Escrito por: Fenaj
Às vésperas do Dia do Jornalista, FENAJ alerta para campanha do presidente contra a categoria: foram 21 ataques à imprensa no contexto da Covid-19
No próximo dia 7 de abril comemora-se o Dia do Jornalista, e se é óbvio que o trabalho dos profissionais é essencial durante a pandemia do novo Coronavírus,levando informação de qualidade à população de todo o país, a categoria continua sendo golpeada com constantes ataques de quem ainda prefere a desinformação. Muitos deles incentivados pelo presidente da República, Jair Bolsonaro. Em março, foram 21 ataques à imprensa cometidos pelo presidente, somente em relação à cobertura sobre o coronavírus.
O número faz parte de monitoramento feito pela FENAJ desde o ano passado, que passou a contabilizar os ataques do presidente à imprensa e aos jornalistas. O episódio de 31 de março, em que jornalistas foram insultados por apoiadores do presidente, foi apenas o último de um mês inteiro em que o presidente da República tentou colocar seus seguidores contra o jornalismo profissional.
“É muito grave essa campanha patrocinada pelo presidente contra os jornalistas, que são essenciais nesse momento de pandemia. O presidente contribui para o ambiente de desinformação que faz com que parte de seus seguidores ignore as recomendações transmitidas pelos veículos de imprensa, e assim expõe toda a população a riscos”, diz a presidenta da FENAJ, Maria José Braga.
Em 10 de março, em conferência em Miami, nos Estados Unidos, Jair Bolsonaro disse a uma plateia internacional que a crise do Coronavírus era “muito mais fantasia”, e “que não é tudo isso que a grande mídia propala, ou propaga, pelo mundo todo”. Acrescentou que “alguns da imprensa conseguiram fazer de uma crise a queda do preço do petróleo”.
Junto à minimização da pandemia, Bolsonaro seguiu todo o mês de março atacando a imprensa, que noticiava a gravidade da situação. Parte de sua estratégia política, pintou o jornalismo profissional como aliado de governadores e parlamentares, em uma fantasiosa missão de persegui-lo. Em entrevista à Rádio Bandeirantes, em 16 de março, disse que “com esse tipo de trabalho que parte da mídia, que algumas autoridades vêm fazendo, a tendência é a gente viver num clima tenso”.
“O presidente Bolsonaro já ataca a imprensa costumeiramente, e viu na crise do novo coronavírus mais uma oportunidade para tentar colocar seus apoiadores contra o jornalismo profissional, para que mascarasse sua falta de iniciativas mais firmes no combate à disseminação da doença”, diz Paula Zarth Padilha, diretora da Executiva da FENAJ responsável pelo monitoramento dos ataques.
141 ataques em 3 meses
Os ataques à imprensa relacionados ao novo Coronavírus foram apenas uma pequena parte das dezenas de agressões do presidente registradas no primeiro trimestre do ano. O monitoramento da FENAJ levantou, desde janeiro, um total de 141 episódios em que o presidente se pronunciou contra o Jornalismo, o que supera o número de ataques do presidente à imprensa registrados em todo o ano passado.
Em 8 de março, dia em que seria questionado sobre o resultado do PIB de 2019, Bolsonaro colocou um humorista que o parodiava para distribuir bananas aos jornalistas – recusando-se a responder sobre o desempenho da Economia. Apenas em março, foram 77 ataques à imprensa, sendo 68 episódios classificados como “descredibilização da imprensa”, e 9 ataques a jornalistas.
“Vale lembrar ainda graves e lamentáveis episódios envolvendo o presidente neste primeiro trimestre, como as mentiras de cunho machista e misógino à jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S. Paulo, em fevereiro, o que incitou seus apoiadores a hostilizarem a profissional nas redes sociais”, alerta o jornalista Márcio Garoni, diretor da FENAJ responsável pelo monitoramento.
O presidente também atacou outros jornalistas durante os primeiros meses do ano, como Vera Magalhães (O Estado de S. Paulo e TV Cultura), Guilherme Amado (Revista Época), Ricardo Noblat (O Globo) e Thaís Oyama (autora de “Tormenta: O governo Bolsonaro: crises, intrigas e segredos”).
Neste ano, a FENAJ atualizou a metodologia do mapeamento dos ataques de Bolsonaro ao Jornalismo, passando a incluir lives e todas as entrevistas concedidas pelo presidente. É um dos fatores que contribuiu para o aumento dos números, que dão uma noção mais realista do comportamento de Bolsonaro, que, em um mesmo dia, profere vários ataques contra a imprensa, seja em discursos, entrevistas, lives, conversas com apoiadores, e mesmo pronunciamentos em cadeia de rádio e televisão, a exemplo de 24 de março, quando disse que a imprensa provocou que “uma verdadeira histeria se espalhasse pelo nosso País”, ou no dia 9 de março, quando, em um único discurso, proferiu 13 ataques ao jornalismo profissional.
Cartilha de proteção a jornalistas
A grave e constante série de ataques de Bolsonaro contra os jornalistas e a imprensa em geral deixa claro que ele não leu a nova edição da “Cartilha Aristeu Guida da Silva: Proteção dos direitos humanos de jornalistas e de outros comunicadores e comunicadoras”, assinada pelo próprio presidente, e lançada em 3 de março pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
A cartilha recomenda que os agentes do Estado não devem adotar discursos que exponham jornalistas a maior risco de violência ou que aumentem sua vulnerabilidade. Diz ainda ser essencial que as autoridades “reconheçam constante, explícita e publicamente a legitimidade e o valor do jornalismo e da comunicação, mesmo em situações em que a informação divulgada possa ser crítica ou inconveniente aos interesses do governo”, absolutamente o contrário do que faz Jair Bolsonaro desde o início de seu mandato como chefe de Estado. Seu comportamento é um dos fatores que incentivou, por exemplo, que parentes de formandos em Jornalismo no Rio Grande do Sul hostilizassem o jornalista Felipe Boff, que na cerimônia dos estudantes discursou sobre os ataques do presidente à imprensa.
Em uma de suas primeiras entrevistas à imprensa neste ano, Jair Bolsonaro disse que os jornalistas são “uma raça em extinção”, e ironizou que vincularia os jornalistas do Brasil ao Ibama. Sem entrar no mérito do atual papel do Ministério do Meio Ambiente em preservar a vida, respondemos que, ainda mais em tempos de crise, o dos jornalistas é essencial em uma sociedade democrática. Presidentes vão e vêm. O Jornalismo permanece.