Chico Mendes, 30 anos sem o líder sindical e defensor dos povos da Floresta
No dia 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes foi brutalmente assassinado por fazendeiros no Acre. O legado do líder sindical e maior ambientalista brasileiro, reconhecido por todo o mundo, continua vivo
Publicado: 20 Dezembro, 2018 - 09h00 | Última modificação: 20 Dezembro, 2018 - 12h52
Escrito por: Rosely Rocha
A história de vida do líder sindical e ambientalista Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, assassinado no dia 22 de dezembro de 1988, se mistura com a dos povos da Amazônia, dos índios, dos ribeirinhos, dos trabalhadores e trabalhadoras dos seringais e de todos os brasileiros que migraram para a região em busca de oportunidades.
Chico nasceu em 15 de dezembro de 1944, no seringal Porto Rico, próximo à fronteira do Acre com a Bolívia, em Xapuri, estado do Acre. Filho de seringueiro passou sua infância e juventude ao lado do pai, cortando seringa, e só foi alfabetizado aos 16 anos. A vida no seringal deu a ele um sentimento de revolta contra a injustiça.
Em sua luta, construiu políticas públicas e iniciou uma transformação social na região Amazônica, ao mostrar ao mundo a ideia de uma floresta habitada, sustentável.
Meu sonho é ver toda esta floresta conservada, porque nós sabemos que ela pode garantir o futuro de todas as pessoas que vivem nela
O legado de Chico Mendes para os trabalhadores e trabalhadoras
Chico Mendes é reconhecido mundialmente como ambientalista, mas teve um papel fundamental na construção sindical.
Sua trajetória teve início no Sindicato de Trabalhadores Rurais de Brasileia, o primeiro criado no Acre, em que foi diretor, quando a política para a Amazônia implantada pela ditadura militar gerou grandes conflitos fundiários. A substituição da borracha pela pecuária levou à especulação fundiária e ao desmatamento de grandes extensões de terras impedindo a permanência nos seringueiros na floresta.
Na época, o sindicato era presido por Wilson Pinheiro, que junto com Chico e outros seringueiros reuniam suas famílias, iam para as áreas ameaçadas de desmatamento, desmontavam os acampamentos dos peões e paravam os motosserras.
Em decorrência desse movimento de resistência, em 1980, Wilson foi assassinado dentro da sede do sindicato. Três anos depois, Mendes assumiu a presidência do Sindicato de Xapuri, cargo que exerceu até a sua morte.
Nos anos 1980, Chico junto com Lula ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores, e se tornou uma de suas principais lideranças no Acre. Participou de vários comícios ao lado do ex-presidente na região e, em função da sua atividade política foi enquadrado na Lei de Segurança Nacional a pedido de fazendeiros locais.
Chico Mendes liderou o 1º Encontro Nacional de Seringueiros, durante o qual foi criado o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), em 1985. Do Encontro saiu “A União dos Povos da Floresta”, demonstrando que índios e seringueiros não eram inimigos, mas sim companheiros de uma causa comum e que estavam sofrendo as mesmas injustiças. Que ambos eram perseguidos por grileiros, latifundiários, madeireiros ilegais e por forças do capital que ambicionavam as terras indígenas, reservas extrativistas e quilombos.
“Ele foi um dos grandes responsáveis por organizar os trabalhadores e trabalhadoras rurais, criando sindicatos e levando a defesa do meio ambiente para o centro da agenda política dos sindicatos”, conta o secretário do meio ambiente da CUT, Daniel Gaio.
Mendes também teve forte atuação na CUT. Durante o Congresso de Belo Horizonte, em 1988, em que foi eleito para a direção da executiva nacional, apresentou a defesa dos “Povos da Floresta”, que incluía uma relação política e de defesa dos índios, dos trabalhadores extrativistas e toda a população que dependia direta e indiretamente da floresta.
“Chico Mendes defendeu no Congresso da CUT uma aliança pragmática de luta da classe trabalhadora em defesa do meio ambiente e dos povos da floresta”, diz Gaio.
Para a ex- trabalhadora rural e secretária de Saúde do Trabalhador da CUT, Madalena Margarida da Silva, a luta de Chico Mendes em defesa dos trabalhadores e trabalhadoras rurais extrativistas e da floresta amazônica não pode cair no esquecimento.
“Chico é uma referência para nós. Ele foi assassinado num momento de intensas lutas sociais, da promulgação da Constituição cidadã, por defender nosso direito ao sustento sem degradar a terra. Infelizmente, mais do que nunca precisamos reconhecer os “Chicos” de hoje que continuam sendo mortos para a ampliação do agronegócio, o acúmulo de riquezas de poucos e a exploração de trabalhadores e trabalhadoras”, diz a dirigente.
O brutal assassinato do líder da Floresta
Chico Mendes sabia que sua vida corria risco e chegou a escrever em uma carta em 1988, mesmo ano de sua morte, que “se um mensageiro descesse do céu e garantisse que minha morte ajudaria a fortalecer nossa luta, ela até valeria a pena. Mas a experiência nos ensina o contrário. Não é com grandes funerais e manifestações de apoio que iremos salvar a Amazônia. Eu quero viver”.
Nesse ano, Chico havia viajado pelo país e ao voltar Xapuri foi morto com tiros de espingarda no peito, quando saiu para o quintal de sua casa, na noite de 22 de dezembro, poucos dias depois do seu aniversário, no dia 15. O assassino foi Darcy Alves da Silva que cumpriu ordens do seu pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva
A notícia de sua morte correu o mundo e a imprensa estrangeira e brasileira acompanharam o caso. Durante o julgamento de Darcy e Darly, as ruas de Xapuri foram tomadas pelo povo.
No velório do sindicalista, Lula fez um discurso histórico e emocionante. “Precisamos transformar cada palavra do Chico numa profissão de fé por esse país. Daqui a pouco, o que o Chico falava aqui vai ser discutido no agreste de Pernambuco, na favela de São Paulo, na fábrica. Nós devemos eleger aqui Chico como mártir da classe trabalhadora. Porque ele dedicou 44 anos da sua vida a lutar pela liberdade dos trabalhadores”, disse Lula sobre o amigo, cujo nome fez figurar no Livro dos Heróis Brasileiros quando se elegeu presidente da República pela primeira vez.
Os assassinos foram condenados a 19 anos de prisão, mas três anos depois, eles fugiram da cadeia. Em 1996, voltaram a ser detidos. Cumpriram seis anos da pena em regime fechado, depois passaram para o semiaberto e, depois, o regime domiciliar.
O Brasil e o mundo rendem homenagens a Chico Mendes
Chico Mendes foi homenageado, nos anos 1987 e 1988 com o prêmio da Organização das Nações Unidas (ONU), Papel de Honra Global 500 e a Medalha de Meio Ambiente, da Better World Society, nos Estados Unidos.
Dois anos após a sua morte, em março de 1990, as primeiras Reservas Extrativistas foram criadas, dando perspectiva aos filhos dos seringueiros e extrativistas. Elas representam a primeira iniciativa de conciliação entre proteção do meio ambiente e justiça social, antecipando o conceito de desenvolvimento sustentável que surgiu com a Rio 92. O Decreto 98.897 definiu as Reservas Extrativistas como “espaços territoriais destinados à exploração autossustentável e conservação dos recursos naturais renováveis por população extrativista”.
Ele se tornou patrono de órgão de proteção do meio ambiente, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), além de um prêmio do Ministério do Meio Ambiente, criado em 2002 com o objetivo de valorizar e incentivar iniciativas de proteção que contribuam para a promoção do desenvolvimento sustentável da região amazônica brasileira.
Com informações do Instituto Lula e Agência PT