MENU

Após privatização, pegar trens da CPTM virou um inferno e MPE pede fim do contrato

Doria vendeu à ViaMobilidade as linhas 8 e 9  da  CPTM que levam mais de um milhão de pessoas por dia. A promessa era de serviço melhor. A realidade: acidentes e atrasos

Publicado: 31 Março, 2023 - 15h35 | Última modificação: 03 Abril, 2023 - 10h28

Escrito por: Rosely Rocha | Editado por: Marize Muniz

Redes sociais / Reprodução
notice

Todos os dias mais de um milhão de trabalhadores e trabalhadoras que atravessam a grande São Paulo, passando pelas zonas sul, centro e leste da capital, utilizando as linhas de trens 8 -Diamante e 9 -Esmeralda da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) , privatizadas no governo de João Doria (PSDB), enfrentam um inferno para chegar nos seus locais de trabalho, hospitais ou escolas.

Em muitos dias, não conseguem chegar a lugar por causa de falhas e acidentes nos trens, inclusive com a perda de vidas, como ocorreu com um trabalhador eletrocutado, em março do ano passado ao fazer uma manutenção.

As falhas são tão gritantes que o promotor Silvio Marques, da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social de São Paulo, do Ministério Público Estadual (MPE), disse na quinta-feira (30), após mais um descarrilamento de trens, não haver mais possibilidade de diálogo com a ViaMobilidade e que medidas judiciais serão tomadas em até 15 dias para rompimento do contrato de concessão das linhas 8 e 9. A ViaMobilidade ganhou em janeiro de 2022, a concessão das linhas que eram da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).

Este é mais um dos casos em que a privatização dá lucro para quem compra, prejuízos aos cofres públicos e, principalmente, à toda a população que é obrigada a conviver com um péssimo atendimento dos serviços e ainda pode sofrer com o aumento nas tarifas.

Exemplos de que a privatização é nociva à sociedade são muitos, desde a venda de empresas de energia estaduais e os consequentes apagões, como os ocorridos no Amapá; e combustíveis mais caros com a venda de refinarias como vem ocorrendo na Bahia, onde o valor do litro da gasolina é o maior do país.

Além da população pagar mais caro pelos serviços ruins prestados, as privatizações também promovem desemprego. Este é o receio de 1.600 trabalhadores e trabalhadoras do metrô de Belo Horizonte (MG), que estão fazendo greves e mobilizações – a última greve teve início na terça-feira (28) - contra a privatização da CBTU-MG, vendida em dezembro do ano passado para a concessionária Comporte. Em assembleia nesta quinta-feira (30), eles decidiram manter a paralisação até segunda-feira (3/4).

No caso de São Paulo, são mais de 6.300 trabalhadores que correm o risco de ficar sem trabalho se o governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos), levar adiante seus projetos de privatização das demais linhas 7, 10, 11, 12 e 13 da CPTM que percorrem o interior e a capital.

Perseguições, stress e medo de morrer e desemprego

Os trabalhadores das linhas 8 e 9 da CPTM-SP foram transferidos, mas os poucos que ficaram não estão aguentando o ritmo de trabalho intenso. Muitos do que ficaram na ViaMobilidade pediram demissão, conta um trabalhador que prefere não ser identificado.

“Estamos sendo coagidos, ameaçados de demissão até por justa causa e a possibilidade de privatização das demais linhas é mais um fator de risco porque eleva o nosso nível de stress. Não estou criticando outro trabalhador, mas para chegar ao know-how que temos foi preciso muito treinamento e anos de experiência”, diz o trabalhador.

Com experiência de muitos anos na companhia, ele lamenta a situação dos que foram contratos pela ViaMobilidade, que ganham 30% menos, sem benefícios e trabalham em média 12 horas por dia. O salário médio de um maquinista na CPTM-SP é de R$ 4.500; o da empresa privatizada é de R$ 3 mil.

“Sem experiência, mal remunerados, cansados e deprimidos, um maquinista nesta situação pode causar num vacilo, num piscar de olhos, um acidente fatal muito grave. Estou falando de mortes de 50 pessoas ou mais”, ressalta.

A preocupação com a segurança dos usuários das linhas da ViaMobilidade é um dos motivos que levou o promotor da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social de São Paulo, pedir o fim do contrato da empresa com o governo estadual.

"Não vamos esperar que pessoas morram em razão da falta de competência da empresa para romper o contrato de concessão. Há total desconfiança na possibilidade de a empresa continuar. Eles já prometeram muito e não resolveram os problemas.", disse o promotor Silvio Marques.

Número de acidentes após a privatização de janeiro de 2022 a janeiro de 2023

A ViaMobilidade levou por R$ 980 milhões a concessão dessas duas linhas 8 – Diamante, que percorre desde que a estação Júlio Prestes (centro da capital) e a cidade de Itapevi e a 9 (Esmeralda), com percurso de Grajaú (zona sul) à cidade de Osasco.

Desde o início da concessão, em janeiro de 2022 até janeiro deste ano, foram ao menos 132 falhas acumuladas durante o período. A média é de pelo menos uma falha a cada 2,7 dias de operação nas duas linhas. O número de é sete vezes maior do que os que ocorreram em 12 meses, quando a gestão das linhas era da CPTM.

A linha 8- Diamante sob a responsabilidade da ViaMobilidade: egistrou 52 falhas;

A linha 9-Esmeralda registou 80 problemas que impediram a operação normal dos trens da concessionária;

Ao comparar o número de acidentes das duas linhas quando ainda eram operadas pela CPTM foram registradas 19 falhas, apontou o levantamento da TV Globo; sendo seis na linha 8 e 13 na linha. O número é quase sete vezes menor do o ocorrido no primeiro ano da ViaMobilidade.

O que diz a empresa

A ViaMobilidade responsabiliza a CPTM pelos acidentes devidos às más condições em que receberam os trilhos e dormentes da CPTM.

A empresa disse em nota ao jornal Folha, que que vem investindo em melhorias nas linhas 8 e 9 desde o início da concessão. O plano prevê R$ 3,8 bilhões em investimentos somente nos três primeiros anos, dos quais mais de R$ 1 bilhão já foi utilizado no primeiro ano, além de mais de R$ 950 milhões pagos em outorga.