Bolsonaro quer tirar mais direito de trabalhador, agora dos pescadores artesanais
Milhares de famílias sofrerão impactos negativos se governo cortar recursos de auxílio pago à categoria que não pode trabalhar durante período de preservação das espécies, diz advogada Marcia Villar Franco
Publicado: 20 Fevereiro, 2020 - 15h03 | Última modificação: 20 Fevereiro, 2020 - 15h40
Escrito por: Érica Aragão
Com argumento de ampliar os benefícios do Bolsa Família, no qual mais de 3,5 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza estão na fila para receber, o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) estuda cortar recursos do seguro-defeso, auxílio pago ao pescador artesanal durante o período em que ele fica impedido de trabalhar em respeito a preservação e reprodução das espécies.
A proposta do Ministério da Economia, segundo reportagem publicada na Folha de São Paulo na semana passada, é que o auxílio deixe de ser benefício trabalhista e seja condicionado à renda familiar, como o Bolsa Família.
Hoje o seguro-defeso é tipo o seguro-desemprego do pescador artesanal que contribui ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). É um benefício mensal que equivale a um salário mínimo (R$ 1.045,00) no período em que a pesca é paralisada em respeito à reprodução das espécies e a categoria fica sem trabalho e sem renda.
Se acontecer a mudança que Bolsonaro e o ministro da Economia, o banqueiro Paulo Guedes querem, para receber o seguro-defeso o pescador precisará estar nas mesmas condições do Bolsa Família.Ou seja, em situação de extrema pobreza, com renda per capita de até R$ 89 mensais.
Segundo a reportagem da Folha, o governo cortaria até R$ 2 bilhões por ano no auxílio a pescadores artesanais.
“Na prática, o governo vai empobrecer as famílias de pescadores, que ainda não estão em situação de extrema pobreza justamente por receberem o seguro-defeso. É mais uma medida para tirar direito de trabalhador”, afirma a secretária de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara.
Segundo ela, o objetivo do governo é fazer ajuste apenas naquilo que diz respeito aos direitos trabalhistas e da seguridade social, “enquanto as grandes fortunas continuam sem taxação, a dívida pública segue sem auditoria, os multimilionários mantém seus benefícios e os fabricantes dos agrotóxicos continuam sem pagar impostos”.
“O governo coloca o ajuste nas costas dos setores mais precarizados e vulnerabilizados da classe trabalhadora, isso significa mais do mesmo.Destinar cada vez menos recursos para o povo viver melhor e cada vez mais recursos para o capital financeiro lucrar mais”, finalizou Jandyra.
Medida impacta para pior a vida de milhares de famílias
Para a advogada da Colônia de Pescadores Z3, que representa mais de 1.200 pescadores no Guarujá, litoral de São Paulo, Marcia Villar Franco, esta proposta de Bolsonaro é inviável e vai impactar negativamente a vida de milhares de famílias.
Ela explica que a pesca artesanal é feita pela economia familiar, ou seja, pai, mãe e irmãos que moram na mesma casa e trabalham juntos para viabilizar o sustento de todos.
Se as regras para o seguro-defeso forem as mesmas do Bolsa Família, ressalta a advogada, muitas famílias ficariam sem salário, sem renda e sem benefício algum.
“Se o seguro- defeso virar um programa social limitado, como quer o governo, as famílias ficariam sem receber o auxílio nos períodos que a pesca é paralisada em respeito ao meio ambiente e também não conseguiriam receber o Bolsa Família, porque a renda familiar é maior que o exigido”, alerta Marcia.
“Os pescadores ficariam sem trabalho e sem renda”, reafirma.
Governo já dificultou o acesso
Desde 2018, os trabalhadores e as trabalhadoras da pesca precisam acessar o site INSS Digital se quiserem ter acesso ao requerimento do seguro-defeso. Antes tinham que ir à agência e sempre tinha alguém para ajudar.
Depois desta mudança, conta a advogada, a dificuldade para pedir o seguro-defeso piorou.
“Não existe mais contato físico, no qual um ou outro poderia ajudar nas dificuldades das pessoas, principalmente as mais velhas. Agora é tudo de forma digital. Muitos pescadores nem têm internet para acessar e muitos nem sabem como fazer isso”, explicou Márcia.
Segundo ela, a inserção do Meu INSS digital já está limitando o acesso aos benefícios porque não tem ninguém para auxiliar os que precisam receber. Fora inúmeros problemas cadastrais do sistema, que tem atrasado o recebimento dos direitos.
“É um desmonte social. Eles [Bolsonaro e seus ministros] querem realmente acabar com os trabalhadores e com as trabalhadoras, não só com os pescadores. E denunciar esta maldade também faz parte da luta da classe trabalhadora”, afirmou a advogada da Colônia de Pescadores Z3.