Escrito por: Érica Aragão

Contag e Contraf-Brasil entram no STF contra paralisia da reforma agrária

Entidades lutam também no Congresso por uma política emergencial para a agricultura familiar e avisam: dia 16 é dia de luta. Neste dia, Congresso analisa veto de Bolsonaro a lei Assis Carvalho

Contag

Entidades sindicais CUTistas do campo estão preocupadas com o rumo das políticas do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) para a agricultura familiar e para a Reforma Agrária e travam batalhas em defesa dos trabalhadores e trabalhadoras e da população, tanto na justiça quanto no parlamento.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil (Contraf-Brasil) estão mobilizadas para defender um desenvolvimento rural sustentável, com trabalho e renda para o povo do campo, e também alimentos na mesa da população, que estão fortemente ameaçados. As entidades denunciam a paralisia da Reforma Agrária. 

Uma frente de luta é a ação que as entidades sindicais deram entrada no Supremo Tribunal Federal (STF) esta semana contra a paralisação do processo de Reforma Agrária (lei mais no final do texto). A outra frente é a luta no Congresso Nacional para derrubar os vetos de Bolsonaro a projeto que beneficia trabalhadores da agricultura familiar.

Na próxima semana, dia 16, o Congresso Nacional vai apreciar os vetos de 14 artigos do Projeto de Lei (PL) nº 735, promulgado como Lei nº 14.048 - Assis Carvalho, em 24 de agosto de 2020. As entidades protestam e pedem que os deputados e deputadas cancelem os vetos de Bolsonaro e pedem apoio da população para ajudar na pressão junto aos parlamentares.

Construído pelo conjunto das organizações e movimentos sociais do campo, das águas e das florestas, o PL 735, aprovado na Câmara dos Deputados por ampla maioria e no Senado Federal por unanimidade, prevê medidas emergenciais para minimizar os impactos da pandemia nas propriedades da agricultura familiar. Entre elas, crédito e auxílio emergenciais para os trabalhadores e trabalhadoras do campo e renegociação de dívidas da categoria.

Com os vetos, a categoria segue desde o início da crise sanitária sem nenhuma política para garantir a recuperação das propriedades e recuperação do potencial produtivo, o que afeta a produção e distribuição do alimentos. Pode faltar comida e o preço dos alimentos aumentar mais ainda.

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“A pressão da categoria nos deputados, em Brasília e nos estados, está acontecendo de todas as formas, presencialmente e virtualmente. É cara a cara, via e-mail, por meio de telefonemas e sempre dialogando com todos os parlamentares para que cancelem os vetos e a agricultura familiar possa continuar sobrevivendo e produzindo alimentos, para manter o setor e abastecer a população. É a vida da categoria e de todos brasileiros e brasileiras que está em jogo”, afirmou o secretário de Política Agrária da Contag, Elias D’Angelo Borges.

O governo Bolsonaro, como sempre denunciaram as entidades, privilegia o agronegócio, que é responsável, em sua grande maioria, em exportar commodities. E ainda retira cada vez mais os direitos do povo do campo e de quem precisa comer, e de toda a sociedade brasileira.

Contraf-Brasil

Outra frente de luta é a Reforma Agrária

Nesta semana, as entidades sindicais, movimentos populares, organizações do campo e partidos políticos protocolaram Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal para denunciar a paralisação do governo na reforma agrária. De acordo com o documento, 413 processos estão paralisados, abandonados, com o argumento de que dinheiro público está com as contas no limite.

As entidades signatárias da petição solicitam ao tribunal que sejam reconhecidas e sanadas as graves lesões aos preceitos fundamentais da Constituição brasileira praticadas por órgãos federais do Estado, decorrentes da paralisação da reforma agrária e da não destinação das terras públicas federais a essa finalidade. As entidades reafirmam: “paralisar a reforma agrária é inconstitucional”.

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Os dados elencados no documento entregue no STF mostram que aquilo que poderia ser visto como uma cautela de início do governo revelou-se uma diretriz permanente e em vigência até o presente momento. Outro ponto destacado no texto é a constitucionalidade da reforma agrária que é uma política central para a redução da desigualdade no país.

“No último período tivemos um verdadeiro desmonte das instâncias que desenvolvem essas políticas, sobretudo o Incra. No só no ponto de vista orçamentário, mas nas estruturas e com isso a reforma agrária está absolutamente paralisada no nosso país”.

“Desde o golpe de 2016 o governo federal, com Temer e agora com Bolsonaro, praticamente não fez nenhuma ação de reforma agrária, de assentamento de novas famílias e mesmo aquelas que estão assentadas estão passando por inúmeras dificuldades e por isso tomamos as iniciativas”, explicou o Coordenador da Contraf-Brasil, Marcos Rochinski.

Brasil 247

Plantou, colheu

A agricultura familiar não só produz mais de 70% dos alimentos que chegam nas mesas dos brasileiros e brasileiras, esta forma de produzir comida saudável também emprega milhões de pessoas, é meio de sobrevivência econômica para muitos e ainda protege o meio ambiente.

Porém, o governo só vem desmontando e enfraquecendo o setor, na questão de políticas, orçamento, assistência técnica de comercialização, políticas de crédito e habitação rural, tão importantes para a produção de alimentos no campo.

Rochisnki questiona: o que nós colhemos enquanto sociedade brasileira desse processo todo? E ele mesmo responde: “Colhemos a desestruturação das famílias e das suas rendas e um aumento substancial dos preços dos alimentos. A população já sente o aumento da carne, do óleo, do arroz, de, praticamente, todos os legumes, frutas e dos produtos que compõem a cesta básica”.

“Se não tivermos uma ação urgente por parte do Congresso Nacional, da derrubada dos vetos da Lei Assis Carvalho, e o Supremo não intervir decisivamente nessas questões, obrigando, inclusive, que o governo restabeleça orçamentos para essas políticas, seja da reforma agrária ou para os agricultores familiares, em 2021, infelizmente, vai ser um ano mais difícil. Principalmente para população mais carente, que precisa de maior renda ou percentual maior de renda, para compra de alimentos”, ressaltou o dirigente.

Entidades pedem participação da população na pressão dos deputados

É preciso que o Estado fomente a produção de alimentos para que o preço seja mais acessível, explica Elias.

Segundo ele, todo mundo precisa se alimentar e a maioria da população tem poder aquisitivo menor e precisa consumir alimentos mais em conta.

“O governo diz que agricultura familiar é igual o agronegócio, mas não trata os dois como iguais na questão de investimentos. Enquanto financia o latifúndio, deixa a agricultura familiar quase sem investimentos em diversos setores. Quanto mais investir em commodities, mais vai aumentar os preços dos alimentos. Toda sociedade precisa se mobilizar contra estas barbáries”, aponta Elias.

“Todos e todas precisam pressionar os parlamentares e o STF, porque se não teremos muitos agricultores familiares migrando para a produção de soja, milho e outras coisas que saem dos navios brasileiros para alimentar outra nação e o nosso povo pode passar fome sem alimentos na mesa e sem produção”, ressaltou o dirigente da Contag.

Mais ataques

Para piorar ainda mais, no último dia 3 de dezembro, o governo federal, por meio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em conjunto com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), institui o programa Titula Brasil, Portaria Conjunta nº 1, que terceiriza o trabalho de vistoria local e de checagem de dados do processo de regularização de terras e deixa à cargo dos municípios a responsabilidade de indicar técnicos que poderão executar o trabalho e decidir se as terras tem condição regular ou não para a entrega da documentação do imóvel.

“Isso é função do Estado. Já temos no Brasil um problema sério de negligência da reforma agrária, com a saúde, com a segurança das famílias que estão acampadas, assentadas, e o conjunto de trabalhadores que produzem o alimento nesse país. Temos o avanço desenfreado e ilegal do agronegócio sobre os territórios com o aval desse desgoverno, não podemos aceitar mais essa investida contra uma luta legítima e justa que é o acesso à terra”, enfatizou Lázaro de Sousa Bento, coordenador de Finanças da Contraf-Brasil, em matéria no site da entidade.

Vale ressaltar que o deputado federal João Daniel (PT-SE), que coordena o núcleo agrário da bancada do PT na Câmara, protocolou, na sexta-feira (4), o Projeto de Decreto Legislativo (PDL 520/2020) que na prática suspende a Portaria Conjunta nº 1, com o objetivo de sustar os efeitos.

*Edição: Marize Muniz