Escrito por: Rede Brasil Atual

Associação de juízes diz que Gandra fala só por si

Em entrevista, presidente do TST defendeu corte de direitos como meio de manter empregos

Agência Brasil

Ao defender corte de direitos como medida para manter empregos, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Filho, fala em nome próprio, sem representar o pensamento da magistratura, diz a vice-presidenta da Anamatra (associação dos magistrados do Trabalho), Noemia Porto. Durante audiência pública no Senado, nesta segunda-feira (6), ela comentou entrevista de Gandra publicada na edição de hoje do jornal Folha de S. Paulo. Segundo Noemia, a entrevista deve ser vista com respeito, por conter a interpretação do ministro, mas ele "fala em seu nome e não em nome da Justiça do Trabalho", formada por quase 4 mil magistrados.

As declarações mostram, mais uma vez, que há discordâncias no Judiciário em relação à chamada "reforma" trabalhista, representada pela Lei 13.467, que entrará em vigor a partir de sábado (11). Não há novidade no teor da entrevista de Ives Gandra, que desde a sua posse na presidência mostrou-se um defensor da flexibilização e, em certa medida, crítico da própria Justiça do Trabalho, que teria um papel excessivamente "protecionista", conforme afirmou mais de uma vez. Em audiência no Senado, chegou a sugerir que trabalhadores podem se mutilar para conseguir indenizações trabalhistas.

Mas o ponto de vista de Gandra a respeito das mudanças na legislação é minoritário no próprio órgão máximo do Judiciário trabalhista. Em maio, por exemplo, 17 dos 27 juízes que compõem o TST manifestaram-se contra o então projeto de lei da "reforma", que seria aprovado no mês seguinte. Para esses magistrados, o projeto eliminava ou restringia "várias dezenas de direitos individuais e sociais'.

A lei prestes a entrar em vigor sofre críticas de entidades de magistrados e procuradores do Trabalho, que por sua vez têm recebido ataques por uma suposta "rebeldia" contra a aplicação do texto. "Todo texto normativo exige um contexto de interpretação jurídica", argumenta Noemia.

Para ela, "apenas uma discussão, plural, técnica e abrangente pode talvez legar, para as presentes e futuras gerações, uma legislação capaz de incorporar os problemas reais do mundo do trabalho, sem nenhuma dessas falácias sobre modernidades, geração de empregos a partir da redução de direitos, ou a partir da ideia jamais comprovada de que a produtividade do setor econômico tem relação direta com a degradação da pessoa do trabalhador".

A vice da Anamatra participou de audiência pública que tem como tema a elaboração de um estatuto do trabalho. O assunto é discutido em uma subcomissão temporária, presidida pelo senador Telmário Mota (PTB-RR). Quem conduziu a sessão de hoje foi o vice, Paulo Paim (PT-RS).

O presidente da CUT, Vagner Freitas, também reagiu às afirmações de Gandra, dizendo que o que Temer fez com a reforma foi "legalizar o bico".

"Emprego depende de fortes investimentos públicos e privados, acesso ao crédito, fortalecimento do mercado interno e uma série de decisões políticas que um governo ilegitimo e corrupto não tem condição nem competência para fazer", disse Vagner em rede social. "Fome, miséria e subemprego não resolvem o problema, só pioram."

A CUT organiza os sindicatos filiados em uma campanha por um projeto de lei de iniciativa popular para anular a Lei 13.467. São necessárias 1,3 milhão de assinaturas. Entidades fazem coletas de assinaturas por todo o país.

O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, considerou "inoportunas" as afirmações do presidente do TST. "Entendemos que as declarações do ministro erram na forma e no conteúdo, já que revelam um posicionamento arcaico, demonstram falta de sensibilidade social e não valorizaram a importância dos representantes dos trabalhadores no equilíbrio das relações entre empregados e empregadores", afirmou em nota.

O presidente da CTB, Adilson Araújo, diz que a entrevista foi "uma afronta à trajetória de luta da classe trabalhadora pela conquista, ampliação dos direitos e proteção social". Segundo ele, com esse posicionamento Gandra "assina sua defesa de que a nova legislação trabalhista foi elaborada para servir aos patrões, e não para equilibrar a relação de trabalho".