COAF: salários de assessores de Flávio Bolsonaro nem esquentavam na conta
No dia seguinte ou até uma semana depois de receber o salário, nove ex-assessores do filho do presidente transferiam todo o dinheiro para a conta do ex-motorista do deputado. Não ficavam com nada
Publicado: 12 Dezembro, 2018 - 12h27 | Última modificação: 12 Dezembro, 2018 - 15h35
Escrito por: Redação CUT
A análise dos depósitos e saques na conta do ex-motorista de Flávio Bolsonaro (PSL), Fabrício José Carlos de Queiroz, que movimentou R$ 1,2 milhão em um ano, indicam tentativa de ocultação da origem ou do destino final do dinheiro, de acordo com relatório do Conselho de Atividades Financeiras (COAF). Somente em 2016, foram feitos 176 saques em dinheiro de sua conta corrente.
A maior parte dos depósitos era feita por nove ex-assessores do deputado estadual e senador eleito nos dias de pagamento da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) ou até três dias úteis depois. De um total de 59 operações realizadas, 34 seguiram este padrão. O restante do dinheiro foi depositado em até uma semana.
Isso significa que os assessores, entre eles, as filhas do ex-motorista, Nathalia e Evelyn Melo de Queiroz, e sua mulher, Marcia Oliveira de Aguiar, não ficavam com os salários que recebiam para supostamente trabalhar no gabinete do filho mais velho do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), que acabou envolvido no caso porque sua mulher, a futura primeira-dama, Michelle Bolsonaro, recebeu de Fabrício um cheque de R$ 24 mil. Segundo Bolsonaro pai, o cheque foi parte de um empréstimo que ele fez para o amigo e ex-motorista do filho, no calor total de R$ 40 mil. Ele teria esquecido de declarar o empréstimo na sua declaração de Imposto de Renda.
Outra coincidência: todos os assessores, inclusive o ex-motorista, que também era segurança do deputado, foram exonerados em outubro, antes de ser deflagrada a Operação Furna da Onça.
O relatório do COAf é justamente um desdobramento da Operação Furna da Onça, que prendeu dez deputados e secretários estaduais do Rio, em novembro – no total, 36 estão sendo investigados pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Flávio Bolsonaro não é alvo das investigações, mas as contas dos funcionários da Alerj foram vasculhadas e as movimentações atípicas nas contas do seu ex-motorista chamaram a atenção dos investigadores.
Saiba Mais
Análise dos dados feita por uma equipe da TV Globo e exibidas no Jornal Nacional desta terça-feira (11) mostrou a coincidência entre os depósitos e os saques feitos na conta de Fabrício, no dia ou alguns dias após os assessores de Flávio Bolsonaro receberem os salários.
Em dezembro, segundo o JN, teve depósitos um dia depois dos salários caírem nas contas dos assessores e também no mesmo dia em que foi pago o 13º dos funcionários da Alerj.
Sobre os saques de Fabrício, o JN mostrou que, nos meses de março, abril, maio, junho e novembro, ele começou a tirar dinheiro da conta no mesmo dia em que foram feitos os depósitos ou nos dias seguintes. Na maioria das vezes, o saque foi de R$ 5 mil, o valor do limite diário por agência bancária. Por isso, em pelo menos dois dias, Fabrício foi a três agências para sacar R$ 15 mil em dinheiro.
Já o jornal O Estado de S Paulo identificou que 15 depósitos em espécie na conta de Queiroz ocorreram nos mesmos dias de pagamento dos servidores da Alerj em 2016. Essas datas variaram a cada mês, por causa da crise financeira do governo do Rio, que resultou no atraso dos pagamentos dos salários, mas foram mapeadas através do cruzamento do relatório do Coaf com o cronograma de pagamentos da assembleia fluminense. Outros 19 depósitos na conta de Queiroz ocorreram em até três dias úteis após os funcionários receberem seus vencimentos.
Os valores depositados mensalmente também se repetem ou são aproximados. Investigadores analisam se há padrão nas ações, em valores ou periodicidade. O jornal Folha de S. Paulo mostrou nesta terça-feira que, logo após receber os valores, Queiroz realizou saques em espécie em quantias aproximadas às que haviam entrado em sua conta.
A coincidência de datas ocorre logo nos primeiros depósitos feitos em 2016. Em 12 de janeiro, dia de pagamento na Alerj, por exemplo, o então assessor recebeu três depósitos em espécie, nos valores de R$ 4.400, R$ 5.566 e R$ R$ 1.771.
Outra sequência é vista em 14 e 15 de abril, dia de pagamento na Alerj. No primeiro dia, Queiroz recebeu um depósito de R$ 7.400. No seguinte, foram feitos outros dois depósitos, de R$ 1.771 e R$ 4.300, na sua conta.
Em maio de 2016, os funcionários da Alerj receberam no dia 11. Nessa data, Queiroz ganhou três depósitos, novamente no valor de R$ 1.771, outro de R$ 3.071 e um último de R$ 1.000. Um dia depois, em 12 de maio, foi feito na conta outro depósito, de R$ 6.300, e no dia 16 caiu o último valor do mês, de R$ 1.160. Os padrões se repetem em junho e em novembro. O relatório, no entanto, não diz quem realizou os depósitos.
Até agora, o ex-motorista que também é policial militar aposentado - foi para reserva depois que pediu exoneração do cargo de assessor de Flávio, não se pronunciou. Em postagem no Twitter, o deputado e senador eleito disse que falou com o ex-motorista e este teria dado explicação plausível. Flavio não disse, porem, que explicação foin essa.
O que é COAF
O Coaf é a sigla do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão ligado ao Ministério da Fazenda que atua na prevenção e combate à lavagem de dinheiro. Foi o COAF quem fez um relatório de inteligência financeira que sinaliza movimentações atípicas de diversas pessoas ligadas à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), entre eles, o ex-motorista e ex-segurança do deputado estadual Flávio Bolsonaro que também é amigo de longa data do presidente eleito.
O Coaf recebe informações de empresas que são obrigadas por lei a informar transações suspeitas de lavagem, a exemplo de bancos, imobiliárias e joalherias. Em seguida, produz relatórios e os encaminha a órgãos de investigação.