Ação policial contra Padre Amaro criminaliza luta pela terra, diz OAB-PA
“A ação constante da grilagem e os crimes do latifúndio são as verdadeiras origens do caos no Pará”, diz nota da entidade, que pede paz no campo e denuncia imparcialidade do Estado e impunidade do latifúndio
Publicado: 29 Março, 2018 - 16h20 | Última modificação: 29 Março, 2018 - 16h27
Escrito por: Érica Aragão
Na manhã desta quinta-feira (29), membros da Comissão de Direito Agrário da Ordem dos Advogados do Brasil no Pará (OAB-PA) divulgaram uma nota de solidariedade ao Padre Amaro, da equipe pastoral da Prelazia do Xingu e da Comissão Pastoral da Terra (CPT), preso no último dia 27, vítima de denúncias de fazendeiros que tentam criminalizá-lo.
“Independente das condutas imputadas ao Padre Amaro, que rogamos a observância do princípio da presunção de inocência, o fato é que o objetivo da ação policial tem um viés de criminalizar a luta pela terra”, diz trecho da nota da OAB.
A prisão do padre Amaro, sucessor da Irmã Dorothy em Anapu, no Pará, é vista como armação para criminalizar a luta do sacerdote, segundo a Comissão Pastoral da Terra. O ataque, de acordo com a CPT, foi motivado pelo fato de o religioso ser uma das principais lideranças da equipe pastoral da Prelazia do Xingu.
Em nota, a CPT demonstrou preocupação com o fato de o padre Amaro ter sido levado para o mesmo presídio, em Altamira, em que o mandante do assassinato de Dorothy está preso.
“Até o momento não tivemos acesso ao Inquérito Policial que deu origem a este mandado de prisão, mas há suspeita de que houve uma ação bem orquestrada para juntar elementos, não se sabe de que qualidade, que pudessem sustentar uma decretação de sua prisão”, diz trecho da nota da CPT.
Em Anapu, município paraense que ficou em primeiro lugar entre os maiores índices de violência do país, o padre José Amaro deu continuidade à luta pelo direito à terra da Irmã Doroty Stang, assassinada em 2005. Desde então registros de ameaças de morte contra o padre não pararam de chegar ao Centro de Documentação Dom Tomás Balduino, da CPT.
A prisão do padre Amaro foi resultado dos depoimentos de fazendeiros, exploradores de terras na região, que o acusaram de liderar uma associação criminosa, com o fim de cometer diversos crimes, tais como, ameaça à pessoa, extorsão, assédio sexual, importuna ofensa ao pudor, constrangimento ilegal e lavagem de dinheiro.
Para a OAB, o silêncio do Estado mostra de que lado o poder público está, e não é o lado da Reforma Agrária, “afinal o único lado que somam os cadáveres é o lado dos trabalhadores, e todos sabem que a impunidade segue gritante do lado do latifúndio. É uma guerra onde só morre de um lado, mas é este mesmo lado que agora começa a ir para as barras dos tribunais”, diz outro trecho da nota.
O Pará tem se destacado, todo ano, como um dos estados com maior número de assassinatos em conflitos por terra, segundo a CPT.
“É um latifúndio que mata, que prende, que mente e que inventa crimes para criminalizar as lideranças comunitárias e as comunidades que lutam por terra”, critica Thiago Valentim, membro da Coordenação Nacional da CPT, que completa: “a prisão é uma reação dos fazendeiros da região contra toda atuação do padre, da CPT e da própria luta da comunidade”.
Confira a nota da OAB-PA na íntegra:
Nota de Solidariedade a Padre Amaro
Os Membros da Comissão de Direito Agrário da OAB-PA, ao final subscritos ,manifestamos a nossa solidariedade a Padre Amaro, pela longa história de luta contra o latifúndio em ANAPU-PA
Registramos que a descrição das condutas delituosas descritas no recente Mandado de Prisão expedido contra o Padre Amaro, criam um enredo que coloca as ações de luta pela terra numa situação de guerra, porém como se fosse só de um lado a declaração de guerra.
Não há um mínimo contrabalançar da ação constante da grilagem e Crimes do latifúndio, verdadeira origem desse caos, inclusive objeto de audiência pública na OAB-PA em 09/03/2018.
Ao mesmo tempo que se difunde tal enredo, não se vê o empenho da polícia em prender gente importante do outro lado desta guerra, nem em investigar tais condutas com eficiência.
O campo paraense está em guerra , mas a ação policial, apesar da sua suposta imparcialidade , tem elementos que indicam que o seu o objetivo não é só prender Padre Amaro, mas claramente criminalizar a liderança, e deslegitimar a luta contra o latifúndio.
Certamente nenhuma investigação da mesma natureza foi feita nos ambientes onde os latifundiários se reúnem.
Mesmo as supostas condutas descritas como atentados sexuais, são associadas à luta pela terra. E poderiam ser capituladas em outro processo, mas isso claramente visa estigmatizar ainda mais a luta pela terra.
Ou seja, independente das condutas imputadas ao Padre Amaro, que rogamos a observância do princípio da presunção de inocência, o fato é que o objetivo da ação policial tem um viés de criminalizar a luta pela terra.
Este objetivo não pode ser aceito, deve ser combatido, afinal o único lado que somam os cadáveres é do lado dos trabalhadores, e todos sabem a impunidade segue gritante do latifúndio.
É uma guerra onde só morre de um lado, mas é este mesmo lado que agora começa a ir para as barras dos tribunais.
Triste história de como o Estado, infelizmente, cada vez mais assume o seu lado, e certamente não é o da reforma agrária.
Paz no campo é nosso desejo, Contra a criminalização dos movimentos sociais é o grito.
Belém,29 de março de 2018.
Ibraim Rocha
Presidente da Comissão de Direito Agrário
Aianny Naiara Gomes Monteiro - integrante da Comissão de Direito Agrário
Girolamo Domenico Treccani- Integrante da Comissão de Direito Agrário.
Miguel Veiga Gualberto - integrante da Comissão de Direito Agrário
Roberto Cesar Teixeira de Santana; - iIntegrante Comissão de Direito Agrário.
Miguel Veiga Gualberto - integrante da Comissão de Direito Agrário da OAB-PA