Bolsonaro usa 'velha política' e negocia cargos em troca de apoio no Congresso
Presidente eleito e sua equipe de transição atendem a pedidos para acomodar políticos que não se elegeram e aliados em diretorias e vice-presidências de órgãos públicos, secretarias e estatais
Publicado: 17 Dezembro, 2018 - 16h29 | Última modificação: 17 Dezembro, 2018 - 16h54
Escrito por: Hylda Cavalcanti, da RBA
Faltando poucos dias para tomar posse como presidente da República, em 1º de janeiro, Jair Bolsonaro (PSL) contradiz o discurso que fez durante toda a campanha e negocia cargos nos segundo e terceiro escalões do Executivo em troca de apoio no Congresso Nacional.
Na campanha ele dizia que seu governo seria formado apenas por nomes escolhidos segundo critérios técnicos, e não mais por indicações políticas, em que valem o tradicional “toma lá, dá cá” da política brasileira. Antes de assumir, apoiado por sua equipe de transição, negocia os cargos para políticos do baixo clero, deputados e senadores que não foram reeleitos e indicados de líderes de bancadas consideradas estratégicas para a formação de uma base parlamentar.
Até agora, de acordo com balanço feito junto às bancadas, foram atendidos pela equipe de transição do futuro governo 320 pessoas da Câmara e do Senado, entre senadores eleitos, deputados e parlamentares não reeleitos. Entre as bancadas, somente o PR declarou apoio ao governo. As siglas PSD, PSDB, PRB e Pode se manifestaram no sentido de vir a votar com o governo nas pautas convergentes, mas não declarar apoio explícito.
Na avaliação de quem tem acompanhado a dedo o Diário Oficial da União e as reuniões da equipe de transição, há três grupos influenciando nas decisões do presidente eleito sobre cargos no futuro governo: 1) o dos que não se elegeram; 2) os caciques de sempre fazem indicações; e, 3) grupo dos que integram o governo de Michel Temer (MDB-SP).
O grupo dos parlamentares que não se elegeram por motivos variados, como envolvimento em casos de corrupção, mas que são próximos de Bolsonaro e deverão integrar uma equipe dentro da Casa Civil para ajudar o titular da pasta, Onix Lorenzoni (DEM-RS), na articulação política.
Entre eles, já com funções definidas, estão o ex-ministro do Trabalho Ronaldo Nogueira (PTB-RS), que vai assumir um cargo na Casa Civil. Um dos principais nomes da bancada ruralista, Valdir Colato (MDB-SC), assumirá uma função no Ministério da Agricultura. E Darcísio Perondi (MDB-RS) está garantido numa secretaria do Ministério da Saúde.
Outros não reeleitos que vão para a Casa Civil são Leonardo Quintão (MDB-MG), Danilo Forte (PSDB-CE), Alberto Fraga (DEM-DF), e Carlos Mannato (PSL-ES). O deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), outro derrotado nas urnas, que foi relator da "reforma trabalhista", vai para a equipe econômica, no cargo de secretário da Previdência Social.
O segundo grupo que pleiteia um lugar, ainda que modesto, no novo governo, é o das indicações feitas pelos caciques de sempre da política. Muitos deles também foram derrotados nas urnas mas, na avaliação dos bolsonaristas ainda têm importância em seus estados de origem. Eles estão se empenhando em pedidos de indicação junto a Bolsonaro para ocupar assessores e aliados em conselhos e diretorias de estatais.
Entre eles está Eunício Oliveira (MDB-CE), atual presidente do Senado, que não se elegeu e não apoiou Bolsonaro – ao menos não abertamente –, mas que tem mantido conversas reservadas com alguns representantes do eleito. Teria partido de Eunício a indicação do advogado Vicente Aquino para um cargo no conselho da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o que ele nega, além de correrem informações ainda não confirmadas de que ele estaria indicando nomes para a direção da Caixa Econômica Federal.
Também está sendo esperado anúncio do nome da senadora Ana Amélia Lemos (PP-PR) para integrar a equipe de Comunicação de Bolsonaro, aproveitando ter ela formação como jornalista. Ana Amélia foi candidata a vice-presidente na chapa do tucano Geraldo Alckmin e conclui agora seu mandato.
Num plano de dimensão mais regional, está atuando na equipe de transição o ex-governador de Pernambuco e ex-deputado Joaquim Francisco Cavalcanti, que chegou a ocupar por um período curto o ministério do Interior no governo Sarney. Ele transitou nos últimos anos entre o DEM, PTB e PSB e há duas legislaturas não exerce mandato parlamentar, mas é considerado candidato natural a algum cargo voltado para a busca por maior popularidade de Bolsonaro no Nordeste – região do país onde o ex-capitão foi menos votado.
Por fim, o terceiro grupo que vem sendo contemplado com cargos no futuro Executivo é formado por nomes que integram o atual governo de Michel Temer. Nesta cota, é dada como certa a ida da atual Advogada-Geral da União (AGU), Grace Mendonça, para a secretaria-executiva do Ministério da Cidadania.
Além dela, ninguém da equipe de transição tira da lista de possíveis “apadrinhados” – em postos ainda não definidos – os ex-ministros Mendonça Filho (DEM-PE), da Educação e Bruno Araújo (PSDB-PE), das Cidades. Confiantes em alcançar sucesso nas urnas de Pernambuco, a dupla optou por lançar-se em candidaturas ao Senado. Mas os resultados não vieram e ambos fazem suas investidas para serem chamados a ocupar alguma função no poder.
Busca por caciques
Nessa mesma linha de acertos e arrumações está a situação de Levy Fidelix, que preside o PRTB, sigla do futuro vice-presidente, general Hamilton Mourão. Fidelix, que não é deputado e não conseguiu se eleger para uma vaga na Câmara, tem reclamado de falta de espaço nas indicações da equipe de Bolsonaro. O que se fala é que ele terá um cargo na vice-presidência, para atuar próximo a Mourão, e poderá indicar alguns nomes no 3º escalão, mas nada foi definido neste sentido até agora.
Ressurgiu das cinzas nas últimas negociações o nome de Valdemar Costa Neto, do PR. Conforme conversas de bastidores na Câmara, ele tem participado de reuniões em busca de vagas para a legenda no Departamento Nacional de Infraestrutura em Transportes (Dnit).
Diante das preocupações externadas com o Congresso pelos ministros da área econômica ao futuro presidente, por conta de votações no primeiro semestre de 2019 – e de desgastes como o caso envolvendo o depósito não explicado de um assessor do seu filho, Carlos Bolsonaro, em contas da família – foi feito um aceno para a retomada de conversas, a partir de terça-feira (18), diretamente com estas legendas. E, também, com o PSD e o PP.
“A expressiva renovação do Congresso permitiria, na visão otimista de muitos, uma nova forma de relacionamento com o Executivo, eliminando o toma-lá-dá-cá de outros tempos. Ocorre que a renovação privou o governo de parlamentares experientes na coordenação de votações relevantes. E sem partidos, o futuro presidente vai ter dificuldades para a aprovação das reformas”, avaliou em artigo publicado neste domingo, no jornal Folha de S. Paulo, o economista e ex-ministro Maílson da Nóbrega.
O futuro ministro Onix Lorenzoni também se posicionou a respeito.“É exagero dizer isso (sobre toma lá, dá cá). Negociações são naturais, mas não estão sendo feitas como as trocas de favores de antes. As prioridades estão sendo dadas a parlamentares que deixarão os cargos, nas áreas em que atuam”, argumentou. Segundo ele, “o presidente vai receber até perto do Natal, todas as bancadas do nosso campo político para conversar”.
Tirando os partidos que são formalmente de oposição, como é o caso do PT, PCdoB, Rede, PPL, PV e Psol, as demais siglas não se manifestaram sobre se integrarão a base de apoio a Bolsonaro. É o caso de MDB, PPS, PSB e DEM.