de lei na Assembleia Legislativa que pede reparação às famílias que foram vítimas de violência praticada pelo Estado. “Há 7 anos, um jovem negro foi abordado e depois torturado por mais de dez horas. A polícia queria informações sobre traficantes. O jovem não fumava, não bebia, nem se drogava. Sofreu queimaduras graves e precisou até de cirurgia plástica corretiva. O Estado tem de ser responsabilizado por isso. Esse tipo de dano tem de ser previsto e precisa de uma ação do Ministério Público. É preciso mudar a postura do Estado”, disse.

Combate ao racismo

Outro que cobrou ação do MPF foi o ex-secretário executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública Marivaldo de Castro Pereira, no governo Dilma Rousseff. Primeiro negro a ocupar interinamente o cargo de Ministro da Justiça, ele pediu que o combate ao racismo ganhe a mesma dimensão social e midiática que o meio ambiente. E que os procuradores tratem a questão racial como tratam a questão ambiental.

Em julho, o MPF ingressou com ação civil pública pedindo condenação do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, por improbidade administrativa. E que fosse afastado durante a investigação.

“As políticas em curso no país são de promoção ao racismo. Saímos de uma posição em que discutíamos políticas afirmativas para combater o racismo estrutural. Hoje o orçamento para políticas de igualdade está paralisado porque os espaços de democracia no governo federal foram fechados pelo presidente Bolsonaro. Chegamos ao ponto de ter na Fundação Palmares um presidente que passou o mês de novembro inteiro endossando casos de racismo e atacando personalidades negras.”

Políticas de segurança

“Enfrentamento ao racismo é papel do governo federal, que tem de definir e fomentar políticas de segurança”, afirmou a pesquisadora Michele dos Ramos, do Instituto Igarapé. Em sua avaliação, é necessário que a sociedade rompa com a crença de que a letalidade policial é uma política pública de resposta eficiente à violência.

A pesquisadora destacou que o Igarapé tem dados que mostram que não, a letalidade policial não está associada à redução da criminalidade, muito pelo contrário. E que os casos de assassinatos cometidos pela polícia têm de ser investigados e punidos. Michele lembrou ainda que a morte como política pública muitas vezes é sinônimo de ato de bravura reconhecido com medalhas e promoções.

Letalidade policial

A audiência foi convocada pela Subprocuradoria-Geral da República e Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão no âmbito do grupo de trabalho de combate ao racismo e promoção da igualdade racial. O objetivo foi consultar segmentos da sociedade civil e especialistas sobre a letalidade policial e população negra.

Para os organizadores, há necessidade de orientação e padronização dos procedimentos da atuação dos agentes de segurança pública aos princípios internacionais sobre o uso da força. E com isso reduzir paulatinamente os índices de letalidade resultantes de ações envolvendo agentes de segurança pública.

Confira a íntegra da audiência pública e as propostas da sociedade civil para enfrentar o racismo estrutural e violência policial contra a população negra: