Escrito por: Erick Gimenes, Brasil de Fato | Brasília (DF)
Segundo especialistas em relações exteriores, Brasil se tornou cúmplice do assassinato de Soleimani ao apoiar EUA
O apoio expresso ao assassinato do líder iraniano Qasem Soleimani tornou o Brasil cúmplice do crime, afirmam diplomatas ouvidos pelo Brasil de Fato. O major-general foi morto em um ataque aéreo realizado pelos Estados Unidos na última sexta-feira (3), sob a justificativa, sem provas, de terrorismo.
No mesmo dia, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil se manifestou, relacionando a morte do general ao combate ao terrorismo. “(…) o Governo brasileiro manifesta seu apoio à luta contra o flagelo do terrorismo e reitera que essa luta requer a cooperação de toda a comunidade internacional sem que se busque qualquer justificativa ou relativização para o terrorismo”, afirmou o Itamaraty, em nota.
Como reação, o Irã convocou a encarregada de negócios da embaixada brasileira para dar explicações. Isso, no contexto diplomático, sinaliza claro desagrado com a postura do governo de Bolsonaro.
Para o ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim, a postura do Itamaraty foi um erro e pode causar grandes problemas ao país. “Eu vejo isso [o posicionamento do governo brasileiro] como uma coisa muito perigosa. É uma coisa que pode chamar o conflito para nós”, alerta o ex-ministro.
Riscos e prejuízos
Para o diplomata, a ação pode colocar brasileiros em risco. “Acho que é há uma dose muito grande de irresponsabilidade, porque tem riscos para a segurança dos brasileiros, inclusive nesses outros países. Eventualmente, riscos até para brasileiros por aqui. E também, isso até mais óbvio, prejuízos praticamente certos para as nossas exportações”, afirma Amorim.
O ex-ministro reforça que o Brasil sempre reprovou, historicamente, ataques sem justificativa como o contra o general iraniano. “O Brasil sempre condenou as ações unilaterais. Claro que no governo Lula, mas até em outros governos, como de Fernando Henrique Cardoso e outros. O Brasil sempre foi contra as ações militares não aprovadas pelas Nações Unidas”, relembra.
O embaixador e ex-secretário geral do Itamaraty Samuel Pinheiro Guimarães concorda que o apoio ao ataque estadunidense coloca o Brasil em risco. “O Brasil, ao apoiar a ação americana, se torna cúmplice de uma violação da Carta das Nações Unidas. Foi um assassinato, em território estrangeiro, de uma autoridade de outro país, sem que haja provas de que essa autoridade tivesse planejado o que quer que seja.”
Segundo Guimarães, a submissão de Bolsonaro a Donald Trump é “esdrúxula” e não gera nenhuma vantagem. “Isso não trará nenhum benefício para o Brasil. Todas as atitudes de submissão do governo brasileiro, até agora, durante esse ano todo, não trouxeram nenhuma vantagem para o Brasil. Trouxe várias vantagens para os Estados Unidos”, assinala.
O embaixador diz esperar reações comerciais imponentes do Irã contra o Brasil. “Evidente que o Irã, que é um grande importador de milho brasileiro, com quem nós temos um grande superávit comercial, talvez redirecione as suas compras a outros países no mundo. Quando você é um país produtor, exportador, que produz primários, há muitos concorrentes”.
Guimarães diz temer que, em um eventual conflito armado, os Estados Unidos lancem mão da subserviência brasileira. “Eu só espero que, em algum momento, os Estados Unidos não peçam ao Brasil para fornecer tropas, como ele faz muitas vezes para formar aquelas coalizações”, preocupa-se.