Ataques aos Direitos Humanos representam manutenção de um pacto colonial
Ex-ministros dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi e Nilma Lino Gomes, debateram retrocessos sociais nos pós golpe na noite desta sexta (18), na Universidade Federal do Paraná
Publicado: 19 Maio, 2018 - 13h01 | Última modificação: 19 Maio, 2018 - 13h54
Escrito por: Gibran Mendes, CUT-PR
Resgate da história e reflexões sobre os avanços e retrocessos dos Direitos Humanos no Brasil e no mundo foram temas de um debate na Universidade Federal do Paraná (UFPR), na noite desta sexta-feira (18), que contou com a presença dos ex-ministros Paulo Vannuchi e Nilma Lino Gomes.
O retorno do Brasil ao mapa da fome, a aprovação da reforma trabalhista, que fragiliza ainda mais as relações de trabalho e atinge diretamente mulheres e jovens, a PEC do teto de gastos públicos e a própria intervenção militar no Rio de Janeiro são claros exemplos de golpes e retrocessos nos Direitos Humanos, disse a ex-ministra da Igualdade Racial e Direitos Humanos de Dilma Rousseff.
Segundo Nilma, os ataques aos Direitos Humanos, embora tenham crescido no Brasil após o golpe de 2016, já existiam. “Vivemos tensões durante todo o tempo em que estive no ministério. Existia muita pressão de setores conservadores e fundamentalistas para não aprofundarmos pautas como questões quilombolas, raciais, LGBTI, entre tantas outras”, recordou.
Os avanços obtidos ao longo dos últimos anos, diz Nilma, são frutos de ações de um governo “democrático e popular”. “Estes temas são considerados questões sociais que demandavam resposta do estado, tornavam-se temas propositivos. Hoje estas pautas são vistas como entraves.”
Embora ações de desconstrução dos Direitos Humanos sejam políticas do governo ilegítimo e golpista de Michel Temer, de um projeto de Estado representado por aqueles que deram um golpe, os retrocessos igualmente encontram apoio em setores da sociedade - da classe média, da elite e, até mesmo, em alguns setores populares, lamenta a ex-ministra.
Intervenção Rio de Janeiro
No caso da presença do exército nas ruas da capital carioca, especialmente, Nilma avalia os reflexos sociais. “Não é apenas o direito de ir e vir, mas o reforço da ideia de que os sujeitos considerados suspeitos são os que estão nas vilas e favelas onde o exército está. Quando se faz isso reforça a ideia de que esses sujeitos são considerados suspeitos números um e eles devem ser exterminados”, exemplificou.
Assassinatos como o da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes, segundo a ex-ministra, são reflexos dessas políticas. “E são também mensagens para quem luta pelos Direitos Humanos. Esta mensagem está sendo transmitida das formas mais diversas para nós neste momento. É uma mensagem de morte”, completou.
O ex-ministro dos Direitos Humanos de Lula, Paulo Vannuchi, por sua vez, recordou as lutas que envolvem o tema ao longo da história. Desde Zumbi dos Palmares, passando pela luta contra a ditadura e pelas Diretas Já, até a morte da vereadora Marielle em março deste ano.
O ex-ministro também analisou os avanços dos Direitos Humanos ao longo dos últimos governos, desde a redemocratização, e aproveitou para comentar a afirmação de que “não há liberdade sem igualdade e não há igualdade sem liberdade”.
Segundo Vannuchi, é impossível uma sociedade com liberdade, igualdade e fraternidade em um modelo capitalista. “Caso teu tenha uma empregada e entregue para ela metade do meu salário, ainda assim não seremos iguais. Eu serei patrão. Uma sociedade assim só poderá ser construída desde que deixe de existir a exploração da força de trabalho de um ser humano por outro”, garantiu.
Retrocesso no Brasil e no mundo
Apesar do momento delicado pela qual passa a frágil democracia brasileira, a ex-ministra Nilma da Igualdade Racial e Direitos Humanos do governo Dilma fez questão de ressaltar que os retrocessos ocorrem não apenas no Brasil, mas é uma onda internacional, "principalmente em países latino-americanos e africanos”.
“Existem forças colonizadoras dominantes que nunca aceitaram sair deste lugar, sempre tentaram manter um laço colonial, mas hoje um laço colonial do século XXI”, afirmou a ex-ministra, reforçando a ideia de que, nessas nações, há uma forte tentativa de manutenção do status quo - termo empregado para expressar a ideia de que as históricas elites econômicas jamais permitiram alterar o estado de coisas que garantiram até hoje seus privilégios.
Lembrança de José Dirceu
O ex-ministro de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, aproveitou a oportunidade para resgatar as lutas do movimento estudantil durante a Ditadura Militar e destacou o papel de José Dirceu, uma das principais lideranças estudantis daquele período.
O ex-ministro recordou que Dirceu poderia estar a caminho de Curitiba, um dos possíveis locais de sua detenção, enquanto o debate acontecia. “Foi condenado a 30 anos de prisão, pena que nenhum serial killer teve no Brasil, nenhum torturador do DOI-CODI que violentou mulheres. Aliás, o discurso para prender justificado para não favorecer a impunidade. Mas vem, coincidentemente, de quem sempre se opôs a punição destes torturadores”, enfatizou.