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Ato defende combate às fake news e regulação democrática das plataformas

Participantes do ato entendem que novas tentativas de adiamento “objetivam não aprofundar, mas sim enterrar o debate sobre as fake news

Publicado: 10 Maio, 2023 - 09h35 | Última modificação: 10 Maio, 2023 - 10h46

Escrito por: CUT-RS

Marcelo Ferreira/Brasil de Fato RS
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Dezenas de entidades estiveram representadas no ato em favor da aprovação do PL 2630 e contra as fake news, realizado pelo Comitê Gaúcho do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), na manhã desta terça-feira (9), na Sala de Convergência Adão Pretto da Assembleia Legislativa do RS, em Porto Alegre.

O Projeto de Lei nº 2630/20 institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. O texto cria medidas de combate à disseminação de conteúdo falso nas redes sociais, como Facebook, Instagram e Twitter, e nos serviços de mensagens privadas, como WhatsApp e Telegram, excluindo-se serviços de uso corporativo e e-mail.

De autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e já aprovado pelo Senado, a proposta tramita na Câmara dos Deputados, com relatoria do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), sofrendo oposição de parlamentares de extrema direita, setores da bancada evangélica e grupos de partidos.

Também participaram as deputadas Laura Sito, Sofia Cavedon e Stela Farias e os deputados Adão Prettto e Pepe Vargas, todos do PT, e a vereadora Abigail Pereira (PCdoB), de Porto Alegre.

Carta aberta defende regulação democrática das plataformas

Antes das manifestações, foi realizada a leitura da Carta aberta “Regulação democrática das plataformas com urgência”, da Coalizão Direitos da Rede, apoiada pelo FNDC, que até a atividade já contava com mais de 60 assinaturas e continua coletando adesões.

A carta afirma a necessidade urgente da votação e aprovação do PL 2630, chamada de PL das Fake News, no Congresso Nacional, e que novas tentativas de adiamento “objetivam não aprofundar, mas sim enterrar o debate”.

Trecho do documento defende que “faz-se necessário garantir um modelo de regulação público, que contemple freios e contrapesos, conte com participação multissetorial e evite instrumentalização. O Brasil pode, mais uma vez, ser exemplo de proposições democráticas sobre a governança da Internet, assim como no caso do Marco Civil da Internet”.

Como exemplo, o texto cita que “a proposta ganhou mais centralidade diante das preocupações que cresceram, especialmente no contexto das eleições e na tentativa frustrada de golpe no 8 de janeiro, quando restou nítida a insuficiência da ação das plataformas digitais para conter a desinformação e os ataques à democracia.”

Plataformas digitais colocam em risco a democracia e a soberania

Integrante do Comitê Gaúcho do FNDC, a jornalista editora do Brasil de Fato RS, Katia Marko, disse na abertura do ato que é papel do FNDC debater essa questão “tão importante para a nossa vida, para a vida do país e para a humanidade”.

Segundo ela, há o entendimento de que as “big techs” são, em grande parte, responsáveis pela crise civilizatória pela sob a qual vive o mundo.

“A regulação dessas plataformas é fundamental”, afirmou, destacando que essas grandes empresas, a exemplo do Google, têm faturamentos que muitas vezes são maiores do que o PIB de vários países. Essas corporações, frisou, “estão dominando eleições em diversos países e colocando em risco a democracia e a soberania”.

Katia lembrou ainda que o FNDC, há 30 anos, desde a promulgação da Constituição, está debatendo a liberdade de expressão e o direito humano à comunicação. “Influenciamos em várias leis no nosso país, como a Lei do Cabo, como a Lei das Rádios Comunitárias, como o Marco Civil da Internet e tantas outras. Além de termos elaborado muitos projetos para a regulação dos meios de comunicação, que ainda é um debate que precisamos fazer no país.”

Debate está dominado por quem tem maior poder econômico

A deputada Laura Sito, que preside a Frente Parlamentar pelo Combate à Disseminação de Notícias Falsas e Comunicação Propositada de Desinformação, ressaltou que o debate sobre o tema está dominado por quem tem maior poder econômico.

“As ‘big techs’ disputam globalmente a formação de opinião a partir do interesse privado de pessoas que estão entre os mais ricos do planeta. Porém quando isso é apontado, os donos das redes reclamam de censura, sendo que usam deliberadamente do seu poder para promover opiniões que favoreçam a continuidade do seu domínio”, disse

A deputada alertou que somente em 2022 o mercado publicitário brasileiro movimentou R$ 42 bilhões, sendo que R$ 24,8 bilhões foram negociados nessas plataformas “sem mecanismos de transparência eficazes”.

Ela frisou também que há canais que investem pesado em publicidade e que lucram com a propagação de notícias falsas. “É um modelo de negócios calcado na disseminação do ódio movimentando milhões de reais que incide sobre a nossa condição do espaço democrático”, completou.

Fake news alimentam ódio, racismo, machismo e violência

A vereadora Abigail Pereira pediu urgência na aprovação para “garantir a democracia e a justiça social”. Ela lembrou que “as opressões estruturais passam batido na internet, a violência que nós, mulheres, sofremos, que LGBTQIA+ sofrem, que as pessoas negras sofrem na internet, o ataque é violento demais”.

Segundo Biga, as fake news alimentam “o ódio, o racismo, o machismo e a violência contra as nossas crianças e adolescentes”, citando os recentes casos de violência nas escolas, tramados na internet.

Enfrentamento não é só às "big techs", mas ao campo da ultradireita

A deputada Sofia Cavedon disse que o enfrentamento não é só às “big techs”, mas “ao campo da ultradireita, que defende a liberdade, mas que põe bem grande entre aspas a liberdade de expressão”.

Para a deputada, “eles defendem a liberdade total e absoluta para continuar mentindo, deturpando e sem se responsabilizar pelas graves consequências de uma comunicação que encobre autores criminosos”.

“Só foi possível passar esse abril sem mais mortes de crianças no Brasil porque nosso governo federal e as polícias estaduais agiram na intranet, nessas redes que cooptam nossas crianças, nossos adolescentes. Não importa a vida dos nossos adolescentes, a violência que propaga, eles querem a liberdade de conduzir a política, de destruir quem quer construir um Brasil democrático”, pontuou Sofia.

Sociedade não pode ficar refém das plataformas digitais

O secretário de Comunicação da CUT-RS, Ademir Wiederkehr, recordou que a luta pela democratização da comunicação vem de longe, impulsionada no estado quando o jornalista Daniel Herz fundou o FNDC. “Fizemos inúmeros debates nos últimos anos combatendo as fake news. Tivemos debates na UFRGS, na Unisinos, juntando academia, estudantes e movimento sindical, para mostrar que esse tema tem que ser debatido em todas as esferas porque a sociedade brasileira não pode ficar refém do que definem as grandes plataformas digitais, do que acontece na internet”, disse.

Segundo o sindicalista, a luta não é por censura, "que aconteceu na ditadura militar", mas “por uma regulação democrática do que é veiculado nos meios digitais, nas redes sociais”.

Na avaliação de Ademir, mesmo não sendo perfeito, o projeto aponta para um regramento na questão do combate às fake news e na regulação das plataformas. “Vimos o que aconteceu nas últimas eleições, se não tivermos uma forma de regulação, essa farra de fake news vai continuar e não podemos deixar isso seguir”, finalizou.

"Big techs" pressionam governos e STF

Diretor da CTB-RS, Eder Pereira afirmou que a central sindical tem bem clara a importância do PL para a sociedade brasileira. “É uma questão de segurança nacional”, assegurou, avaliando que sem essa regulação, as “big techs” vão cada vez mais interferir na sociedade e nas políticas públicas do país.

“Vão querer comandar a massa dos trabalhadores que acabam sendo sim influenciados por elas a fazerem pressões ao governo que nós elegemos democraticamente. Fazendo pressões aos governantes, ao Supremo Tribunal Federal, daquilo que entendem que para eles é melhor”, disse.

Para Eder, o caso é de soberania, pois é necessário que fique claro “quem paga as publicidades contra o interesse da sociedade”.

Débora Beina/AL-RSDébora Beina/AL-RS

Regulação das plataformas é importante para educação pública

Para o diretor de Comunicação do CPERS Sindicato, Leonardo Preto Echevarria, a regulação democrática das plataformas digitais é de suma importância para os educadores, as educadoras e a educação pública. “Além de combater as mentiras, a gente vai conseguir impedir que os nossos jovens tenham acesso a grandes inverdades, como, por exemplo, que Hitler era de esquerda”, destaca.

O educador também ressalta os valores milionários que as Big Techs recebem. “É necessário a regulamentação, porque as grandes plataformas detêm um poder econômico monstruoso e não tem como a gente combater isso. Além da comunicação ser um direito humano, a democracia enfrenta um viés muito difícil sem a regulamentação das plataformas digitais”, finaliza.

Remuneração do conteúdo jornalístico para jornalistas

A presidenta do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (SindJoRS), Laura Santos Rocha, destacou o papel do jornalismo, “de melhor informar a sociedade para manutenção da nossa democracia”.

Ela ressaltou também a importância da aprovação da proposta legislativa que visa regular as gigantes da tecnologia que atuam no Brasil, “assim como mecanismos de regulação com penalidade para quem venha disseminar ou patrocinar notícias falsas ou criminosas”.

Laura disse que o sindicato defende a proposta de regulação democrática das plataformas digitais, desde que ocorra uma discussão sobre a remuneração do conteúdo jornalístico para os e as jornalistas.

A sindicalista pontuou que a Fenaj defende a taxação das grandes plataformas digitais e a criação do Fundo Nacional de Apoio e Fomento ao Jornalismo (Funajor) como medidas mais efetivas para garantir a sustentabilidade do ecossistema de produção de notícias.

Também destacou a importância da PEC dos Jornalistas. “Restituir o diploma em jornalismo é valorizar a profissão, defender a nossa regulamentação e a qualidade, a responsabilidade no jornalismo, na comunicação e na sociedade. É fortalecer as universidades. Uma profissão que garante o equilíbrio no exercício da democracia no país precisa ter o respeito e a importância legal”, concluiu Laura.

Desinformação levou o país ao golpe de 2016

O diretor da Associação Gaúcha de Radiodifusão Comunitária (Abraço/RS), João Carlos Heissler, que veio de Santa Cruz do Sul, recordou que nos últimos anos a desinformação levou o país ao golpe de 2016.

Para ele, o regramento em relação às fake news é urgente, mas existe muito mais ainda a ser feito para democratizar a comunicação no país.

“Nós, das rádios comunitárias, não temos direitos aos recursos públicos, tanto estaduais quanto federal, cai tudo em uma ou algumas contas daquilo que tem sua organização. Para se inscrever, teria que ter a autorização de um órgão estruturado pela extrema direita, que comanda esse conjunto de desinformações junto com a grande mídia”, exemplificou.

PL 2630 é um projeto para regular a internet

Presidente da Associação Riograndense de Imprensa (ARI) e diretor da Regional Sul da Fenaj, José Nunes defendeu que a aprovação do PL 2630 “é fundamental para a questão da liberdade, responsabilidade e transparência na internet”.

Ele sugeriu “deixar claro para a sociedade que não é um projeto do Executivo, não é um projeto de um governo de esquerda, é um projeto que vem para regular a questão da internet”, aprovado no Senado após ser encaminhado em 2020 pelo senador Alessandro Vieira, filiado ao PSDB. “E o PSDB fez voto contrário a um projeto que foi encaminhado por eles”, lembrou.

José Nunes lembrou que, desde a aprovação da Constituição, em 1988, a área da comunicação não foi regulamentada. “Por que o medo de regular a comunicação no Brasil? Lá na época eram as grandes empresas de comunicação que dominavam o mercado, faziam triangulação, que impede a questão de rádio, TV e jornal."

"Agora tem-se a possibilidade de regular a questão da internet, alguns setores têm medo, mas hoje aquelas empresas que foram contrárias à regulação estão juntas conosco, querendo essa regulação porque mexeram no seu bolso”, disse.

Mobilização imprescindível para toda a humanidade

Procurador do Estado, o advogado Paulo Torelly lembrou que o Poder Judiciário fez um ato pós o 8 de janeiro em defesa da democracia e que, na ocasião, o presidente da OAB foi vaiado porque relativizou as medidas que estavam sendo adotadas pelo STF.

“A democracia brasileira está em risco e a própria humanidade, então esse é um debate urgente e necessário. É o momento para se fazer o serviço completo, ou seja, temos que regulamentar os grandes veículos de comunicação também dentro desse contexto”, disse

Torelly recordou de “mensagens bizarras no último período, como por exemplo, o nazismo ser de esquerda”. Ou ainda que os atos antidemocráticos de 8 de janeiro foram realizados por eleitores de Lula.

Para o advogado, questões dessa natureza tentam criar uma realidade virtual e distorcer o próprio processo histórico. Nesse sentido, homenageou a mobilização, que considera “imprescindível não só para o futuro da população brasileira, mas de toda a humanidade”.

"Fazer a reforma agrária no ar"

O deputado Adão Pretto Filho (PT) disse que o ato não dizia respeito apenas à necessária aprovação do PL que é necessário, mas sim à defesa da democracia e dos direitos humanos. “Ao longo da história vimos tantos ataques à democracia, inclusive partidos e políticos de extrema direita ganharam eleições em virtude da mentira, da ganância. Agora nós temos essa oportunidade de regulamentar, de fazer justiça a tantas maldades que aconteceram nesse país”, pontuou.

“Eu lembrei de uma frase que meu pai dizia, que era ‘temos que fazer a reforma agrária no ar’. Que a partilha dos recursos possa ir para os pequenos, para os médios comunicadores, que possam também ocupar esse latifúndio que muitas vezes leva desinformação, inverdades e que nós possamos combater”, disse.

Mentiras contra prevenção da covid-19

Representando a deputada Bruna Rodrigues (PCdoB), Josiel Rodrigues, que também é dirigente da União da Juventude Socialista (UJS), avaliou que a campanha é em defesa da vida. “Vivemos os dois últimos anos enfrentando em um ambiente digital o que havia de mais nefasto e mentiroso no que dizia respeito às medidas sanitárias em relação à prevenção da covid-19.

"Vemos hoje a nossa juventude praticar suicídio, mutilação, porque são incentivados nessas plataformas. Vimos recentemente, inclusive, um homem ser espancado no estado de São Paulo porque foi vítima de fake news. Então falar disso também é falar da vida”, salientou.

Josiel lembrou que mais uma eleição está chegando. “Conquistamos a retomada de um ambiente democrático a duras penas, vendo a sociedade consumir o que era de mais mentiroso e podre. Precisamos estar prontos para essa batalha. Precisamos entender o papel que a internet ocupa nesse processo de tomada de decisão eleitoral”, sugeriu.

Combater fake news é combater racismo estrutural

Encerrando as manifestações do ato, a advogada Pérola Sampaio, da Associação de Juristas pela Democracia, saudou a Lei nº 10.639, que institui o ensino da história da África e a valorização da cultura afro-brasielira nos currículos escolares.

“Uma história em que foi feita uma fake news porque, na realidade, não nos contaram a verdadeira história. Quando a gente fala de comunicação, o direito à comunicação é um direito humano e esse direito, quando não é garantido, ele fere a dignidade da pessoa humana e é essa dignidade que estamos aqui discutindo.

Ela disse ainda que, enquanto filiada e representante do Movimento Negro Unificado, “a pauta das fake news é muito cara para nós. Inclusive para nós, mulheres feministas, em especial para nós, mulheres negras, porque as pessoas estão perdendo a vida devido à fake news e temos que dar um basta através de um regramento, um marco regulatório que vai pautar essa questão”. Segundo ela, “isso também é combater o racismo estrutural”.

Com informações de Brasil de Fato RS e CPERS Sindicato