Escrito por: Contag
A marca deste dia nacional do Cerrado é a luta do povo e das comunidades locais para manter seus espaços de vida, produção e de pertencimento, preservação das matas, da biodiversidade, e dos recursos hídricos
Nesta sexta-feira (11), Dia Nacional do Cerrado, não há nada a comemorar no Brasil e entidades como a Confederação Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), defendem que a data seja usada para ressaltar a importância da preservação do segundo maior bioma da América do Sul, que abrange um território de mais de 2 milhões de Km2, cerca de 22% do território Nacional.
A luta é pela preservação do bioma, conhecido como “berço das águas” no país, um dos mais atingidos pelo desmatamento causado pela expansão da pecuária e das monoculturas de soja e milho, duas das principais commodities de exportação da economia brasileira, como mostra reportagem de Caroline Oliveira, do Brasil de Fato.
De acordo com a matéria, o resultado desse processo, que conta com incentivos à pecuária desde o período da ditadura militar, é que o cerrado mudou como nenhum outro bioma: foi cortado pela metade. Mais recentemente, esse padrão de incentivos "ao boi" é sustentado pelo Plano de Desenvolvimento Agrícola (PDA), mais conhecido como Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia).
Matopiba
A região denominada Matopiba compreende 31 microrregiões geográficas do IBGE situadas nos limites do Bioma Cerrado, geograficamente localizadas nos estados Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, somando uma área de 73 milhões de hectares, e guardam uma rica biodiversidade.
Acontece que a agricultura vem se expandindo fortemente nessa região através das monoculturas de milho, algodão e soja, de forma desordenada, o que ameaça a biodiversidade desta parte do Cerrado, visto que a ocupação deste bioma pela produção agrícola, via agronegócio, repercute em problemas como a concentração da terra em grandes propriedades, na dependência da monocultura dos insumos como irrigação, fertilizantes, agrotóxicos, o uso de pouca mão de obra, o que gera concentração de renda, ou seja, esse modelo agrícola que se expande no Matopiba não transfere riqueza ou de fato impacta positivamente na vida das populações locais, ao contrário, causam grandes os impactos ambientais, e empobrece a população das comunidades ali habitam, sobretudo os povos tradicionais que ali vivem (agricultores(as) familiares, quilombolas, indígenas, extrativistas, comunidades de Fechos de Pastos, dentre outros).
Menos de 1% das propriedades rurais do Matopiba são consideradas ricas (com renda bruta acima de 200 salários mínimos), e geram quase 60% de toda a riqueza da região. As propriedades classificadas como muito pobres (de 0 a 2 salários mínimos) são 80% de seus imóveis rurais, mas produzem apenas 5% da riqueza. Estudos demonstram que os trabalhadores rurais agricultores(as) familiares e povos originários não conseguirão se manter na terra frente ao avanço do agronegócio, o que gera um grave problema social e econômica para o campo, e consequentemente para o Brasil.
Ainda assim, com toda a devastação que o Cerrado vem sofrendo ao longo do tempo, seus povos e comunidades ali resistem, e lutam diariamente para manter seus espaços de vida, produção e de pertencimento, bem como lutam pela preservação das matas, da biodiversidade, e de seus recursos hídricos. Como mostra o artigo “Desmatamento no Cerrado e resistências nos territórios”, produzido pela Campanha Nacional em Defesa do Cerrado em parceria com o Le Monde Diplomatique Brasil.
A Campanha Nacional em Defesa do Cerrado tem o apoio da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) e mais de 43 organizações e movimentos sociais que buscam a valorização da biodiversidade e das culturas dos povos e comunidades do Cerrado.
O Cerrado é composto pelos Estados do Maranhão, Tocantins, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Piauí, Rondônia, Paraná, São Paulo e o Distrito Federal, ainda com algumas características deste Bioma em Roraima, Amapá e no Amazonas, estados que, em seu conjunto, guardam importantes recursos naturais, a exemplo do potencial aquífero, uma vez que, no Cerrado, se encontram os grandes aquíferos: Guarani, Bambuí e Urucuia, e as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul, a Amazônica/Tocantins, São Francisco e Prata, com importância estratégica para o abastecimento e manutenção de toda esta biodiversidade, na geração de energia, no abastecimento humano, e na produção agrícola.
Há outros aspectos que evidenciam a grandiosidade do Cerrado além da questão da água, visto a expressiva diversidade de sua flora (inclusive as plantas de uso medicinal, mais 220 espécies), de frutos comestíveis e comercializáveis, como o Pequi, o Buriti, a Mangaba, o Araticum, o Cajuzinho do Cerrado, dentre tantos outros, frutos que alimentam diversas comunidades que habitam este bioma.
“O Dia Nacional do Cerrado nos traz muitas razões para nos orgulharmos, pela sua importância para o planeta e para vida humana, contudo, é preciso a reflexão da sociedade e dos governos, para que se chegue a uma solução que leve à concretização de ações conjuntas para preservação desse bioma, de recuperação da áreas degradadas, de valorização e cuidado com sua biodiversidade, de forma que lutemos por uma gestão mais atuante sobre os recursos hídricos, e se estabeleçam políticas públicas de incentivos à diversificação agrícola, de práticas agroecológicas, incluindo, aqui a valorização da agricultura familiar”, pontua a secretária de Meio Ambiente da CONTAG, Rosmarí Malheiros.
Assista o documentário 'Serão Velho Serrado'