Escrito por: CUT-RS

Avança diálogo tripartite para acordo sobre ambiente da terceirização no RS

De acordo com os representantes sindicais, as condições de trabalho são degradantes, existe forte assédio moral, atraso e não pagamento de salários e das verbas rescisórias

Matheus Piccini / CUT-RS

O superintendente regional no Rio Grande do Sul do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Claudir Nespolo, promoveu, na manhã de sexta-feira (27), a terceira reunião de diálogo tripartite sobre a realidade do trabalho terceirizado no estado, desta vez para ouvir as representações sindicais dos trabalhadores e das trabalhadoras.

Estiveram presentes dirigentes da CUT-RS, centrais, federações e sindicatos. O encontro ocorreu no gabinete da Superintendência Regional do Trabalho (SRT), no centro de Porto Alegre.

A regulamentação do ambiente da terceirização foi o pedido comum dos presentes na reunião. De acordo com os representantes sindicais, as condições de trabalho são degradantes, existe forte assédio moral, atraso e não pagamento de salários e das verbas rescisórias.

Ainda de acordo com os dirigentes, as empresas terceirizadas desaparecem ao final do tempo de prestação de serviço, e o trabalhador não tem de quem cobrar.

Novos modelos de exploração

Para o secretário eleito de Relações do Trabalho da CUT-RS, Tiago Pedroso, os novos modelos de organização do trabalho trouxeram novos modelos de exploração, em razão das consequências da reforma trabalhista, aprovada no governo ilegítimo de Michel Temer (MDB), em 2017, pois permitiu a ocupação da atividade-fim por terceirizados.

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“Somente a fiscalização dos sindicatos não consegue coibir as más práticas. É preciso que haja maior estrutura do Ministério do Trabalho e Emprego, com a contratação de novos servidores, para garantir a regularidade e o cumprimento das obrigações das empresas em relação aos contratos”, defendeu Tiago.  

A secretária de Formação da CUT-RS, Maria Helena de Oliveira, observou que no estado um dos problemas é a terceirização. Ela explicou que a Central de Licitações do Estado (CELIC) faz o processo licitatório e quem contrata é o poder executivo, porém, “não acompanha a execução do contrato e, depois que termina, não se responsabiliza, nem é solidário com as questões contratuais, deixando os trabalhadores e trabalhadoras nas mãos de empresas que não cumprem seus acordos”, denunciou a dirigente.

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Nas licitações públicas, o critério do menor preço aplicado sem avaliações e normas detalhadas é apontado como um dos grandes problemas, impedindo que empresas qualificadas vençam processos licitatórios. Para mitigar os problemas, empresas e trabalhadores querem os agentes públicos na mesa de negociação.

“Hoje foi um passo importantíssimo para esse acordo, para que possamos minimizar os efeitos causados aos trabalhadores e trabalhadoras, não só nas verbas rescisórias, mas também no ambiente em que esses trabalhadores executam suas atividades”, avaliou Maria Helena.

Acordo deve assegurar trabalho decente

De acordo com Claudir, o propósito desse diálogo tripartite é construir um documento conjunto (empregados, patrões e governo) com compromissos para aumentar o rigor nas práticas legais no ambiente terceirizado, assegurar trabalho decente para os trabalhadores e maior segurança para empreendedores responsáveis. “Vamos buscar apoio de órgãos públicos para formalizar propostas de consenso que tenham força capaz de gerar mudanças na lei se necessário”, destacou.

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O presidente do Senergisul, Antônio Silveira, relatou que 90% dos trabalhadores da CEEE Equatorial são terceirizados. “É uma tragédia humana que isso gera no setor. O que acontece é um despreparo dos trabalhadores, que morrem na linha energizada em decorrência do lucro máximo das empresas”. Ele também enfatizou que o sindicato precisa representar quem atua na atividade fim.

“Há quarteirização, quinteirização; é um grande ataque à classe trabalhadora”, declarou o presidente da Federação Democrática dos Sapateiros do RS, João Batista Xavier, relatando que o setor do calçado atua na terceirização desde 1996. “A terceirização é um câncer na produção”, completou o representante dos sapateiros e das sapateiras.

“Essa situação é vil e precária em vários segmentos que também fazem o uso indevido de quem é microempreendedor individual”, interviu Júlio Ferraz, diretor da Federação Interestadual dos Trabalhadores e Pesquisadores em Serviços de Telecomunicações (Fitratelp) e do Sinttel-RS. Ele ressaltou ainda que não há representação sindical para quem é MEI, trabalhador desprotegido por não ter acordo coletivo.

Dumping Social

Durante o encontro, a Federação dos Empregados em Empresas de Asseio e Conservação do Rio Grande do Sul (FEEAC-RS) apresentou um estudo no segmento de serviços terceirizadas de limpeza e asseio, que tratou de explicar o “dumping social” na contratação de serviços públicos.

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O termo "dumping social" se refere à prática de empresas que buscam reduzir seus custos trabalhistas ao contratar mão-de-obra terceirizada a preços mais baixos, muitas vezes em condições precárias e com salários abaixo do mínimo estabelecido por lei.

Isso resulta em uma competição desleal entre empresas que respeitam as regulamentações trabalhistas e aquelas que não o fazem, minando os direitos dos trabalhadores e enfraquecendo o mercado de trabalho.

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No RS, o dumping social tem se manifestado em diversos setores, como segurança, limpeza, manutenção e logística, onde muitas empresas contratam mão-de-obra terceirizada para reduzir seus custos operacionais. Isso frequentemente leva a condições de trabalho precárias, com trabalhadores recebendo salários abaixo do estabelecido, sem direitos como férias, 13º salário e outras conquistas garantidas na legislação trabalhista.

“Não há um estatuto federal para garantir direitos mínimos e critérios de contratação nas três esferas de governo”, resumiu Adroaldo Costa, advogado do Senergisul. “O grande fraudador é o poder público, que é cúmplice de ilegalidades e precisa ser responsabilizado”, completou.

Os representantes das entidades sindicais reivindicam o acompanhamento de processos licitatórios para evitar problemas, que têm se tornado recorrentes nas gestões públicas, gerando enormes passivos trabalhistas e interrupção na prestação de serviços.

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Relações cínicas
 
Para a observadora do Instituto do Trabalho e Transformação Social (ITTS) e economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Lúcia Garcia, é urgente aprimorar os critérios de contratação que sejam capazes de responder às necessidades sociais.

“Ao considerar apenas a externalização de responsabilidades e a contenção imediata dos orçamentos governamentais, os administradores públicos encaminham processos de terceirização orientados pelo cinismo, pois já sabem que as planilhas de custos apresentadas pelas empresas que vencem licitações são inexequíveis – sequer cobrem o que elas alegam que gastarão”, analisou Lúcia.

A especialista em Trabalho observou que não há margem para a recompensa econômica empresarial justa pela prestação do serviço, nem para pagar bem os trabalhadores. “Se constitui uma relação cínica que não gera o serviço de qualidade para a cidadania e prejudica os  trabalhadores”, completou a economista.    

Com informações de Stela Pastore – IRRS