Escrito por: Rosely Rocha

Caos no combate à pandemia ainda tem reflexos na saúde do Amazonas

Setor da saúde pública e privada perdeu 500 trabalhadores e trabalhadoras para a Covid-19 no auge da pandemia. Postos até agora não foram repostos, o que traz prejuízos à população e à categoria

Mário Oliveira/Prefeitura de Manaus

 

A pandemia da Covid-19 matou até a último domingo (28), no estado do Amazonas 14.276 pessoas e ao todo foram registrados 613.249 casos da doença. Apesar do estado não estar entre os 10 mais no número de mortes em todo o Brasil, o Amazonas é sempre lembrado por causa do caos no sistema de saúde no auge da pandemia, quando a falta de oxigênio e a inoperância dos governos municipal, estadual e federal. A má-gestão da crise, cuja face mais cruel foram as pessoas mortas por asfixia, é duramente criticada por especialistas de saúde pública.

Indiferente a tragédia, o presidente Jair Bolsonaro (PL), chegou a imitar uma pessoa com falta de ar durante uma de suas transmissões semanais em suas redes sociais, em 18 de março de 2021. Ele também defendeu o uso de remédios sem eficácia comprovada para combater a covid-19, muito usados na capital do Amazonas. O presidente voltou a imitar o gesto de quem está com falta de ar em 7 de maio do ano passado.

Até hoje o presidente da República nega que tenha demorado a ajudar o Amazonas no auge da pandemia, afirmando em entrevista ao Jornal Nacional, do último dia 22, que levou apenas 48 horas para levar oxigênio a Manaus, o que não ocorreu como mostram registros da imprensa na época.

“A ajuda da União demorou demais, teve culpa do governo federal e estadual que não priorizaram a saúde e a pandemia foi a prova concreta de que os governantes estavam despreparados. O governo federal teve culpa demais, como maior autoridade do país tinha de incentivar a vacina e não desmentir cientistas em médicos”, critica a presidenta do Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimento de Serviço de Saúde do Amazonas (Sindsaúde-AM), Cleidinir Francisca do Socorro.

Ajuda da CUT e sindicatos

Em janeiro do ano passado, graças à atuação da CUT e demais centrais, a Venezuela enviou 130 mil litros de oxigênio ao Brasil, transportados por oito caminhões do país. Além de doar oxigênio, a Venezuela reuniu 107 médicos venezuelanos e brasileiros, formados pela Escola Latino-Americana de Medicina Salvador Allende, em Caracas, para auxiliar na linha de frente do combate à pandemia na Região Amazônica.

O descaso do governo brasileiro com o ato de solidariedade da Venezuela à época chegou até a CPI da Covid, quando o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello foi questionado sobre as razões de não ter enviado pelo menos, aviões brasileiros para buscar o oxigênio em território venezuelano.

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Além da falta de oxigênio em que milhares de pessoas foram obrigadas a comprar o produto com o próprio bolso, de empresas particulares para socorrer seus familiares, com imensas filas nas distribuidoras, quem estava na linha de frente sofria duplamente: por ver vidas que poderiam ser salvas e temendo pela própria, já que não havia equipamentos de proteção suficientes para os profissionais da saúde.

“Tivemos de buscar doações junto a sindicatos e empresários para conseguirmos máscaras, viseiras, macacão, gorros por que o governo não tinha e não fornecia. Muitos trabalhadores da saúde tiraram do próprio bolso o dinheiro para pagar por eles”, lembra Cleidinir.

Covid matou 500 profissionais da saúde

Hoje apesar do número de mortes estar em queda de 13%, os reflexos na área da saúde são sentidos tanto pelos trabalhadores e trabalhadoras do setor privado quanto as dos servidores estaduais da saúde. A categoria perdeu 500 colegas de profissão por causa da covid e muitos perderam ainda seus parentes e amigos. Isso é aproximadamente 2,5% dos 22 mil servidores da saúde em todo o Amazonas.

“No auge da pandemia nossa situação ficou muito difícil por que até os trabalhadores da saúde com comorbidades não puderam se afastar, correndo risco de morte”, lembra Cleidinir. 

Luta por reajustes e direitos

Apesar da falta desses profissionais, os servidores da saúde do estado ficaram dois anos, de 2019 a 2021, sem reajuste salarial e sem pagamento de horas extras. O governo de Wilson Lima (União Brasil) , só ofereceu folgas em troca de todo o sacrifício feito pelos servidores. Somente no início deste ano foi dada parte da reposição salarial de 25%. Com data-base em 1º de maio, a correção salarial de 2022, não foi feita até agora.

“Apesar de não estarmos trabalhando o triplo como no auge da pandemia, temos apenas dois mil médicos no estado para atender a população, e ainda estamos sem reposição dos nossos colegas que se foram. A nossa luta é que o governo do estado cumpra a promessa de fazer concurso público para o próximo ano. Também estamos trabalhando dentro de uma comissão para verificarmos o número de pessoal que falta no quadro da saúde”, diz Cleidinir, que também ocupa o cargo de secretária de Combate ao Racismo na Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS).

“A precariedade é grande tanto na capital como no interior com as pessoas trabalhando dobrado por falta de pessoal suficiente”, acrescenta a dirigente sindical.

Depois de tanto sofrimento na pandemia, a categoria agora luta ainda pelo reconhecimento que não teve. Ao contrário, medidas do governo estadual retiraram direitos como as 48 horas de descanso, caso o plantonista esteja doente no dia do seu trabalho, mesmo com atestado médico. Outra luta é o pagamento de progressões e promoções atrasadas desde 2012.