A convite da CUT, pela democracia e contra autoritarismo, Arce e Evo virão ao Brasil
Ao derrotar o golpe, a Bolívia se torna exemplo e esperança para a retomada da esquerda na América Latina e reforça a necessidade de união dos países da região contra governos autoritários como o de Bolsonaro
Publicado: 22 Dezembro, 2020 - 01h02 | Última modificação: 22 Dezembro, 2020 - 12h37
Escrito por: Vanilda Oliveira
O ano de 2021 começará, para a CUT, como terminará 2020: com a certeza de que haverá muita luta frente aos desafios já em curso e aos persistentes ataques aos direitos da classe trabalhadora por parte do governo criminoso de Bolsonaro, que afundou o país em uma crise econômica e social sem precedentes. Mas o novo ano também se iniciará com a palavra e a presença no Brasil, a convite da CUT, de lideranças que venceram o autoritarismo, levaram seu país a retomar o caminho da democracia e hoje são esperança e exemplo de resistência e luta para trabalhadores e trabalhadoras de toda a América Latina.
Luis Arce, recém-eleito presidente boliviano; Evo Morales, que presidiu a Bolívia de 2006 a 2019, e o líder da maior central sindical boliviana, Juan Carlos Huarachi, virão ao Brasil logo no início do ano que vem, virtual e fisicamente. Eles aceitaram convite feito pessoalmente pelo presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre, e o secretário de Relações Internacionais, Antonio Lisboa, que retornaram de agenda na Bolívia neste domingo (20).
“Arce, Evo e Huarachi vão falar à nossa militância, aos bolivianos que vivem no Brasil, ao campo progressista como e o quanto foi importante a experiência vitoriosa da esquerda na Bolívia, que acabou com o golpe pela via democrática do voto popular”, afirma Sérgio Nobre. Precisamos ouvi-los, continua o dirigente cutista, porque como os bolivianos e os argentinos, temos de vencer a extrema-direita no Brasil em 2022”.
Aos líderes bolivianos, Sérgio Nobre reforçou porque o genocida Bolsonaro é um governante inescrupuloso, criminoso, que ataca a classe trabalhadora, as organizações sindicais e os movimentos sociais, que está “destruindo e envergonhando a história do nosso país.”
Eleito pelo MAS (Movimento ao Socialismo) e candidato de Evo, Lucho Arce, como é chamado pelo povo boliviano, colocou-se à disposição da CUT para “todos os momentos em que for convidado a participar de atos e campanhas em defesa do restabelecimento da democracia brasileira e de um governo popular”.
ARCE: CONTEM COMIGO
Como primeira tarefa, Arce, ex-ministro da Economia de Evo Morales, puxará uma grande atividade virtual, que será realizada pela CUT já em meados de janeiro, para debater as questões da Região e os desafios da classe trabalhadora e da esquerda para o próximo período. Luis Arce foi eleito presidente em outubro passado, menos de um ano após o golpe que forçou Evo Morales a renunciar e se exilar na Argentina, sob ameaça de morte.
Arce também acenou com a vinda ao Brasil, ainda no primeiro semestre de 2021, para falar com a comunidade boliviana que vive aqui, em atividade a ser realizada pela CUT. Essa agenda presencial, porém, dependerá das condições sanitárias e do controle da pandemia, com a vacinação.
O presidente boliviano admitiu indignação, mas não surpresa, com o desrespeito de Bolsonaro, único governante sul-americano a não cumprimentá-lo pela vitória nas eleições de outubro. O governante brasileiro finge ignorar que a vizinha Bolívia cresce 5% ao ano impulsionada por estatização e investimento público, ao contrário do Brasil, que privatiza e desmonta os serviços públicos, conforme destacou Sérgio Nobre na sua conversa com Arce.
Na análise do presidente nacional da CUT, “as conversas que tivemos com as lideranças e governantes bolivianos só comprovam que o desafio, tanto da classe trabalhadora como dos governos progressistas da região da América Latina, é se unir para retomar a democracia e o caminho do desenvolvimento, com igualdade, justiça social e sustentabilidade”.
“Esse tema é muito importante para o Brasil, porque haverá eleições daqui a dois anos e já temos de ampliar e fortalecer a campanha, interna e internacionalmente, para derrotar a extrema direita que hoje governa o nosso país”, avalia o presidente nacional da CUT. Por isso, complementa, temos total interesse em ampliar o diálogo, a cooperação, o intercâmbio, apoio e a integração entre os governos de esquerda da América Latina e organizações como a COB (Central Obrera Boliviana), para crescer na construção dessa campanha rumo a vitória de um governo popular no Brasil, em 2022”.
PACERIA COM A COB
Também em La Paz, Sérgio Nobre e Antonio Lisboa reuniram-se com o ministro das Relações Exteriores da Bolívia, Rogélio Mayta, para discutir e propor ações conjuntas de apoio e proteção dos imigrantes bolivianos que trabalham no Brasil. Ficou acertada uma parceria entre a CUT e o ministério para montar estrutura de assistência e acompanhamento dos trabalhadores e trabalhadoras egressos da Bolívia.
“Essa parceria inédita será muito importante, porque mais de 300 mil imigrantes bolivianos vivem no Brasil, 80 mil somente na cidade de São Paulo, e grande parte dessa população trabalha em condições precárias e até mesmo análogas à escravidão”, disse Sérgio Nobre ao ministro.
Os imigrantes bolivianos que vivem e trabalham no Brasil foram também o tema da conversa, em La Paz, com Juan Huarachi, líder e secretário-executivo da COB, a maior e mais combativa central daquele país, com quase 70 anos de história. Dessa conversa também saiu uma parceria inédita entre a CUT e a COB.
Antes, Sérgio Nobre traçou um breve panorama à direção da Central Obrera sobre a conjuntura que o Brasil enfrenta por conta do negacionismo criminoso do governo Bolsonaro e os ataques aos direitos da classe trabalhadora. Diante desse cenário, o presidente da CUT destacou ao boliviano ser imprescindível ampliar e fortalecer a unidade das organizações que representam os trabalhadores das nações da América do Sul, por meio de parcerias e intercâmbio.
“Fechamos uma parceria inédita e histórica com a Central Obrera Boliviana para proteção e assistência dos migrantes bolivianos no Brasil. Também acertamos a vinda de uma delegação da COB, em março próximo ao nosso país, para atividade da CUT a ser realizada em São Paulo, logicamente, observando, até lá, os protocolos e as condições sanitárias relativas à pandemia de Covid-19”, disse Sérgio.
O dirigente boliviano recebeu de Antonio Lisboa a bandeira da CUT, imediatamente empunhada, e o livro “Outras Américas”, de Sebastião Salgado, também presenteado ao presidente Arce e ao ministro Mayta.
“Ficamos muito felizes com a vitória do povo boliviano, uma conquista que nos enche de esperança de que em 2022, assim como aconteceu na Bolívia, a nossa luta, a nossa gente recupere o caminho da democracia e tire Bolsonaro do governo”, disse o presidente da CUT ao líder da COB. Huarachi foi perseguido, processado e criminalizado pelo governo golpista de Jeanine Áñez (que se autoproclamou presidente da Bolívia) por liderar os trabalhadores na resistência contra o golpe.
Para o secretário de Relações Internacionais da CUT, Antônio Lisboa, “o resultado desse giro da CUT pela Bolívia foi muito importante porque “tomamos iniciativas concretas para fortalecer a situação dos trabalhadores/as migrantes bolivianos aqui no Brasil, algo que a CUT já vem fazendo, mas agora tem o compromisso de participação e ajuda da COB e do Ministério das Relações Exteriores”.
Lisboa destaca ainda que os encontros com Arce e Evo reforçam o momento de retomada da integração dos governos de esquerda e dos povos das nações latino-americanas, “que vinha num crescimento muito forte no início do século 21, mas teve um recuo grande com o avanço da direita na região”.
EVO MORALES E O POVO
A reunião com o ex-presidente Evo Morales, líder indígena popular que virou presidente da República reconhecido mundialmente pelo êxito de seus governos democráticos, não poderia acontecer em um lugar mais emblemático à democracia e à região: a sede da UNASUL (Parlamento da União de Nações Sul-Americanas). Erguido no munícipio de San Benito, o espaço fica a uma hora do centro de Cochabamba, região símbolo da luta do povo indígena daquele país.
“Pintada” pelas cores do awiphala (emblema oficial de estado boliviano que simboliza os povos indígenas dos Andes), a sede da UNASUL recebeu nos dias 18 e 19 o 1º Encontro de Povos e Organizações de Abya Yala, que reuniu 1.200 bolivianos e convidados de dez países do continente sul-americano. Antes da reunião com Evo, Sérgio Nobre falou aos delegados e delegadas no auditório, durante a mesa de abertura do encontro, e almoçou com o ex-presidente e dirigentes sindicais de centrais de diversos países.
Na reunião privada, a pauta foi resistência e luta contra os governos autoritários do Brasil e região. O ex-presidente boliviano disse que, sim, virá ao Brasil participar de atividades realizadas pela CUT, pela esquerda e por todos aqueles que já estão em campanha para que, em 2022, os brasileiros possam voltar a ter um governo democrático e popular, livrando-se de Bolsonaro.
Evo, que, lógico, perguntou ao presidente da CUT sobre os companheiros Lula e Dilma, aceitou participar de atividade presencial, com público, que será realizada em março pela CUT, voltada não só à militância, mas a todo campo progressista brasileiro. “Porque para nós e para ele (Evo), é imprescindível ampliar e reforçar campanha e luta, além das fronteiras brasileiras, para tirar Bolsonaro do governo em 2022 e eleger um presidente que recoloque o Brasil no caminho da democracia e do crescimento com igualdade”, afirmou o presidente nacional da CUT.
“A experiência da Bolívia com a eleição de Arce e a volta de Evo Morales (que foi recebido do exílio, no aeroporto de Chimoré por 400 mil pessoas, vindas de todas as partes daquele país) são exemplos e inspiração a serem seguidos pelo Brasil e toda nação e povo que estejam sob mando de governantes autoritários, que atacam a democracia e os direitos dos trabalhadores, como faz Bolsonaro”, afirmou Sérgio Nobre.
Que venham nossos irmãos da Bolívia, da Argentina, do Chile...