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Ajuste fiscal de Bolsonaro aumentou as desigualdades e injustiça social, diz Inesc

Relatório do Instituto de Estudos Socioeconômicos mostra que a condução política e econômica do país ao longo do governo Bolsonaro deixou marcas negativas profundas, que levarão tempo para ser superadas

Publicado: 17 Abril, 2023 - 13h01 | Última modificação: 17 Abril, 2023 - 13h15

Escrito por: Nara Lacerda, BdF (SP) | Editado por: Rodrigo Durão Coelho / BdF

Roberto Parizotti (Sapão)
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Moradora em situação de rua pede doações na capital de São Paulo

O Balanço do Orçamento Geral da União (BGU) 2022 explicita que o ajuste fiscal imposto nos últimos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL), não trouxe a recuperação da economia e, para piorar, aumentou as desigualdades e injustiça social.

Com o estado subfinanciado, os juros altos e a austeridade, a gestão conservadora deixou de herança “um quadro devastador para a população brasileira”. O documento confirma o cenário de desmonte, que já vinha sendo denunciado por movimentos populares e pela sociedade civil durante toda a gestão de extrema direita.

De acordo com o levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), foram identificados quatro movimentos articulados para que a tragédia fosse colocada em prática. O primeiro deles, foi a desestruturação do Executivo Federal, “entregue a forças privatizantes ou fundamentalistas”.

A lista segue com apontamentos graves, como a percepção de que a gestão bolsonarista atuou para "eliminação física daquelas pessoas, das comunidades e dos povos que não interessam ao projeto fascista e à sua base política”.

Por fim, a relação cita a drenagem de recursos orçamentários para alimentar as eleições dos aliados e a incompetência e presença de equipes totalmente despreparadas para os cargos que ocuparam.

Na análise do Inesc, o superávit primário de R$ 54 bilhões registrado em 2022, último ano do governo de Bolsonaro, foi alcançado “à custa das mortes por covid-19, da fome, da pobreza e do desemprego.” A conclusão é de que o índice expressa a “perversidade” colocada em prática.

A economista Nathalie Beghin, Integrante do Colegiado de Gestão do Inesc, afirma que a austeridade, aliada a ações explícitas de desprezo aos direitos humanos e ao meio ambiente, diferencia a gestão bolsonarista de outros momentos políticos da redemocratização também marcados pela austeridade.

“O desmonte operado expressa um profundo desprezo pela vida. Entendemos que Bolsonaro e sua equipe praticaram uma verdadeira política de morte. Não é por acaso que mais de 700 mil morreram em decorrência da covid-19. Talvez uma das expressões mais perversas disso tudo é que a gestão Bolsonaro não gastou R$ 159 bilhões autorizados pelo Congresso para enfrentar a covid. É uma expressão numérica da irresponsabilidade do descaso e da política de morte praticada pelo governo Bolsonaro."

Os números da perversidade

O balanço traz outros dados e comparações que expressam numericamente onde estavam as prioridades da gestão conservadora e o tamanho dos prejuízos causados ao Brasil nos últimos quatro anos.

Um exemplo, o orçamento secreto destinado a parlamentares que apoiavam Bolsonaro foi de R$ 11,2 bilhões entre 2020 e 2022 em média. O valor é três vezes maior do que tudo o que o governo gastou em alimentação escolar.

Mesmo durante a pior crise sanitária da nossa História, Bolsonaro diminuiu o orçamento da saúde em 8%, tirando R$ 12 bilhões da área. Quase R$ 160 bilhões, autorizados pelo Congresso Nacional para políticas ao longo da pandemia não foram usados pela gestão, enquanto o Brasil via aumentar a falta de emprego, renda e alimentação para uma parcela considerável da população.

Na educação, os recursos caíram de R$ 131 bilhões em 2019 para R$ 127 bilhões em 2022. As creches tiveram 60% menos verba. No ensino superior o investimento caiu 18% em termos reais e houve um esforço explícito de desfinanciamento das pesquisas. Somente na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a execução financeira despencou quase 40%.

A austeridade e a falta de compromisso com os direitos humanos agravaram a déficit de moradia, setor que perdeu 37% da execução financeira nos quatro anos do governo de Bolsonaro. Ao longo da gestão, os recursos para o transporte coletivo público também foram ladeira abaixo, com uma queda de 65%.

Fome

Os prejuízos se acumulam em todas as áreas. No combate à fome, que cresceu significativamente no governo de Bolsonaro, a falta de investimentos explica muito da situação. Ao fim da gestão, o Brasil contabilizava mais de 30 milhões de pessoas em insegurança alimentar, o que não acontecia desde a década de 1990. Jair Bolsonaro não implementou medidas específicas para o tema.

Além disso, políticas voltadas às populações que mais sofrem com a fome foram esvaziadas. O desmonte nas ações voltadas a mães e gestantes, crianças a adolescentes, povos tradicionais, comunidades periféricas e famílias agricultoras teve impacto direto no aumento da fome.

Nathalie Beghin, pontua que o enfrentamento do problema exige uma abordagem ampla, com envolvimento de diversas áreas. Além do comprometimento com recursos, é preciso garantir acesso à renda, fortalecer a agricultura familiar, e recriar redes de apoio, com restaurantes e cozinhas populares .

“Se queremos enfrentar os enormes problemas sociais que o Brasil já tinha e que foram agravados pela gestão Bolsonaro, precisamos de recursos e não é pouca coisa. Precisamos de muito recurso”, alerta ela.

Futuro

Para se recuperar do prejuízo, as áreas desmontadas vão precisar de mais investimentos. O BGU aponta a Emenda Constitucional (EC) nº 126/2022 como uma sinalização positiva de que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pensa assim.

O texto, que ficou conhecido como PEC da Transição durante a tramitação no Congresso, aumentou o orçamento de 2023 em R$ 145 bilhões e retirou programas como o Bolsa Família do teto de gastos. “Não é muito, diante do enorme déficit social que caracteriza o País, mas é um começo para retomar as políticas públicas”, avalia o relatório do Inesc.

Mas esse não é o único desafio. O balanço afirma ainda que o país precisa superar a visão econômica predominante focada em corte de gastos públicos, juros altos, regras fiscais restritivas e tributação injusta, que reforça as desigualdades. Segundo Beghin a velocidade de recuperação vai depender da quantidade de recursos alocados no orçamento.

“Em relação aos retrocessos ocorridos no governo Bolsonaro, eles são profundos e certamente suas consequências irão muito além de um mandato presidencial. Para que os serviços possam ser prestados adequadamente, é preciso recursos para realizá-los, mas também equipes competentes para executá-los. Se as medidas de austeridade continuarem, a velocidade de recuperação será muito mais lenta do que o desejado.”

O BGU traz um conjunto de medidas para cada uma das áreas analisadas e que são consideradas prioritárias na superação do desmonte. Elas envolvem recomposição orçamentária, planejamento, participação social e popular e o fim do teto de gastos.

 

* manchete do BdF modificada pelo PortalCUT