Adiamento no STF reforça interesse político na prisão de Lula, diz ex-ministro
Após recuo do PEN, decisão sobre prisão em segunda instância só deve ocorrer na próxima semana
Publicado: 12 Abril, 2018 - 11h12
Escrito por: Cristiane Sampaio Brasil de Fato | Brasília (DF)
O adiamento do julgamento da ação sobre prisão após condenação de segunda instância, que poderia ter sido avaliada nesta quarta-feira (11) pelo Supremo Tribunal Federal (STF), intensificou as polêmicas no mundo político.
Depois de apresentar, na semana passada, uma liminar pedindo a soltura de presos condenados após segunda instância até que o Supremo decida sobre o mérito da questão, o o Partido Ecológico Nacional (PEN), autor da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 43, voltou atrás. A legenda solicitou, nessa terça-feira (10), o adiamento da apreciação da liminar, e o pedido foi aceito pelo relator do caso, ministro Marco Aurélio.
O presidente da legenda, Adilson Barroso, disse que o partido não gostaria de ser acusado de beneficiar o ex-presidente Lula (PT), que poderia ser solto até a conclusão judicial do caso do triplex. A declaração provocou reações.
Eugênio Aragão, advogado e ex-ministro da Justiça, explica que o argumento central que questiona a legalidade desse tipo de prisão se baseia no Artigo 5º da Constituição Federal, que garante a presunção de inocência do réu. Para ele, o vaivém do Partido Ecológico reforça os questionamentos sobre o interesse político por trás da prisão do ex-presidente.
“A ação trata de uma questão constitucional muito mais ampla do que Lula. O que tem atrás disso [da mudança] está claro: o PEN não quer de jeito nenhum que Lula saia da cadeia”, avalia.
Justificativa
Oficialmente, o partido alegou junto ao STF que estava trocando o advogado do caso e que precisaria de mais tempo para o novo representante estudar o processo.
Mas o novo advogado, Paulo Fernando Mello, disse à imprensa que o pedido de liminar teria sido apresentado pelo ex-advogado do caso, Kakay, sem o consentimento da direção do partido. Ele afirmou ainda que a sigla jamais teria tido a intenção de defender a prisão somente após o trânsito em julgado, o que intensificou os questionamentos a respeito do interesse do partido com a mudança.
De acordo com informações divulgadas pela grande imprensa, o PEN estaria avaliando inclusive a possibilidade de retirar o pedido. Eugênio Aragão explica que uma eventual desistência esbarraria nas normas legais.
“Como é uma ação que diz respeito ao interesse público, ela é ‘indesistível’. [Isso] não é comum e é vergonhoso porque até a argumentação do presidente [da legenda] chega a ser pífia”, criticou o ex-ministro.
A apreciação da liminar deve ocorrer no STF na próxima semana. O Brasil de Fato tentou ouvir por telefone a legenda e também o presidente do partido, mas as ligações não foram atendidas.
Interesse obscuro
O cientista político Rafael Moreira, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP), aponta que o PEN se insere num contexto de siglas com pouca identidade partidária e que, em geral, seguem posicionamentos de legendas de maior tradição.
Âncora Nas eleições de 2014, por exemplo, a sigla fez parte de uma coalizão liderada pelo PSDB, que tem vários integrantes defensores da prisão após condenação em segunda instância.
“A sensação que se tem é de que o partido [PEN] recua por algum interesse obscuro, que talvez nem seja de fato o interesse próprio. A questão [da ADC] vem à tona num momento que é muito favorável ao bloco político capitaneado pelo PSDB. Não é do interesse deles que essa questão seja retomada por parte do STF”, analisa.
Criado oficialmente em 2012, o PEN tem uma das menores bancadas da Câmara Federal, com apenas três deputados. A sigla surgiu inicialmente com um discurso pró-ambientalista e assumiu posições conservadoras nos últimos anos, chegando a flertar, inclusive, com o deputado de extrema-direita Jair Bolsonaro (PSL-RJ).
Pouco conhecido pelo grande público, o partido ganhou notoriedade nos últimos meses em função da ADC 43. Rafael Moreira destaca que a legenda, assim como outras siglas de pequeno porte, não tem histórico de mobilizações junto ao eleitorado, como, por exemplo, conferências e manifestações de rua.
“São partidos que a gente só lembra que existem quando chegam os anos eleitorais porque eles acabam orbitando em torno de legendas maiores. Esse é o caso do PEN”, acrescenta.
A legenda adota desde o ano passado o nome de “Patriota” e aguarda autorização oficial do TSE para uma mudança definitiva na nomenclatura.