Escrito por: CUT Nacional
Para a CUT, o desfecho deste processo representa também um relevante sinal de que não vamos nos curvar e deixar que o perigo de supressão de direitos
A sociedade e a classe trabalhadora obtiveram uma vitória parcial no dia 23 de setembro, quando, depois de cinco anos, a Volkswagen assinou um acordo extrajudicial em que reconhece que a montadora perseguiu e entregou trabalhadores aos agentes da repressão do Estado durante o período mais sombrio que o Brasil atravessou: a ditadura civil-militar de 1964 a 1985. Para além da reparação financeira acordada – importante para os metalúrgicos e seus familiares, cujas vidas foram abaladas por lutarem por direitos e liberdade –, o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) assinado pela montadora junto aos Ministérios Públicos Federal, do Estado de São Paulo e do Trabalho é o primeiro passo para que a violação aos direitos humanos praticadas pela ditadura militar e seus colaboradores civis seja reconhecida publicamente, particularmente em relação às empresas que patrocinaram o golpe de 1964 e garantiram a manutenção dele ao longo de 21 anos.
É um acordo inédito, que mesmo com limitações, fortalece a luta pelas liberdades democráticas, tão ameaçada no atual cenário do país por autoridades que defendem a pena de morte, elogiam os torturadores, e tentam violentar a Constituição na tentativa de criar condições para implantar um novo período ditatorial. Dentro desse cenário tão ameaçador, em que as violações aos direitos humanos são estimuladas, o TAC , apesar de não ter contemplado todas as justas reivindicações, tem um claro viés reparatório que aponta para que outras empresas envolvidas com crimes da ditadura possam ser investigadas e reconheçam as violações e as atrocidades aos direitos humanos praticadas no período mais sombrio da vida do país. É sem dúvida um revés para o governo Bolsonaro, que além de fazer apologia deste período nefasto da história do Brasil, nega as violações e destrói os instrumentos do estado brasileiro ligados à memória e a reparação, inclusive com a suspensão de indenizações de anistiados.
O acordo vai ao encontro à antiga reivindicação dos democratas e defensores dos direitos humanos, de que os autores das violações e das atrocidades que cometeram na ditadura não fiquem impunes, escondidos sob o manto da controversa Lei de Anistia que lhes assegurou, sem julgamento, uma injusta absolvição e que fez o Brasil destoar de outras nações que, quando recuperaram o regime democrático, puniram e condenaram agentes do Estado e colaboradores civis, inclusive as empresas. Uma parte do valor destinado para a reparação coletiva será utilizado na identificação de ossadas de presos políticos encontradas em 1992 numa vala clandestina no cemitério de Perus, que se tornará mais uma etapa na reconstrução de nossa história e poderá desvendar inúmeros desaparecimentos de opositores do regime militar e para novas pesquisas sobre a cumplicidade de empresas com a ditadura. A dimensão deste TAC nos mostra que mesmo numa conjuntura em que a maioria do poder de estado está à serviço do retrocesso democrático, parte das suas instituições podem contribuir para impedir que violações aos preceitos assegurados pela Declaração Universal de Direitos Humanos – da qual o Brasil é signatário – sigam acobertadas, como querem aqueles que compactuam com o autoritarismo e a opressão, infelizmente com o apoio dos que hoje ocupam o poder executivo no país.
Para a CUT, que foi proponente do inquérito civil público conduzido pelos Ministérios Públicos, o desfecho deste processo representa também um relevante sinal de que não vamos nos curvar e deixar que o perigo de supressão de direitos e da liberdade volte a assombrar a sociedade.
O TAC é um passo importante para que o Brasil comece a escrever a sua verdadeira História, com respeito à classe trabalhadora e à sociedade e com a garantia de que nenhuma violação contra os seus direitos ficará impune. O acordo começa a nos devolver a Justiça e repara, ainda que não plenamente, as arbitrariedades contra metalúrgicos (as) e seus familiares, alguns deles que ainda hoje passam por dificuldades para garantir uma sobrevivência digna e merecem resgatar sua dignidade. Assim, parabenizamos todas (os) trabalhadoras (os) envolvidos no acordo de reparação assinado pela Volkswagen por terem sido, anonimamente, lutadores incansáveis pelos direitos de sua classe e pelas liberdades democráticas em nosso país, ao lado de dezenas de milhares que não se calaram na ditadura e que seguem sendo exemplo para as gerações que os sucederam. E reafirmamos o nosso compromisso com a luta pela verdade, memória e justiça!
Sergio Nobre - presidente da CUT
Jandyra Uehara - CUT/Nacional Sec. Políticas Sociais e Direitos Humanos
Wagner Firmino Santana - Presidente do Sind. Metals. Do ABC