Escrito por: Rosely Rocha, especial para Portal CUT

Censo agropecuário revela aumento da concentração de terras e uso de agrotóxicos

Área utilizada por estabelecimento agropecuário cresceu o proporcional ao tamanho do Acre, mas diminuiu o número de proprietários. Mais de 1,5 milhão de trabalhadores perderam seus empregos pela mecanização

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Aumentou a concentração de terras no Brasil nas mãos de poucos latifundiários. De acordo com os dados o Censo Agro 2017, divulgado nesta quinta-feira (26) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram identificados mais de 5 milhões e 72 mil estabelecimentos agropecuários em uma área total de 350.253.329 hectares.

Entre os estabelecimentos com 1.000 hectares (ha) ou mais, houve aumento tanto em número (mais 3.287) quanto em hectares (mais 16,3 milhões), passando de 45% para 47,5% a participação na área total entre 2006 para 2017.

Já os estabelecimentos entre 100 e 1000 ha, ou seja, os pequenos produtores rurais, viram sua participação na área total cair de 33,8% para 32% (menos 814.574 ha) e tiveram uma diminuição de 4.152 unidades.

Em relação ao Censo Agro 2006, a área total cresceu 5% (16,5 milhões de hectares, o equivalente a área do estado do Acre), apesar da redução de 2% (103.484 unidades) no número de estabelecimentos.

Para a vice-presidenta Nacional da CUT, Carmen Foro, esses números revelam que há um projeto articulado e em expansão de golpistas e latifundiários que ataca a agricultura familiar e os pequenos produtores rurais - responsáveis por 70% da produção do alimento que chega à mesa das famílias brasileiras.

“O corte em torno de 80% das políticas públicas para o campo, como créditos para a compra de terras, a flexibilização das leis ambientais, o aumento do desemprego, com a mecanização e a concentração de terras, só aumentam os conflitos no campo”, avalia Carmen.

“O Brasil já é recordista mundial em mortes por esses conflitos. A diminuição de espaços para os agricultores familiares só fará aumentar a concentração de terras e aumentar os assassinatos no campo”, lamenta a vice-presidenta da CUT.

Empregos caem e número de crianças trabalhando passa de 500 mil

A mecanização da agricultura resultou em menos 1,5 milhão de postos de trabalho desde 2006, ano do último censo. A cada trator adquirido quatro pessoas perderam seus empregos.

O número de tratores no campo aumentou 49,7% em 11 anos, para um total de 1.228.634 unidades, o equivalente a 407.916 novas máquinas. Mais de 200 mil estabelecimentos passaram a usar tratores no período, alcançando um total de 733.997 produtores em 2017. O número de 2017 é quatro vezes maior do que o registrado no Censo Agropecuário de 1975, quando havia 323 mil tratores em uso no campo.

Hoje trabalham no campo em torno de 15 milhões e 36 mil pessoas. Também diminuiu o número de  produtores e trabalhadores com laços de parentesco, de 77% em 2006 (12.801.179 pessoas) para 73% em 2017.

O número de crianças que trabalham no campo ainda é alarmante. Mais de meio milhão. Ao todo, são 587.805 trabalhadores com até 13 anos de idade, atuando em estabelecimentos agropecuários: 329.096 meninos e 258.709 meninas.

Cerca de 15,5% dos produtores disseram nunca ter frequentado escola e 79,1% não foram além do nível fundamental.

A falta de uma política de educação, de saúde e de melhoria na qualidade de vida para os jovens do campo também preocupa os dirigentes da CUT.

Segundo Cristiana Paiva, que está à frente da Secretaria da Juventude, é possível perceber o quanto decaiu o nível de educação no campo, com escolas sendo fechadas, após o golpe de 2016.

“Nosso campo está envelhecido e a juventude tem dificuldades em acessar coisas que são importantes para ela, especialmente a educação, o que leva boa parte dela a estudar na cidade. Também há uma grande preocupação com a retirada de orçamento de políticas públicas que garantam o acesso à renda e os jovens acabam abandonando a terra. É preciso que a juventude do campo receba uma educação melhor, e assim ganhe qualidade de vida. É preciso resistir ao retrocesso que estamos vivendo”, diz Cristiana.

Para ela, a questão da permanência do jovem no campo depende de se colocar em prática as políticas públicas já garantidas que foram tiradas por esse governo golpista e ilegítimo de Michel Temer (MDB-SP).

“É o caso de programas de primeira terra para filhos de agricultores, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) jovem,o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), nos estados, que cada vez mais se enfraquece, e vários outros direitos que foram se perdendo no meio do caminho”, ressalta Cristiana.

Utilização de agrotóxicos

Destaca-se, ainda, que 1.681.001 produtores utilizaram agrotóxicos em 2017, um aumento de 20,4% em relação a 2006.

Para a secretária de Saúde do Trabalhador da CUT, Madalena Maria da Silva,  esse aumento de uso de agrotóxico representa um perigo tanto para a saúde do trabalhador do campo quanto para os consumidores.

“O resultado do Censo Agropecuário mostra o avanço do agronegócio que utiliza cada vez mais agrotóxicos em detrimento da saúde do trabalhador e das  pessoas que vivem perto dessas terras. Tudo isso tem a ver com um modelo de desenvolvimento concentrador de riquezas, seja a terra, a água, a tecnologia", diz Madalena.

"É o agronegócio que dá as cartas no Brasil, seja na elaboração das leis e definindo o que comemos”, lamenta a dirigente

O Censo mostra ainda que o uso de irrigação também se ampliou, com aumento de 52% tanto em estabelecimentos (502.425) quanto em área (6.903.048 hectares). Além disso, o acesso à Internet nos estabelecimentos agropecuários cresceu 1.790,1%, passando de 75 mil, em 2006, para 1.425.323 produtores que declararam ter acesso em 2017.

O Censo Agropecuário

O Censo Agropecuário investiga informações sobre os estabelecimentos agropecuários e as atividades agropecuárias neles desenvolvidas, abrangendo características do produtor e do estabelecimento, economia e emprego no meio rural, pecuária, lavoura e agroindústria.

Tem como unidade de coleta toda unidade de produção dedicada, total ou parcialmente, a atividades agropecuárias, florestais ou aquícolas, subordinada a uma única administração (produtor ou administrador), independentemente de seu tamanho, de sua forma jurídica ou de sua localização, com o objetivo de produção para subsistência ou para venda.

O Censo traz ainda informações sobre as características do produtor agropecuário e dos estabelecimentos; a condição legal das terras e do produtor; pessoal ocupado; infraestrutura dos estabelecimentos; características da pecuária e da produção vegetal (efetivos e produtos da silvicultura, horticultura, floricultura, extração vegetal, lavouras permanente e temporária), entre outros temas.