Escrito por: Fania Rodrigues, Brasil de Fato | San Antonio del Táchira (Venezuela)

Chavistas comemoram vitória após 15 horas de conflito na fronteira colombiana

Militares e 1.500 civis venezuelanos barraram opositores que queriam entrar pela Colômbia com suposta ajuda humanitária

Fania Rodrigues

“Foram 15 horas de combate e nenhum morto”, afirmou o representante do governo nacional no estado venezuelano de Táchira, Freddy Bernal, após o fim dos enfrentamentos entre apoiadores do presidente Nicolás Maduro e simpatizantes do líder opositor, Juan Guaidó, no último sábado (23).

O fim de semana foi marcado por tensões na fronteira da Venezuela com a Colômbia, onde manifestantes contrários ao governo bolivariano tentaram forçar a entrada de “ajuda humanitária” dos Estados Unidos em território venezuelano. O governo de Nicolás Maduro acusa a ação de ser uma tentativa de infiltrar um “cavalo de troia” no país para abrir caminho a uma intervenção militar. Após horas de conflito, o plano de Guaidó de furar o bloqueio venezuelano fracassou.

No discurso na Ponte Internacional Simón Bolívar no domingo após o fim do conflito, Bernal felicitou as “tropas populares” pela batalha e resistência diante dos diferentes pontos de ataques e destacou o papel da população e dos trabalhadores comuns que saíram em defesa do país. “Aqui está o povo, para defender a sua pátria", declarou diante de apoiadores. "Todos contribuíram, desde as mulheres que ontem no combate foram, em meio ao palco do conflito, levar água com limão para nossos soldados [para ajudá-los a enfrentar o calor seco da região], até as mulheres e homens que resistiram a mais de 15 horas de enfrentamentos, de ataques paramilitares, de ameaças.”

Bernal se refere aos 1.500 civis venezuelanos que se uniram aos agentes militares na fronteira com a Colômbia para evitar que opositores de Maduro furassem o bloqueio e entrassem no país com uma suposta ajuda humanitária vinda dos Estados Unidos. Segundo o governo colombiano, o carregamento incluía 90 toneladas de alimentos.

Apoio civil

O operário da construção civil Oscar Contreras estava na frente de batalha no sábado. “Nós defendemos a fronteira com as mãos, não usamos nenhum tipo de arma”, destacou. Ele afirma que esteve todos os dias na ponte Simon Bolívar junto aos 1.500 venezuelanos que estiveram no local resistindo. “Desde as primeiras horas da manhã, nós, o povo, com as próprias mãos, que são nossas armas da paz, defendemos a fronteira e encontramos um inimigo em frente. Eles queriam invadir nossas fronteiras por uma suposta ajuda humanitária”, conta o trabalhador.

O jovem estudante Brian Leonardo Paolo teve o rosto machucado por uma pedra lançada pelo lado colombiano. “Eu estava defendendo minha pátria. Queremos uma pátria livre e soberana. Não queremos intervenção de ninguém”, afirmou.

O prefeito de San António de Táchira, William Gomez, se juntou à população e passou o dia na ponte combatendo com mãos e pedras. “Como as imagens podem mostrar, somos um povo desarmado, com consciência. Na ponte Simón Bolívar, junto com as forças de segurança, em equipe com a Guarda Nacional Bolivariana e a Força Armada, tivemos diferentes frentes de resguardo da nossa ponte”, relata.

Depois dos enfrentamentos de sábado, o dia foi de relativa tranquilidade nessa região da fronteira da Venezuela com a Colômbia. Ações violentas isoladas ocorreram na Ponte Simón Bolívar, onde um grupo formado por cerca de 100 venezuelanos e colombianos simpatizantes de Guaidó do lado de Cúcuta, na Colômbia, promoveram atos de vandalismo e queimaram pneus de um caminhão que havia sido colocado no dia anterior para servir de escudo.

Horas antes, os manifestantes do lado colombiano haviam desmontado parte do caminhão. Segundo os militares venezuelanos, esse desmonte é feito ilegalmente para vender as peças no mercado clandestino. Na parte de baixo da ponte, cerca de 30 homens encapuzados passaram a tarde lançando coquetéis molotov e pedras contra os civis e militares que resguardam o local.

Presidente da Assembleia Constituinte visita fronteira

O presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Diosdado Cabello, visitou Táchira e esteve na Ponte Internacional Simón Bolívar. Cabello também é militar da reserva e um dos dirigentes políticos que liderou a resistência contra a entrada da “ajuda humanitária”, pois considera que “não é ajuda nem é humanitária”.

O dirigente chavista afirmou que oficiais venezuelanos receberam ligações da Casa Branca. “Os soldados venezuelanos venceram uma batalha liderada pelo próprio chefe do imperialismo. O senhor Donald Trump fez ligações para os oficiais venezuelanos, os que têm familiares nos Estados Unidos. Disse: ‘Vamos bloquear suas riquezas’. Mas que riqueza? Aqui o que temos são riquezas espirituais, morais, de dignidade”, declarou.

Durante a visita à Ponte Simón Bolívar, Diosdado Cabello também falou sobre o “radicalismo da oposição venezuelana”. “Estamos enfrentando o setor mais reacionário da política venezuelana, mas também o setor mais servil ao império norte-americano. Incondicionalmente servis. Na Venezuela, a oposição desapareceu. Ninguém mais fala da Mesa da Unidade Democrática. É o chefe do imperialismo que dirige as ações aqui na Venezuela, com seus atores políticos”, destaca o deputado constituinte.

Deserções

Sobre outro tema tratado por dirigentes chavistas na fronteira, Bernal comentou que as deserções de militares venezuelanos no último sábado "saíram caras" aos governos da Venezuela e da Colômbia. "Fizeram um show musical que custou mais de 70 milhões de dólares na fronteira e tiveram apenas nove desertores”, afirmou.

Também contrasta o valor enviado em “ajuda humanitária” pelos Estados Unidos, que seria de 20 milhões de dólares, com os gastos do megashow com artistas famosos de vários países, com custo de US$ 70 milhões, segundo informações da imprensa venezuelana. De acordo com o empresário britânico Richard Branson, que organizou o evento, o objetivo era arrecadar US$ 100 milhões, mas até o momento não foi informado quando foi arrecado. Foi aberta uma página na internet para as pessoas realizarem doações.

Nesta segunda-feira (25), representantes de 13 dos 14 países do Grupo de Lima, com exceção do México, se reúnem em Bogotá para discutir a crise na Venezuela. Apesar de os Estados Unidos não participarem oficialmente como país membro do bloco, representantes do governo Trump vêm acompanhando as reuniões – desta vez com a presença do vice-presidente estadunidense Mike Pence. O líder opositor Juan Guaidó, que está na Colômbia desde o dia 22 de fevereiro, também vai participar.

Edição: Aline Scátola