Escrito por: Érica Aragão
Com corte de verbas de Temer, IBGE exclui questões fundamentais e privilegia agronegócio
Mais um desmonte contra o povo. Com o corte de verba do governo ilegítimo de Michel Temer, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) escolheu excluir questões sociais importantes do questionário do Censo Agropecuário de 2017 para reduzir a pesquisa e fazê-la caber no atual orçamento.
O censo agropecuário é feito de 10 em 10 anos para retratar a produção agrícola e pecuária no Brasil, mas também mostra como a produção de alimentos é feita. Sem as informações precisas e específicas que historicamente fazem parte dessa pesquisa, a construção de políticas públicas fica comprometida.
Com o atual questionário, perde-se a análise da condição social de acesso a terra, sendo proprietário ou assentado; perdem-se a possibilidade de analisar os processos produtivos ambientalmente corretos, principalmente no que tange ao uso do agrotóxico; e perde-se a capacidade de identificar a disponibilidade hídrica da população rural, considerando uma série de problemas como o abastecimento público e o uso de água na agricultura, principalmente a partir de fenômenos de escassez hídricas vivenciadas no Brasil, por exemplos.
Foram suprimidas também as questões referentes à contratação de trabalhadores temporários, que permitiam identificar safreiros e outros e foram eliminadas praticamente todas as questões relacionadas ao uso de agrotóxicos, até mesmo a questão de cor e raça do produtor foi eliminada.
O professor da UNESP, José Giacomo Baccarin afirma que o IBGE só vai destacar as questões que são de interesse do grande produtor. “O censo dará uma visão distorcida do campo e não mostrará que a agricultura familiar é o que mais gera emprego no campo e nem destacará o aumento do trabalho temporário nas grandes empresas do agronegócio”.
Ele cita os dados do Censo Agropecuário de 2006 no qual, de 1 milhão e 34 mil trabalhadores e trabalhadoras no campo, 319 mil eram temporários, 285 mil permanentes e responsáveis membros de família 420 mil.
Baccarin disse que a pesquisa substima o emprego temporário, porque é menos importante e eles têm interesse em terceirizar tudo. “A gente não vai ter ideia do que aconteceu com o emprego com essa mecanização dos últimos anos e teremos um reconhecimento menos apurado da realidade, porque geração de emprego na agricultura não é importante para esse governo”, justifica.
O presidente da Associação dos Geógrafos Brasileiros e professor da UNESP Rio Claro, José Gilberto Souza, afirma que a retirada de questões exclui principalmente setores da agricultura familiar campesina, responsáveis por 70% da alimentação da mesa dos brasileiros e das brasileiras.
Outro problema central, segundo Souza, é que o IBGE ao longo dos anos tem dificultado a disponibilização dos dados do extrato de área, ou seja, que permite você fazer uma análise com profundidade da estrutura fundiária dos processos de desconcentração e concentração da terra no país. “Como a trajetória do país é efetivamente concentração fundiária isso implica em reconhecer que o modelo do agronegócio ele é mais excludente e mais conservador, omitir esses dados é de fundamental importância para um governo que tem a perspectiva de fortalecer a dimensão da agricultura empresarial.Deixou de reconhecer os processos de desigualdade que ela vai gerando no campo brasileiro”, contou.
A pesquisa é feita desde 1920 e essas informações não têm como ser obtidas em outra pesquisa do IBGE. Para a integrante da equipe técnica da SOF, que publicou "Censo Agropecuário 2006 Brasil: uma análise de gênero" e como consultora da FAO acompanhou a elaboração do questionário do Censo Agropecuário 2015, Miriam Nobre a retirada de temas importantes da pesquisa fica claro o quanto esse governo está preocupado só com o agronegócio ignorando a realidade do campo e da diversidade cultural dos povos responsáveis pela alimentação brasileira.
Segundo ela, exclusão desses temas na pesquisa foi para que não entendêssemos o modelo de agricultura predominante no país. “Não mostrar a participação das mulheres trabalhadoras rurais, quilombolas e ribeirinhas na produção de alimentos significa apagar populações inteiras da realidade econômica do país e desconsideram a contribuição que elas têm nos desenhos das políticas públicas no nosso país”.
José Gilberto Souza finaliza dizendo que esse esforço de esconder as realidades do campo precisa ser denunciado. “Se este questionário vingar, a informação pública será reduzida àquilo que interessa ao agronegócio, apagando-se a diversidade do mundo rural no que diz respeito aos direitos dos que não integram o complexo industrial agroquímico”.
Posição da Agricultura Familiar ligadas à CUT
Para a vice-Presidenta Nacional da CUT e agricultora familiar da base da CONTAG, Carmen Foro, a retirada dos temas da agricultura familiar e camponesa, como das populações tradicionais joga novamente para a invisibilidade setores importante que produzem mais de 70% dos alimentos de qualidade no Brasil. Segundo ela, “essa pesquisa olha exclusivamente o modelo de desenvolvimento do agronegócio e empresarial fazendo apagar a importância política social e econômica da agricultura familiar”.
A secretária Nacional de Formação na CUT e agricultora familiar da base da CONTRAF BRASIL, Rosane Bertotti, citou a nota pública da Confederação divulgada nesta quinta (30) dizendo que considera o ato de colocar nas ruas um questionário que não considera os avanços nas políticas agrárias da Agricultura Familiar significa não divulgar dados referente a “sua forma de produção sustentável e ecológica, a condição de gerar emprego e renda, a preocupação com a saúde do consumidor, entre outros, que certamente desfavorecem o agronegócio, num quadro comparativo de sustentabilidade de produção”.