Castelo Branco escreve carta para justificar venda da Rlam abaixo do preço
Castello Branco justifica-se dizendo que o modelo adotado para o desinvestimento de refinarias foi concebido internamente em abril de 2019 por equipes multidisciplinares da Petrobras
Publicado: 01 Abril, 2021 - 09h04 | Última modificação: 01 Abril, 2021 - 10h02
Escrito por: Redação CUT
A Federação Única dos Petroleiros (FUP) e sindicatos filiados contestaram comentários feitos pelo presidente demitido da Petrobrás Roberto Castello Branco, sobre a venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM) pela metade do valor da unidade e também o fato da operação não ter sido transparente.
Os comentários de Castello Branco foram feitos por meio de comunicado interno enviado aos trabalhadores e trabalhadoras na noite da última segunda-feira (29), horas após o anúncio da demissão de gerente executivo de Recursos Humanos, e seu homem de confiança, Cláudio da Costa.
Em nota publicada em seu site, a FUP afirmou que, além de informações distorcidas e equivocadas sobre a venda da RLAM, o comunicado é omisso em relação aos verdadeiros motivos da saída de Costa. “Não há uma linha sobre esse assunto, reforçando a falta de transparência,” disse a FUP, contestando os argumentos do presidente da companhia, que buscava a solidariedade dos funcionários.
A Federação contestou todos os detalhes do comunicado de Castello Branco, que tentou se justificar-se pela venda de uma refinaria por um valor muito abaixo do que realmente vale.
No comunicado, ele disse que: “No dia 26 de março nosso Conselho de Administração aprovou e assinamos com a Mubadala Investment Company o contrato de compra e venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM) por US$1,65 bilhão.”
Mas a FUP diz que o contrato não foi aprovado por unanimidade pelo Conselho de Administração, que foi assinado com o Mubadala sem o devido aval final dos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) e que foi objeto de várias críticas da Controladoria Geral da União (CGU). Além disso, a Procuradoria do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) determinou que a Petrobrás não fechasse qualquer contrato de venda de refinarias sem aprovação prévia do órgão, o que, aparentemente, não ocorreu.
Castello Branco justifica-se dizendo que o modelo adotado para o desinvestimento de refinarias foi concebido internamente em abril de 2019 por equipes multidisciplinares da Petrobrás, coordenadas pela Gerência Executiva de Estratégica, cujo responsável na época era o hoje Diretor Executivo Rodrigo Costa.
Os petroleiros contestam mais uma vez afirmando que “ o modelo foi concebido a partir de uma oferta por parte da atual gestão da Petrobrás ao Cade da venda de refinarias. Antes do Cade se manifestar, a Petrobrás já tinha avisado ao mercado que ia privatizar oito refinarias. O Cade só foi utilizado para homologar a decisão da Petrobrás.”
Em resposta ao presidente que “Não houve nenhuma participação de consultorias externas, pois acreditamos possuir competência internas para a realização de tal modelagem,” a federação dos petroleiros lança um desafio: “Desafiamos a empresa a divulgar o Relatório Interno de Avaliação Econômico-Financeira (RIAFE), elaborado pelos técnicos da Petrobrás. Qual o preço estimado para a refinaria no cenário base deste estudo, com base nos parâmetros definidos no Plano de negócios 2021-2025 ?”
Castelo Branco mostra as suas razões para as vendas das refinarias. Segundo ele, a melhoria da alocação do capital na medida em recursos investidos em negócios de baixo retorno passarão a contribuir para o financiamento de Investimentos em negócios de alto retorno, como a exploração e produção de petróleo e gás natural em águas profundas e ultraprofundas.
A FUP, por sua vez, contesta mais esta afirmação dizendo que “a alegada melhoria da alocação do capital por parte da gestão da Petrobrás significa transformar a companhia de uma empresa verticalizada, capaz de aproveitar os diferentes momentos econômicos de toda a cadeia produtiva do petróleo, para uma produtora e exportador de óleo cru. Historicamente, os mercados de petróleo cru e de derivados são complementares: a alta volatilidade dos preços internacionais do petróleo é compensada por certa manutenção dos preços dos derivados de petróleo. Assim, a Petrobrás, ao vender suas refinarias, perde parte dessa capacidade e se torna dependente unicamente dos preços internacionais do petróleo. Além disso, passará a competir com outros países produtores de petróleo pelos mercados compradores do energético, notadamente a China. Que, nesta semana, anunciou um acordo com o Irã, grande produtor de petróleo, para investir no país do Oriente Médio em troca de petróleo por preços mais baixos.”
O presidente volta a dizer no texto distribuído que “a Liberação de recursos para diminuir o ainda elevado endividamento da Petrobrás que tanto nos têm prejudicado ao reduzir nossa capacidade de investir e crescer.”
A FUP usa os argumentos da XP Investimentos, em análise sobre o valor de venda da RLAM), que avaliou negativamente o negócio, por causa de seu preço (US$ 1,65 bilhão). Além da XP Investimentos, também estudos do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo e Gás natural (INEEP) e avaliações do BTG Pactual apontaram preços abaixo do mercado.
Castello Branco diz que o Brasil é um dos raros países no mundo onde uma única empresa é dona de 98% da capacidade de refino.
Para FUP, “Isso se dá pelo fato de o Brasil ser um país autossuficiente na produção de petróleo e no qual o Estado controla a maior empresa petrolífera do país. Esta mesma empresa, controlada pelo Estado brasileiro, foi a responsável pela implantação de toda a infraestrutura de refino do país. O monopólio da Petrobrás de fato no refino se dá, portanto, pelas características do mercado brasileiro de petróleo e derivados. Além disso, a conhecida como “Lei do Petróleo”, abriu o mercado de petróleo e gás natural a outros agentes. Qualquer empresa pode instalar uma refinaria no Brasil.”
O presidente da empresa tenta justificar suas ações afirmando que “Essa anomalia faz da Petrobrás o alvo predileto de pressões políticas para subsidiar combustíveis em benefício de grupos de interesse, o que impôs pesadas perdas para nossa companhia.” Ele acusa governos, sem apontá-los, de interferência na Administração da Petrobrás no que diz ser um desvio da prática de preços de mercado. “Perdas significativas foram realizadas com implicações negativas para a Petrobrás e seus acionistas, principalmente a acionista controladora, a União Federal.”
Mais um vez a FUP contesta:
“Entre os anos de 2003 e 2012 a Petrobrás não transferiu automaticamente os aumentos internacionais para os preços internos e, mesmo assim, não teve prejuízos com sua política de preços. O preço do gás de cozinha não aumentou entre 2003 e 2013. Temos uns dos menores custos unitários de produção do mundo, em torno de US$ 3 o barril. Nos EUA, por exemplo, o custo médio de um barril produzido a partir do Shale Gás sai por US$ 40. Por que nossos preços têm que ser totalmente balizados no mercado internacional?”
Castello Branco diz que a instabilidade administrativa é outra consequência: “Entre 2018 e 2021 dois presidentes da companhia foram demitidos por sua insistência em praticar preços de mercado. Cabe observar que em 67 anos de existência a Petrobras já teve 38 presidentes, rotatividade incomum na gestão de empresas em todo o mundo.” E mostra uma coragem jamais revelada enquanto esteve no governo, que apresenta, no fundo, uma mágoa por ter sido demitido em público: “Em lugar da solução de problemas estruturais, como o excesso de oferta de caminhões, altos impostos, estradas de péssima qualidade e lento crescimento econômico, é muito mais fácil fazer a Petrobras de vilã e demitir seu presidente.”
A FUP rebate dizendo que “é muito mais fácil para um presidente de uma petroleira sem qualquer experiência no mercado de petróleo e gás natural colocar a culpa em outros agentes de mercado e instituições governamentais do que admitir sua incompetência em equilibrar a necessidade de lucros da Petrobrás, uma empresa pública, com a necessidade da população brasileira de ter combustíveis a preços justos. Uma estratégia rentista de benefício ao grande capital financeiro, sem considerar as necessidades da sociedade brasileira.”
Com mais atores no mercado de refino acreditamos que os riscos de interferência política na Petrobrás diminuam sensivelmente, diz Castelo Branco. “Existe hoje no mundo excesso de capacidade de refino dado os grandes investimentos de empresas chinesas, indianas e árabes em novas refinarias.”
Para FUP, Castello Branco quer institucionalizar o Preço de Paridade de Importação (PPI), uma decisão empresarial da Petrobrás, em uma política de Estado. “Ou seja, sem ser eleito e sem poder para tal, o executivo quer criar uma política de preços para o Estado brasileiro.” Diz ainda que “ esse alto investimento se dá para suprir esses mercados internos, que estão em franco crescimento e precisam de combustíveis. Não devemos esquecer que tanto na China como na Índia a população é maior que 1,5 bilhão de pessoas, sendo a maior parte apartada dos bens mínimos necessários para uma vida básica. As políticas de distribuição de renda destes dois países estão incorporando centenas de milhões de novos consumidores, fazendo que a expansão de suas capacidades de refino fiquem aquém da demanda projetada.
O presidente da Petrobrás também diz que “Não estamos inovando. Fazemos o que fazem as pessoas e empresas procurando ter a carteira de ativos que nos dê o melhor retorno possível.” Essa é a lógica de uma empresa privada, diz a FUP. “ Não a de uma empresa controlada pelo Estado em um país de dimensões continentais, desigualdades regionais, e uma das maiores concentrações de renda do mundo. É possível gerar lucro sem obrigar a população a usar lenha para cozinhar.”
Castello insiste que o desinvestimento da RLAM teve aprovação recomendação pela Comissão Interna de Alienação, foi aprovada por unanimidade pelo Comitê Técnico Estatutário e igualmente aprovada por unanimidade pela Diretoria Executiva e finalmente pelo Conselho de Administração. A FUP contesta: “Nunca é demais lembrar que a venda da RLAM não foi aprovada por unanimidade no Conselho de Administração e que conselheiros pediram um tempo maior para analisar a operação. Mas Castello Branco, junco com seus indicados, recusou.”
O Presidente diz que a venda da RLAM não foi um trabalho e/ou da decisão de uma pessoa ou de um pequeno grupo. “Foi resultante do trabalho de mais de uma centena de empregados da Petrobrás, mulheres e homens comprometidos em fazer o melhor para nossa companhia.” A FUP lembra que “ parte importante desses que ocupavam cargos estratégicos entraram na empresa a partir da posse de Castello Branco, em 2019, por indicação do mesmo e sem concurso público.”
“ Afirmar sem nenhum argumento sólido de que a RLAM foi vendida a “preços de banana” , de “afogadilho” , é acusação criminosa a colegas que dedicaram seus talentos e incontáveis horas trabalho em prol do bem da Petrobrás,” disse na carta enviada aos funcionários. Os petroleiros dizem que “Faltam argumentos sólidos para o Banco Pontual, para a corretora XP, para diversos institutos de pesquisa que constataram preço da RLAM abaixo do valor de mercado? Se fosse só uma instituição falando, poderia até usar esse argumento, mas várias? No mínimo, podemos dizer que falta transparência nesse processo. Para não utilizar outro adjetivo.”
Na carta escrita por Castello, ele dá nomes de pessoas que estiveram ao seu lado, como se fosse um pedido de solidariedade e nomeia Anelise Lara, ex-diretora de RGN, Rodrigo Costa, atual diretor, Taisa Maciel, Advogada Geral, Gerentes Executivos Ana Paula Saraiva, Rafael Chaves dos Santos, Eduardo de Nardi, Rodrigo Araujo, Giuliano Carrozza, Renata Elias, Elza Kallas, Daniel Pedroso, Cláudio Mastella.”
A Federação dos Petroleiros lembra o compromisso de responsabilidade que esta lista terá no futuro: “Todo os citados aqui devem explicações para a companhia, para seus funcionários. Participaram de um processo sem transparência, eivado de denúncias, que rompe com a história da empresa. História que garantiu ao país a autossuficiência no refino, depois no petróleo e levou à maior descoberta de petróleo dos últimos 50 anos. Assim como o nome de pessoas como o ex-diretor Guilherme Estrela entraram para a história da Petrobrás pela porta da frente, essas pessoas citadas aqui, se concordam com esse processo, entraram para a história da empresa pela porta dos fundos e serão responsabilizados civil e criminalmente pelos erros e omissão cometidos.”
Castelo encerra em tom de bravata: “ A mentira é a principal arma dos radicais, porém jamais intimidarão a mim e as pessoas que acabo de mencionar. Quem age corretamente nada tem a temer.”
Os petroleiros da federação rebatem dizendo que “ Aqui uma última ironia diante das denúncias estampadas nos jornais nos últimos dias de que duas assessoras diretas do Sr. Castello Branco, tia e sobrinha por sinal, usaram a família para operar na bolsa de valores com informações privilegiadas. A empresa tem que investigar a fundo isso. O Conselho de Administração da Petrobrás tem que conduzir essa investigação, garantindo a participação da representante eleita dos funcionários nesse processo. O Conselho de Administração tem que contratar uma empresa de auditoria forense para conduzir essa investigação de forma autônoma. O Ministério Público Federal e a Polícia Federal também são convidados a entrar nesse processo. E depois de tudo apurado, tem que divulgar o resultado para a sociedade. Afinal, quem não deve não teme”.
Com apoio do Petronotícias