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Biografia de Marisa Letícia Lula da Silva resgata seu protagonismo

Jornalista Camilo Vannuchi conta a infância, a vida de trabalhadora, o casamento, e a relação com os filhos. E ressalta a importância de Marisa Letícia na construção do PT e no governo Lula

Publicado: 30 Janeiro, 2020 - 15h19 | Última modificação: 30 Janeiro, 2020 - 15h35

Escrito por: Cláudia Motta, da RBA

JUCA MARTINS
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Camilo Vannuchi conheceu Marisa Letícia em 1986. Tinha 7 anos e acompanhava o pai, Paulo Vannuchi – que viria a ser ministro dos Direitos Humanos em um ainda inimaginável governo Lula –, num dia de intensa atividade da campanha do então metalúrgico a deputado constituinte. “Já era noite quando passamos na casa do candidato para repor material e para que Lula pudesse ver a família e dar alguns telefonemas. Ainda faltava uma última agenda a cumprir. Meu pai estava preocupado comigo. Já não era mais hora de zanzar pela rua. ‘Deixa ele aqui com os meninos’, convidou Marisa. ‘Se ele quiser dormir, tem lugar’. Fiquei.”

Mais de três décadas depois, o jornalista Camilo Vannuchi conta essa e muitas outras histórias no livro Marisa Letícia Lula da Silva, da Alameda Editorial. A obra, com 408 páginas e 40 fotografias, está em pré-venda (R$ 64). Será lançada no próximo dia 6 de fevereiro em São Paulo, no bar Canto Madalena, e no dia 10 no Rio de Janeiro, na Livraria Leonardo da Vinci. Marisa morreu em 3 de fevereiro de 2017, a dois meses de completar 67 anos.

“Essa memória veio clara na minha cabeça”, relata Camilo. “Lembro de episódios muito prosaicos. O Marcos Cláudio (filho do primeiro casamento de Marisa), que devia ter uns 14 anos, fazendo tostex de presunto e queijo para aquelas crianças famintas. E eu brincando ali com o Sandro, um ano mais velho que eu, de heróis, bonequinhos.” Sandro Luís seria mais tarde o pai de Arthur. O caçula, Luís Cláudio, tinha 1 ano.

A relação com a família, no entanto, sempre foi eventual. Camilo avalia ter falado com Dona Marisa não mais do que cinco vezes e outro tanto desse em que só a cumprimentou. Para narrar a vida de Marisa, entrelaçando-a com a história do país, pesquisou por quase três anos, visitou lugares por onde a história de Marisa se passou, fez apurações rigorosas e entrevistou mais de 90 pessoas. “Fiz uma entrevista com a Marisa em 2009, uma única vez, para uma revista, sobre a prisão do Lula de 1980.”

A ideia da biografia surgiu no lançamento de outro livro escrito pelo jornalista, com as memórias do empresário José Alberto de Camargo, então presidente do Instituto Cidadania. Era 2007. A primeira-dama foi ao lançamento, em Brasília. Foi lá que o empresário sugeriu a Marisa Letícia contar suas memórias também. Camilo concorda com a ideia, diz que gostaria muito de ler, e Camargo afirma-lhe: “Você vai escrever”.

O assunto que começa como aparente brincadeira passa a pautar os encontros posteriores entre o escritor e a biografada. Em 2015 ela topa, depois de muitas conversas com Lula, os filhos, noras, amigas. Mas a produção vai sendo adiada. “Quando a gente enfim achava que iria começar, fomos surpreendidos pelo AVC”, lamenta o escritor. “Queria fazer um livro de memórias dela, ouvi-la e colocar no papel as histórias da Marisa.”

Camilo acredita ter colhido histórias que nem Lula conhece. “Tem um capítulo do livro em que me dedico a contar a história da família paterna e materna da Marisa. E tem pelo menos um episódio que eu tenho quase certeza que o Lula não conhece que foi o dia em que a Marisa resolveu procurar um advogado: ‘Vou me divorciar do Lula’. Não sei se Lula ficou sabendo.” O trabalho resgata também um convívio com amigas, e troca de mensagens, que tampouco Lula chegava a ter acesso.

“Fui dessas pessoas que achava que ela poderia ter feito mais, que não deveria ter sido dona de casa a vida inteira, que ela poderia ter uma atividade, uma atuação política do PT com a pegada dela”, lembra o escritor, que chegou a pensar em desistir até que foi cobrado pelo próprio Lula no hospital.

Marisa foi internada em 24 de janeiro e Lula tocou no assunto dia 2 de fevereiro de 2017. “Naquela semana, entendi que escrever havia se tornado não mais uma possibilidade, mas uma missão”, revela, adaptando a ideia para biografia. “Preferia mil vezes ter feito as memórias da Marisa, que ela continuasse aqui e fosse no lançamento com a gente.”

Lançamentos

• São Paulo – Canto Madalena
Rua Medeiros de Albuquerque, 471 – Vila Madalena

• Rio de Janeiro – Livraria Leonardo da Vinci
Avenida Rio Branco, 185, Subsolo, Centro

Leia a seguir os principais trechos da entrevista de Camilo Vannuchi à RBA.

“Nunca vou entrar aí. Não tem nada a ver morar num palácio desses”

“Essa frase está no começo do livro, quando Dona Marisa viu Brasília na primeira vez em que lá esteve, em 1981, 20 anos antes da eleição de Lula para a Presidência da República. Nesse momento, ela relata um “filme” que passou pela cabeça: o início da vida como trabalhadora, o encontro com Lula, a atuação sindical, a fundação do PT. Esse tipo de construção, saber o que Marisa pensava, foi inferido, uma coisa de pesquisa. Eu assumo no livro, ele é feito como um romance de não ficção. Nada ali foi inventado. É uma história real, mas na hora de narrar eu crio nuances que acho que seriam importantes para instigar o leitor e conduzir o fio da meada.

Preferi fazer como um romance. É um pouco do que aprendi com os escritores (biógrafos) que mais gosto de ler: Fernando Morais, Caco Barcellos, Ruy Castro. Você constrói diálogos ali, reconstrói uma experiência de inserir o leitor no momento que a gente está contando. Não sei se fui feliz, mas foi esse meu objetivo.

Para mim era fundamental essa história do começo, da abertura do livro. E Marisa conta em uma entrevista de um chilique que ela teve. Eles estão passando pelo setor das embaixadas e chega uma hora em que ela fala: jamais vão deixar a gente chegar no poder, sempre vão impedir, vão inventar alguma mentira, vão mandar prender alguém, vão fazer alguma coisa. Vamos parar, esquece partido político, esquece CUT, esquece sindicalismo. Isso é muito marcante porque em 2002 Lula foi eleito. E isso tem uma construção simbólica muito importante: o ex-operário, a dona de casa, como os novos inquilinos do Palácio da Alvorada.”

Figura pública

“Dona Marisa nunca escolheu ser uma figura pública. De repente ela foi compelida. Não dá para ser esposa do Lula ou filho do Lula impunemente. É a pessoa pública mais conhecida e importante do Brasil hoje, em 2020, e já era desde 1980 um protagonista gigantesco. Quando ela se apaixonou pelo Lula, ele não era nem presidente do Sindicato dos Metalúrgicos ainda. Ele era secretário ali. Dizendo pra ela que ia voltar para a Villares, que era a fábrica onde ele trabalhava. ‘Vou voltar a ser metalúrgico. Ah, eles querem que eu seja presidente do sindicato, mas são só três anos, é só um mandato; depois só mais um…’ Isso foi criando essa pessoa que nunca largou a política, a militância, o ativismo. E a Marisa foi indo junto.”

Vida devassada

“O machismo do Lula era uma questão muito evidente. Fiz questão de trabalhar isso como tema, porque acho que a Marisa teve um desconforto diante disso e ela puxava o Lula, questionava: ‘Ah, homem pode e mulher não pode?’ Inclusive entrando no meio de entrevistas que o Lula estava dando. Em uma entrevista para a finada revista Playboy, Marisa percebe que a casa dela está devassada. Lula pergunta sobre o quarto, ameaçando que vai fazer fotografias no quarto, na cama dela. Isso foi uma constante como brincadeira entre eles. Mas de fato houve momentos em que a Marisa falava: ‘Peraí! É a nossa casa, são os nossos filhos’. As reuniões para discutir PT, sindicalismo, que eram levadas para a casa dela, iam até altas horas, uma privacidade muito devassada. Ao longo do tempo a Marisa conseguiu bloquear um pouco o que era o espaço da intimidade. A ponto de que já como presidente e primeira-dama, no Palácio da Alvorada, ela já colocava quem é que vai, quem é que não vai, ‘domingo não quero saber de discussão política aqui, espera segunda-feira’, falava para os ministros. Sempre com postura rigorosa, e justa. Acho até que a gente deveria agradecer a ela por ter feito isso, senão seria um inferno ainda maior a vida desse homem, dessa família.”

De mentiras e fake news

“O preconceito, a exposição, forma uma constante o tempo todo. O que a gente chama de fake news hoje, os boatos, as mentiras. Em 1989 teve uma série de coisas, desde a história da Miriam Cordeiro dizendo que o Lula propôs que ela abortasse a filha Lurian. Tem uma frase dela dizendo que Lula não gosta de negros. Mas para ter uma ideia, em 1985 já se falava em casa no Morumbi, mansão. Então, (fake news) é uma constante na vida deles.”

O episódio Miriam Cordeiro

“Falei com muitas pessoas sobre esse episódio: Lula, Lurian, Maria (irmã do Lula que era amiga da Miriam Cordeiro). Sobre a campanha de 1989, falei com Roberto Teixeira. Ele e a esposa Elvira foram para casa falar com a Marisa, enquanto estava todo mundo no comitê para ver o que Lula ia responder, ia falar. Faltavam dois dias para a eleição. O Ricardo Kotscho era assessor da campanha de 89 e foi o cara que chegou naquela noite e pensou: a Lurian vai para onde agora? E a Miriam? Eles temiam que poderia acontecer alguma coisa com a Miriam, com a hipótese de a direita fazer alguma coisa contra a Miriam para colocar a culpa nos petistas enraivecidos.

Foi um episódio muito traumático na vida de todo mundo. A Lurian tinha 15 anos, ia toda semana no comitê eleitoral, superenvolvida na campanha, nunca tinha sido escondida, tem o nome do pai. A Lurian não teve uma convivência muito fácil com a Miriam e se manteve muito próxima do Lula. Naquela ocasião o Lula não quis expor a família. ‘Não vou fazer minha filha de 15 anos de idade falar mal da mãe dela. O candidato sou eu e quem vai se expor sou eu.’

Marisa fica chocada com aquilo, já tem todo um histórico, esse não era um tema fácil na vida dela. Lula ter tido um relacionamento pré-casamento, mas que teve uma filha como resultado e ela fica achando: o que mais vai aparecer agora? Também tem uma transferência para a Lurian, porque também é uma relação que fica chacoalhada. Não é muito confortável para ela conviver com a Lurian.”

Ciúme

“Os relatos que tem é que o ciúme dela sempre existiu, desde que começaram a namorar. Entrevistei quem estava no baile de carnaval no Sindicato dos Metalúrgicos em 1974, anterior ao casamento deles, e já era uma coisa: ‘Vocês viram o Lula? Onde está o Lula?’ Ele ficava no salão, saía pra fazer outra coisa e ela já ficava apreensiva na mesa. Ela tinha ciúme com os filhos, era uma coisa de não querer que mulher entre na casa. Faz parte da personalidade dela, fez. O que a gente pode pensar é se Lula dava motivo. E acho que ele dava.”

Dilma Rousseff

“Fiquei um ano tentando falar com a Dilma e não consegui. Não é verdade que eles fossem muito próximos. Ela não era uma pessoa que fez parte do sindicalismo, da construção do PT nos anos 1980. Dilma não frequentava a casa deles. E Marisa era do time que achava que não devia ter o segundo mandato da Dilma (reeleita em 2014). ‘Todos nós votamos na Dilma (em 2010) porque não podia votar no Lula pela terceira vez, mas agora não precisa mais ser a Dilma. Por que o Lula não pode voltar?’”

Nair BenedictoNair Benedicto

Aparência, poder, deslumbramento

“Foram oito anos em que ela era uma personalidade que precisava representar o Brasil em viagens para dezenas de países. E aquilo foi exigindo dela uma posição, postura, roupa, enfim, fora do habitual. Não tenho a sensação de que ela chegou a ficar deslumbrada com isso. Ela era a pessoa que o tempo todo falava para o Lula: ‘Lembre de onde você veio, para onde você vai voltar’. Final do segundo mandato, um presidente que tinha 87% de aprovação, poderia perder o chão do deslumbramento tanto ao pensar politicamente em coligações, outro tipo de coisa, quanto de falar ‘agora eu posso’. E a Marisa foi muito presente. ‘Você é de São Bernardo, a gente vai voltar para São Bernardo’.

Ou então ela perguntava: ‘Mas essa decisão, essa política, essa lei, essa proposta que vocês estão pensando em encaminhar ao Congresso, ou esse decreto, vai beneficiar o trabalhador? O que um metalúrgico estaria achando?’

E voltam para o apartamento que eles já moravam antes de ganhar a eleição, que é pequeno e simples, muito aquém do que outros ex-presidentes moram. Todas as viagens estão relatadas no livro, nunca comprou coisas, nunca quis ir em loja nas viagens internacionais que fizeram. Preferia não ir nas viagens e ir para São Bernardo ficar com filhos, netos.”

Simplicidade no Alvorada

“O barato disso é que é tudo muito espontâneo. Eles não conseguiam agir de outro jeito. Depois que eles deixaram o governo e voltaram para São Bernardo, a Marisa ligava para Delzuíta (a funcionária responsável pelos jardins do Palácio da Alvorada) para conversar. Nunca esqueceu um aniversário. Não estava fazendo política, mas ligando para a amiga que cuidou dos jardins do Alvorada. Essa coisa espontânea é muito real, chamava todo mundo pelo nome. Conversei com pessoas que trabalharam no Alvorada desde o Sarney (1985-1990) e eles nunca tinham visto isso acontecer. Nenhum outro presidente ou primeira-dama teve esse grau de envolvimento de conversar, chamar para tomar café.”

Anti-primeira-dama e resgate de Niemeyer

“Foi sempre uma decisão dela. Não quero me envolver nessas coisas, quero ser mãe, vó, esposa, a dona de casa que eu sou. A não ser a reforma. Uma operação gigante, de quase dois anos. Maior reforma do Palácio da Alvorada que foi feita. E precisava. O chão dava choque, tinha infiltrações graves em vários cômodos. Desde a inauguração, em 1958, não tinha passado por nenhuma reforma importante. Foram feitas muitas alterações. Cada presidente fazia o que quisesse… modificando de tal forma o projeto do Niemeyer e da filha que fez a decoração. Marisa resolve propor recuperar o mais próximo do que era. Mas teve muitos momentos em que mulheres do PT queriam que ela atuasse mais. Ela dizia: não, não quero. Quem foi eleito foi meu marido, não fui eleita para nada.”

A primeira estrela

“Para mim é inconcebível que ela não tenha sido fundadora do PT no papel. Se o Lula foi o grande nome articulador, de transformar, de criar um partido dos trabalhadores, para os trabalhadores, de base de verdade, a Marisa seria a carteirinha número 2. O PT foi formado por núcleos de bairro e o primeiro foi o do bairro Assunção, onde eles moravam em São Bernardo, que era a casa deles. A mesma casa de 33 metros quadrados onde eles moravam, ela recebia, tinha reunião, fazia filiação. Ela ia de porta em porta na rua, no bairro, colhendo assinatura (para a formação do PT), explicando a importância do partido. Fazia camisetas, bingo. Barraquinha para vender camiseta, broches. Nas três primeiras campanhas eleitorais não tinha empresa de produção de camiseta contratada. Ela chegou a fazer 100 por dia na casa dela, de silkscreen.”

Culpa injusta e abatimento

“Marisa foi muito perseguida nos 42 anos que vivemos juntos. Muita gente a tratou com preconceito, com desrespeito. Desde o começo. Acho que a Lava Jato foi a gota d’água. Trataram Marisa como criminosa, invadiram sua casa, reviraram suas coisas, divulgaram conversas íntimas, expuseram os filhos e netos. Você tem noção do que é isso? Não tenho nenhum receio em afirmar que essa caçada foi determinante para a morte precoce da Marisa”
De Lula, na apresentação do livro

“Acho que qualquer um de nós estaria completamente atordoado com a perseguição ao filho, à família, gravações que são exibidas de coisas que vazam ilegalmente, conversas particulares. A iminência de o marido ter um processo e ser de fato preso. A criminalização do PT que ocorreu nesses últimos anos, o partido que ela ajudou a construir. E de repente o fato de ela ter assinado a compra das cotas de um imóvel da Bancoop no Guarujá ou ter participado com os Bittar dessa ideia de querer retomar uma convivência de décadas no sítio…

Então, isso acaba pesando pra ela: poxa, eu que sempre tomei muito cuidado para não atrapalhar em nada, dediquei minha vida para a construção desse projeto, agora pode ser que essas coisas estejam cooperando para a crise do PT, a prisão do Lula e essa perseguição à família. Acho que isso é um componente dentro dessa reta final. Quase dois anos em que ela ficou muito abatida e abalada com tudo que estava acontecendo.”

Foto: Ricardo StuckertFoto: Ricardo Stuckert

Olhar solidário

“Me preocupei com isenção. Tentei mostrar a Lava Jato muito a partir do que os jornais publicaram, inclusive. Eu ouvi os depoimentos dados pelos empreiteiros, políticos ao Sergio Moro, Gabriela Hardt. Ouvi também toda a família, li todo o processo, a defesa. Mas eu tentei fazer um jeito de contar a história, não contar versões. Óbvio que não tenho procuração da Marisa para isso, mas foi o tempo todo um exercício meu de tentar ver como a Marisa sentia, recebia, via esse tipo de coisa. Tento ser isento nesse sentido, mas é um olhar que é solidário à Marisa nos momentos em que é preciso ser solidário.”

História precisa ser contada

“A imprensa convencional ou vai se calar ou vai fazer o debate como achar que deve. Pode me criticar, falar que o livro é saudosista desse período. Pode chamar o livro de libelo petista. Fizeram isso com Democracia em Vertigem, o filme brasileiro que está concorrendo ao Oscar de melhor documentário. Mas a gente precisa entender também que a história precisa ser contada, precisa contar o governo Lula de novo. Eu ia em livrarias durante o processo de impeachment da Dilma, olhava aquelas gôndolas e falava: gente só tem livro aqui de direita, um monte de livro de Olavo de Carvalho, Marco Antonio Villa. Cadê? Estou contando uma história. Alguém pode chegar e falar: ‘Aqui está errado, aqui você foi leviano, negligente’. Mas me mostra. A gente debate. Biografia, livro-reportagem, é jornalismo. Ele dá a verdade que foi possível ao jornalista encontrar até o momento do fechamento daquela edição. Tenho muita tranquilidade em dizer que o que está nesse livro é a verdade que eu consegui alcançar até o momento de mandar o livro para a gráfica.”

Como eles aguentam?

“Por fim, abraçado ao filho Sandro e à nora Marlene, Lula chorou a dor de todas as privações e todas as perdas que vinha sofrendo. Já tropeçando nas palavras, olhou uma última vez para o caixão branco que abrigava o neto e lembrou de sua galega. — Vai lá encontrar a vovó Marisa – despediu-se. — E espera o vovô”


“Acho que ninguém é capaz de responder a essa pergunta. O pique, a quantidade de coisas, as cobranças de todos os lados. A Marisa é impressionante. Essa é uma pergunta que acompanha um pouco a vida dela, na minha ótica. Em alguns momentos eu perguntaria como é que ela aguentava. Como ela aguentava aqueles quatro moleques correndo de um lado para o outro numa casa de 33 metros quadrados? Como aguentava aquele marido, aquelas reuniões até meia-noite, viagens. A vida inteira foi assim. No sindicato. A primeira prisão dos sindicalistas em 80. Ir no Dops, com as crianças. Elas aprontam dentro do Dops. Eu fui pensando nisso.

Essa coisa de como ela aguenta é uma imagem que me veio muito na cabeça na internação da Marisa. Chegou um momento, no dia 2 de fevereiro, que a doação de órgãos estava liberada. Os médicos diziam que precisa esperar 18 horas para ter a morte encefálica e ela ficou mais de 24. Ela não morria. Não parava de funcionar, o coração não parava de bater. Que garra, que disposição de aguentar. Primeiro aguentar essa trajetória. Uma vida de devoção à militância, à causa dos trabalhadores. Tem uma coisa de vocação do Lula e da Marisa para essa vida que eles levaram de serviço, serviço público, serviço para o social, que para mim já é uma coisa… Caramba, como conseguem? Como dá para ter essa entrega, essa devoção? Não sei como ela aguenta.”