Escrito por: Leonardo Coelho, especial para a Ponte Jornalismo

Aplicativo contra intolerância religiosa é lançado no RJ

O Oro Orum – Axé Eu Respeito serve para registrar ataques contra espaços religiosos.

Ponte Jornalismo

Após uma série de ataques a terreiros, locais de cultos religiosos de matriz africana, um aplicativo foi lançado nesta sexta-feira (13/10) para mapear casos de intolerância religiosa no Rio de Janeiro. O Oro Orum – Axé Eu Respeito tem como fim registrar estes atos. Somente nos últimos dois meses, foram registrados 39 casos de intolerância religiosa no Estado, de acordo com a Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos (SEDHMI).

Responsável pela iniciativa, o programador Leo Akin, 24 anos, explica que o Oro Orum foi desenvolvido para ser uma ferramenta de combate real à intolerâncias. Segundo ele, o aplicativo possui uma série de funcionalidades para dar segurança aos praticantes de religiões que possam ser ameaçados ou agredidos em função de sua fé. A Ponte cobriu recentemente um destes casos de intolerância religiosa, este ocorrido em Seropédica, também no Rio de Janeiro. Mais casos vêm acontecido regularmente no Rio de Janeiro e outras partes do país.

Para Ivanir dos Santos, diretor do CCIR (Comissão de Combate à Intolerância Religiosa), o aplicativo é uma iniciativa necessária para a área, desde que seja atrelada o quanto antes “à mecanismos oficiais de segurança pública e investigação” dos casos. “Se isso não for conectado a quem tiver que dar respostas concretas, a ação, o registro de tudo vai virar estatística, número, e o efeito vai ser nenhum no sentido de responsabilizar os culpados”, alerta.

Além de programador, Akin é pesquisador e desenvolve projetos semelhantes desde os 14 anos de idade, quando criou o site Oro Orum (Força do Céu) para discutir aspectos da africanidade. De acordo com ele, o aplicativo foi criado a duros passos. “Desenvolvi o aplicativo praticamente sozinho em um computador velho e com uma internet emprestada da minha cunhada”, diz. Leo afirma que teve suporte técnico valoroso do colega pernambucano Alecsandro da Silva e da companheira, a escritora Thaís do Espírito Santo.

O aplicativo já está sendo desenvolvido para IOS, programa operacional da iPhone, mas por enquanto pode ser baixado para smartphones através do Google Play para qualquer celular android com versão superior à 4.0

Leia abaixo a entrevista com Leo Akin, desenvolvedor do Oro Orum – Axé Eu Respeito:

Como foi o processo de criação do Oro Orum – Axé Eu Respeito?

O aplicativo surge de uma proximidade com o Fórum de Juventude, do qual eu participo, e da minha proximidade com o aplicativo Nós por Nós, que denuncia violência policial. A ideia de criar o aplicativo nasce um pouco para lutar contra a normatização que criamos em ver os crimes de intolerância e racismo. Isso já acontece há mais de 500 anos, primeiro com a má educação católica que temos e agora com as denominações evangélicas em peso. Mas o que nossos adeptos hoje fazem a respeito? Fazem uma mobilização espalhada. Aconteceram 8 casos em Nova Iguaçu e a manifestação (contra a intolerância religiosa) aconteceu na Praia de Copacabana. Então, quem foi dar apoio às vítimas em Nova Iguaçu? Ninguém! Não gera uma organização pós-trauma. Estou cansado de ver essa burocratização. O prefeito em vigor diz que vai melhorar as leis e coisas do tipo, ano após ano. Mas não dá para ficar fazendo só passeata e ciranda. É melhor fazer algo que seja útil.

Como funciona o app?

A ideia do aplicativo é a de cadastro, mas ele foi pensado antes mesmo desses última onda de ataques. De forma resumida, no app existe o botão denúncia com opções de 1 – quem fez a agressão e 2 – o que aconteceu

Tem várias opções para pessoa escolher: desde agressão até invasão etc etc. Podem mandar arquivos de video, áudio ou imagens. Na tela inicial você tem a opção de mapear a sua denúncia. Os adicionais são as opções de cadastro. As casas, mesmo sem sofrer violência, podem se cadastrar para entrar no nosso mapeamento. E finalmente tem o botão estatística, no qual você pode compartilhar estatísticas do aplicativo. Isso gera um relatório só com o local que você quiser. O botão mais importante é o botão SOS, que serve para reduzir um dano real.

Um exemplo hipotético é, se estiver rolando uma festa numa casa de matriz africana. Se alguém tocar o botão ele manda um aviso para a rede inteira e para o meu banco de dados que eu criei para monitorar. Automaticamente, alguém vai ver e vai poder acionar um vizinho ou polícia para diminuir o dano ou algo pior. Nós estamos fazendo todos os testes possíveis porque não tem como uma ferramenta que quer reduzir danos reais não funcionar na hora da necessidade. Imagina se na hora H o botão SOS não funciona?

Haverá diálogo com outras instituições?

Já temos uma conversa iniciada com o Ministério Público e nós vamos fazer uma conversa com a Secretaria de Segurança. A Delegacia de Combate a Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) ainda não foi lançada, mas assim que for eu vou tentar levar esse serviço para lá e ver o que eles ou a Secretaria de Segurança podem fazer no que tange a suporte. E também temos uma conversa com a Defensoria Pública para apoio jurídico para essas vítimas. A ideia é fazer uma rede completa de apoio. Porque eu não quero que seja apenas mapeado, eu quero também apuração desses crimes.

Uma parte dos religiosos que sofre ataques é de pessoas mais idosas. Como aproximar essa tecnologia de pessoas menos adaptadas à esse tipo de linguagem?

Realmente existe essa questão porque uma boa parcela do praticantes do Candomblé é mais velha. Contudo eu dei aula para idosos em São Paulo para um projeto chamado “Idoso Conectado”. Lá, aprendi a lidar com como eles aprendem, e acabei percebendo que eles se adaptaram bem. Mas, para facilitar, o app tem uma tela de explicação simples, e haverá também referências em vídeos de como eles podem usar o aplicativo.

Esse aplicativo pode ser usado em âmbito nacional?

Sim. Ele está pronto para ser lançado a nível nacional. Resta criarmos pontes com cada local. A ideia é lançar o app na cidade de Salvador o quanto antes, pois a Bahia tem muito mais casos que o Rio de Janeiro de intolerância religiosa