Com Temer, investimento das estatais federais é o menor em quase 20 anos
Sindicalistas e professora de economia da USP criticam desinvestimentos e dizem que os períodos de crescimento da economia do Brasil coincidem com os anos em que foram feitos mais investimentos públicos
Publicado: 04 Julho, 2018 - 16h23 | Última modificação: 27 Julho, 2018 - 18h12
Escrito por: Rosely Rocha, especial para Portal CUT
O governo golpista e ilegítimo de Michel Temer (MDB-SP) acelera o desmonte do patrimônio público do Brasil retirando investimentos, principalmente, em áreas estratégicas como o petróleo e energia e trava o crescimento econômico do país.
Temer foi o presidente que menos investiu nos últimos 19 anos nas estatais brasileiras, segundo dados do 6º Boletim das Estatais Federais do Ministério do Planejamento.
A comparação dos primeiros trimestres dos dois últimos anos do governo da ex-presidenta Dilma Rousseff e o mesmo período de 2017 e 2018, depois do golpe de 2016, mostram que Temer investiu quase a metade.
Nos primeiros trimestres de 2014 e de 2015, a ex-presidenta Dilma Rousseff investiu nas estatais R$ 40,3 bilhões (R$ 21,7 bilhões - 1,6% do PIB -, em 2014; e R$ 18,6 bilhões - 1,3% do PIB -, em 2015).
Já Temer, investiu R$ 11,2 bilhões, em 2017 – 0,7% do PIB; e R$ 9,8 bilhões, em 2018 - 0,6% do PIB.
“Só há uma justificativa para a falta de investimentos nas estatais: a privatização a qualquer custo. Deixam de investir para sucatear o patrimônio público e assim vender mais barato”, critica a professora sênior da Faculdade de Economia da USP, Leda Paulini, que também é professora visitante da UFABC.
“Esse governo golpista e ilegítimo não vê nenhum papel para o Estado. Eles querem um programa liberal privatista, que começou na era FHC, foi freado nos governos do Lula e Dilma, do PT, e agora é retomado depois do golpe”.
Para a professora, Temer e seus ministros nunca leram um livro de história na vida, senão saberiam o que gera desenvolvimento econômico.
“Não é possível que eles não saibam que os períodos em que o Brasil mais se desenvolveu foram nos períodos em que houve mais investimentos públicos”, diz Paulini.
A coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas e representante dos empregados no Conselho de Administração da Caixa Econômica Federal (CEF), Rita Serrano, concorda e lembra que, nos governos Lula e Dilma as estatais foram utilizadas para promover o desenvolvimento do país.
Segundo ela, a Caixa se tornou a maior financiadora de habitação e os bancos do Brasil e do Nordeste foram os maiores fomentadores da agricultura, da pequena e da grande indústria.
“Com a política de desmonte, a Caixa já não é a líder de financiamento habitacional e o programa ‘Minha Casa, Minha Vida’ foi drasticamente reduzido”, diz Rita.
De acordo com a dirigente, com menos financiamentos, as construtoras demitiram, o nível de emprego caiu em toda a cadeia produtiva, a economia desaqueceu e a população ainda teve de dar adeus ao sonho da casa própria.
Rita lembra, ainda que, o BNDES está totalmente descapitalizado com a retirada de R$ 110 bilhões do orçamento, o que acabou com a capacidade do banco de financiar pequenas e grandes indústrias. E com as taxas de juros proibitivas para os empresários nacionais, a maioria desiste de investir na capacidade produtiva do seu próprio negócio e parte pra especulação financeira.
“Quem incentiva o desenvolvimento são as empresas públicas e quando não há esse investimento, entra-se no ciclo vicioso porque as empresas privadas (que não são as grandes multinacionais) não têm capacidade de investimento”, diz Rita.
“O Brasil perde patrimônio, empregos e divisas, pois as grandes multinacionais mandam o lucro para o exterior e não investem aqui. Ao privatizar, o governo também perde instrumentos de investimentos”.
Para Rita Serrano, os números do desinvestimento da era Temer demonstram as consequências do golpe.
“Quando Temer assumiu os movimentos e entidades sindicais ‘gritaram’ que o golpe era contra o país e não contra Dilma e muita gente não acreditou. Temer assumiu o governo comprometido com as multinacionais, o grande capital privado”, diz.
Crise não justifica redução de investimentos
A professora de economia da USP Leda Paulini repudia a análise de alguns economistas que veem na crise econômica motivo para diminuir os investimentos públicos.
“O que vemos não é apenas uma redução no valor total dos investimentos e, sim, uma redução no percentual do PIB. Por exemplo, em 2010, no governo Lula, foram investidos 2,1% do PIB (R$ 18,8 bi). Com Temer, apenas 0,6% (R$ 9,8 bi) – quase a metade do índice do PIB e de valores absolutos”, explica a professora.
“É uma política de entrega e redução do poder do Estado em termos de soberania nacional”, diz.
Rita Serrano complementa dizendo que desmantelar estatais não diminui os custos do Estado. Na realidade, privilegia os bancos porque o governo acaba pagando os juros da dívida interna para quem financiou o golpe que é o grande capital internacional.
Desinvestimento na Petrobras
No governo Temer, a Petrobras recebeu o menor investimento nos últimos 19 anos: R$ 8,6 bilhões no primeiro trimestre deste ano.
“Quem ganha é o capital privado e as grandes multinacionais como a Shell, que compram o patrimônio público brasileiro e determinam as regras do jogo”, diz Rita.
Já para Leda Paulini, a Petrobras tinha um efeito multiplicador muito grande, “era responsável sozinha por mais de 10% do investimento do país, antes do golpe, porque ela mobiliza outros setores como a indústria naval e toda uma cadeia de produção de petróleo e gás. Privatizá-la será uma perda gigante”.
Eletrobras
Já Eletrobras recebeu 5,2% do total dos investimentos - R$ 518 milhões – este ano.
Para Felipe Chaves, engenheiro de Furnas e diretor da Associação dos Empregados de Furnas (Asef), esses índices não são nenhuma surpresa tendo em vista que o atual governo tem trabalhado para que as estatais percam relevância e possam ter seus ativos vendidos e sejam privatizadas.
“Com as taxas de juros mais baixas é um bom momento para voltar a investir na empresa. Mas sabemos que a ordem vem de cima, dos ministérios, que não permitem que a empresa volte a crescer. Bastaria ter uma boa gestão com alguém responsável, mas o governo prefere acabar com as estatais”, diz Felipe.
Para a coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, só há uma solução à vista para reverter essa situação desastrosa.
“Somente com eleição presidencial teremos condições de reverter num curto prazo essa situação caótica e colocar o país novamente nos rumos do desenvolvimento“, acredita Rita.
Confira os investimentos das estatais federais a cada primeiro trimestre (valores em reais sem correção)
2000: 0,5% do PIB (R$ 1,5 bi)
2001: 0,7% do PIB (R$ 2,2 bi)
2002: 1% do PIB (R$ 3,4 bi)
2003: 0,9% do PIB (R$ 3,8 bi)
2004: 0,9% do PIB (R$ 4 bi)
2005: 1% do PIB (R$ 5 bi)
2006: 1% do PIB (R$ 6 bi)
2007: 1,3% do PIB (R$ 8,1 bi)
2008: 1,4% do PIB (R$ 9,8 bi)
2009: 1,8% do PIB (R$ 13,9 bi)
2010: 2,1% do PIB (R$ 18,8 bi)
2011: 1,6% do PIB (R$ 16,7 bi)
2012: 1,7% do PIB (R$ 19,6 bi)
2013: 1,7% do PIB (R$ 21,2 bi)
2014: 1,6% do PIB (R$ 21,7 bi)
2015: 1,3% do PIB (R$ 18,6 bi)
2016: 1% do PIB (R$ 15 bi)
2017: 0,7% do PIB (R$ 11,2 bi)
2018: 0,6% do PIB (R$ 9,8 bi)