Brasil poderá perder R$ 1 trilhão de receitas do pré-sal
MP altera vários pontos da legislação tributária do setor petróleo
Publicado: 16 Outubro, 2017 - 09h32 | Última modificação: 16 Outubro, 2017 - 09h35
Escrito por: FUP, com informações da Agência Câmara e do Buzzfeed
Está prestes a ser aprovada no Congresso Nacional a Medida Provisória 795/2017, que o presidente Michel Temer editou em setembro, com o objetivo de ofertar ao mercado uma série de incentivos fiscais à exploração de petróleo, que resultarão em uma renúncia de receitas na ordem de R$ 1 trilhão, segundo estudos realizados pela Consultoria Legislativa da Câmara.
A MP, que altera vários pontos da legislação tributária do setor petróleo (acesse aqui a íntegra do texto), foi submetida para análise em tempo recorde em uma comissão mista presidida pelo senador José Serra (PSDB-SP) e cuja relatoria é do deputado federal Júlio Lopes (PP-RJ). Ambos assumiram o compromisso com o governo de aprovar a Medida Provisória até 27 de outubro, quando a Agência Nacional do Petróleo (ANP) realizará a segunda rodada de leilões de áreas do pré-sal e pós-sal. No entanto, Serra recentemente renunciou do seu posto, deixando a Comissão sem presidente (saiba mais aqui).
Em discurso na Câmara na terça-feira, 10/10, o líder do PT, deputado Carlos Zarattini, afirmou que a proposta de Temer destrói a indústria nacional. “Esta medida provisória trata exatamente de abrir para a exploração do petróleo a importação de equipamentos fabricados fora do Brasil. O objetivo dessa medida provisória é dar aos equipamentos que vêm de fora o mesmo tratamento tributário dado aos equipamentos produzidos no nosso País. Isso significa acabar com o modelo de desenvolvimento brasileiro no ramo de petróleo e gás, entregar definitivamente às multinacionais essa exploração, e, ao mesmo tempo, permitir a importação de todo o tipo de equipamento. Desse modo, vamos enterrar as indústrias nacional, naval, de equipamentos e a tecnologia desenvolvida pela Petrobras", denunciou.
De acordo com o estudo realizado pela Consultoria da Câmara, o texto da MP 795 pode levar o país a deixar de arrecadar R$ 1 trilhão com o óleo do pré-sal, considerando toda a extração das reservas. Baixe aqui a íntegra do estudo
Para chegar ao valor, os consultores fizeram uma simulação considerando o preço do barril de petróleo Brent a US$ 60 (hoje está na casa dos US$ 56).
Pelas regras da medida provisória, a participação do Brasil em cada barril — na prática, a porcentagem que o país recebe de cada um deles — passará de 59,7% para 40%, uma das mais baixas do mundo.
O estudo mostra que, por exemplo, a China possui uma participação de 74%; os Estados Unidos, de 67%; a Rússia, de 66%, e o Reino Unido, de 63%.
Além da questão dos tributos em que a participação será reduzida, o estudo também questiona o incentivo fiscal para a importação de máquinas e equipamentos para a exploração, bem como materiais para a embalagem do óleo.
Confira aqui e aqui as notas técnicas com os estudos sobre a MP 795/2017.
Leia a íntegra do discurso do deputado federal Carlos Zarattini (PT/SP):
Senhor presidente, senhores deputados e deputadas.
Nós estamos participando da discussão na comissão especial da medida provisória 795. E fomos surpreendidos com a renúncia do presidente José Serra, presidente desta comissão, e do relator deputado Júlio Lopes. Essa medida provisória, ela trata exatamente de abrir, para exploração do petróleo, a importação de equipamentos fabricados fora do Brasil. O objetivo dessa medida provisória é dar aos equipamentos que vêm de fora o mesmo tratamento tributário dado aos equipamentos produzidos no nosso país.
Isso significa acabar com o modelo de desenvolvimento brasileiro no ramo do petróleo e gás. Entregar definitivamente às multinacionais essa exploração e, ao mesmo tempo, permitir a importação de todo tipo de equipamento, enterrando a indústria nacional, a indústria naval, a indústria de equipamentos, a tecnologia desenvolvida pela Petrobras e pelas empresas que fornecem à Petrobras.
É estranho até um silêncio de muitas entidades tão barulhentas quando lhes interessa como, por exemplo, a FIESP, que gasta milhões de reais de propaganda do SENAI para promover o seu presidente, mas não dá uma única palavra em defesa da indústria nacional de petróleo e gás.
Nós vimos também que já a ANP, Agência Nacional de Petróleo, abriu mão do conteúdo nacional no consórcio de Libra, de exploração do campo de Libra.
Vejam bem: estão isentos de conteúdo nacional os itens relativos a cascos e plantas. Ou seja, sistemas de equipamentos navais, materiais, tanques, queimadoras, turbinas e gás. Esta indústria está terrivelmente prejudicada por essas decisões da ANP e pela medida provisória 795.
Aliás, fez muito bem o senador José Serra porque, do jeito como estão as coisas criminalizadas nesse país, provavelmente ele seria considerado um criminoso por estar beneficiando a indústria estrangeira de produção de equipamentos de exploração de petróleo e gás.
Nós não podemos aceitar isso. E quero dizer: o PT não vai dar a menor condição, não contem conosco um único minuto para a aprovação dessa medida provisória. Ao contrário do que quer o governo, que quer privatizar tudo, entregar tudo, nós queremos desenvolver o Brasil. Nós queremos desenvolver nosso país, uma indústria com tecnologia, uma indústria geradora de empregos. E por isso não podemos abrir mão da indústria naval, da indústria de petróleo e gás.
O mesmo raciocínio nós temos que levar também em relação aos leilões. Um leilão onde a Petrobras se uniu à Exxon para explorar os principais campos de petróleo ainda em águas rasas é uma verdadeira vergonha! Quando foram divulgado os famosos papéis pela Wikileaks, papéis secretos, troca de informações, nós vimos que já ali, já estava desenhada a estratégia de ocupação dessa exploração de petróleo pela Exxon.
Segundo Assange, o Julian Assange, aquele que revelou os papéis, o que podemos ver nas mensagens é que o Departamento de Estado norte-americano está constantemente focado em tentar conseguir bons acordos e tentar manipular em nome da Chevron e da Exxon. Vejam bem: lá nos papéis do Wikileaks já aparecia a espionagem nos computadores da Petrobras.
Entre aspas, está escrito nesses papéis: "empresas interessadas no petróleo têm ido à embaixada americana para reclamar das condições, as condições da lei brasileira que determinou a forma de exploração do pré-sal. E alguns partidos políticos no Brasil estavam dizendo que prefeririam que a Chevron e Exxon-Mobil tivessem acesso mesmo sem a exclusividade dos 30% da Petrobras. Uma maneira de trocar favores com os EUA é facilitar à Chevron e a Exxon-Mobil o acesso a parte desse petróleo. Nas mensagens vazadas pelo Wikileaks, aparece um desejo constante das petroleiras americanas de ter o mesmo acesso que a Petrobras tem."
Portanto, está evidente. Agora está comprovado que a ação golpista, o objetivo dela, de aprovar imediatamente o fim da participação exclusiva da Petrobras nos campos do pré-sal é exatamente por conta dos interesses das multinacionais de petróleo e do Departamento de Estado norte-americano.
É disso que se trata. E, agora, vejam bem: nós agora estamos vendo toda a manipulação com o objetivo de entregar a Eletrobras. Não contente em levar as riquezas do petróleo, agora querem levar as riquezas da energia. Quem denuncia não somos nós do PT, não! Vejam só o comentário do senhor José Luiz Alquéres, um importante conhecedor do mercado energético do Brasil, que não comunga das idéias do PT. Mas ele diz: "a privatização não pode ser feita para arrumar trocados para o tesouro e, sim, para montar um sistema elétrico adequado para o século 21, para uma economia de baixo carbono. Preste atenção: só vemos em alguns momentos um mar de ignorante e lobistas, sem contar especuladores dando as cartas e fazendo proposições."
Ora, o senhor José Luiz Alquéres conhece o que é o mercado de energia, conhece como funciona o sistema elétrico nacional e ele sabe muito bem o que está se fazendo, o que está se armando com esse novo modelo elétrico em nosso país, com a privatização da Eletrobras. É um modelo em que vai ser descotizada - ou seja, descontratada - a energia barata produzida nas antigas usinas hidrelétricas e vai ser fornecida essa energia ao chamado mercado livre. Portanto, o preço da energia, que hoje é fornecido barato, vai ser aumentado substancialmente.
Ou seja, quem vai pagar essa privatização, pela segunda vez, é exatamente o consumidor brasileiro. E o povo brasileiro, através da Eletrobras, vai perder o controle sobre as águas, sobre a energia limpa das hidrelétricas, particularmente as de Minas Gerais, de Furnas e as da CHESF do Rio São Francisco.
Nós temos que denunciar isso. E é óbvio, é óbvio que não está em conta nesse modelo a chamada modicidade tarifária, porque o que interessa é a maximização dos lucros. É óbvio que o modelo de tarifa vai subir. E é importante a gente notar que quem está à frente desse modelo, desenvolvendo esse modelo, não é outro senão o secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, senhor Paulo Pedrosa, ex-presidente da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia Elétrica. Exatamente os que mais vão ganhar com esse novo modelo, onde os comercializadores do mercado livre, sem bater um prego na madeira, vão ganhar uma importante fatia de milhões, de bilhões de reais que estão envolvidos no mercado de energia.
Nós temos que denunciar isso porque, como diz o senhor José Luiz Alquéres, quem está operando essa transformação, essa manipulação, são lobistas que nada entendem do mercado de energia, ou aqueles que entendem e entendem tão bem que querem desviar bilhões de reais para interesses privados, tirando do consumidor, que é o povo brasileiro.
Muito obrigado.