Escrito por: Rosely Rocha

 Aplicativo que oferece faxinas a preços baixos pode ser acionado pelo MPT 

 Aplicativo “Parafuzo” oferece faxinas a R$ 19,90. Falta de vínculo empregatício pode ser investigado pelo MPT. Secretário de Relações de Trabalho da CUT, critica precarização

Reprodução anúncio Parafuzo

A humilhação que o ministro da Economia do governo de Jair Bolsonaro, o banqueiro Paulo Guedes, fez às domésticas, ao afirmar que o dólar “barato” virou uma farra para que elas pudessem passar férias na Disney (EUA) não constrangeu empresários que cada vez mais buscam burlar a legislação para oferecer mão de obra doméstica mais barata.

Esta semana as redes sociais repercutiram negativamente o anúncio do aplicativo “Parafuzo”, que oferece ao cliente uma faxina ao preço de R$ 19,90, com a desculpa de que o valor cobrado é por uma hora e meia de trabalho e que uma segunda faxina custaria ao cliente R$ 39,00.

O titular da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes Trabalhistas (Conafret), do Ministério Público do Trabalho (MPT), procurador Tadeu Henrique Lopes da Cunha, explica que do ponto de vista de valor, o aplicativo não comete, a princípio, uma irregularidade, já que os responsáveis por ele, afirmaram, após muitos questionamentos nas redes sociais, que, na verdade, os R$ 19,90 correspondem a uma hora e meia de trabalho, mas que a trabalhadora recebe R$ 39,00. Numa segunda faxina, o usuário do aplicativo pagaria os R$ 39,00 e a trabalhadora receberia R$ 31,00. Com isso, o aplicativo ficaria com a diferença (R$ 8,00).

O procurador do MPT, ao avaliar, única e exclusivamente a questão salarial, a partir das informações contidas no site Hyeness ,que repercurtiu as discussões sobre o assunto nas redes sociais e baseado na resposta que a empresa ofereceu , a Parafuzo não comete irregularidades, já que a hora trabalhada sobre um salário mínimo (R$ 1.045,00) por cinco dias da semana mais 4 horas no sábado equivale a R$ 4,75. Assim, se a faxineira trabalhar por 1 hora e 30 minutos, levando-se em consideração o salário mínimo por hora, ela ganharia R$ 7,13. Logo, seria um valor inferior ao que a empresa alega que paga (R$ 31,00). Por este motivo, não haveria, em princípio, irregularidade no pagamento.

No entanto, a possível precarização das relações do trabalho vai ser analisada pelo MPT, para verificar se há irregularidades e motivos para entrar com uma ação contra o aplicativo, por falta de vínculo empregatício.

Para que a falta desse vínculo seja comprovada é necessária uma investigação mais profunda porque o site do “Parafuzo” não traz a localização de sua sede, e segundo o promotor, é preciso saber qual a origem da empresa e dos trabalhadores cadastrados para determinar o local de uma possível ação.

O titular do Conafret explica ainda que "a questão da precarização deve ser aferida  quando há um rebaixamento de direitos por meio de algum expediente ou artifício realizado pelo empregador ou tomador do serviço".

"Se ficar demonstrado, em uma investigação, que a contratação está irregular e que, por este motivo, estariam sonegados direitos trabalhistas, então, poder-se-ia dizer que é uma situação que enseja a atuação do MPT para fins de regularização",afirma o procurador.

A “Uberização” das relações de trabalho

Este tipo de precarização das relações do trabalho, por meio de aplicativos como Uber, IFood e LOG, entre outros, pode ser também colocada na conta da reforma Trabalhista, promovida no governo golpista de Michel Temer (MDB-SP), que retirou mais de 100 itens de direitos dos trabalhadores da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

A promessa à época da aprovação da reforma Trabalhista era a geração de 6 milhões de empregos, mas o que se vê é o aumento da informalidade. Hoje quase 39 milhões de brasileiros (41,1% da mão de obra economicamente ativa) sobrevivem de bicos e ainda são chamados de “empreendedores”. Outros 11,6 milhões estão desempregados.

“A uberização das relações de trabalho está se expandindo para diversas profissões e, por isso o MPT está olhando esses tipos de contratações com muito cuidado, e estruturando um projeto para alinhar as ideias e estratégias de investigação a fim de uniformizar nossas ações, porque houve vitórias contra a LOG, que está em fase de recurso da empresa, mas a ação contra o IFood foi considerada improcedente”, conta o procurador do MPT.

Já o secretário de Relações do Trabalho da CUT, Ari Aloraldo do Nascimento, diz que o aplicativo da faxina nada mais é do que um eco à voz dos últimos governos que veem a classe trabalhadora como mão de obra escrava. Para ele, o governo golpista de Temer ao fazer a reforma Trabalhista permitiu a precarização das relações de trabalho, enquanto o governo Bolsonaro aprofunda a precarização, retira ainda mais direitos e como se não bastasse, é misógino e ataca as mulheres.

“Desde o golpe de 2016 , que derrubou , a ex-presidenta Dilma,  vemos deteriorar as relações de trabalho. Não temos mais regramentos que protejam o trabalhador. Aqui empresário tem a desfaçatez de sugerir que o trabalhador possa comer com uma mão e operar uma máquina com a outra. Isto é apologia ao trabalho escravo. É esculhambar a classe trabalhadora”, diz Ari Ariolaldo, ao se referir ao empresário Benjamin Steinbruch, que em entrevista à imprensa, disse: “Você vai nos Estados Unidos, vê o cara almoçando, comendo sanduíche com a mão esquerda, e operando a máquina com a mão direita. Tem 15 minutos para o almoço, entendeu?

Trabalho doméstico é feito por 6 milhões de brasileiros e brasileiras

O trabalho doméstico é realizado por mais de 6 milhões de brasileiros e brasileiras. E, apesar da PEC das Domésticas, cujo objetivo é formalizar o trabalho da classe, 70% ainda estão em situação de informalidade, segundo levantamento de 2019 da Revista Exame. Já uma pesquisa de 2018 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que entre as domésticas dois terços são negras.