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Contag e Contraf se mobilizam para enfrentar tempos sombrios com Bolsonaro

Entidades que representam os trabalhadores na Agricultura Familiar destacam avanços durante os governos do PT, criticam Temer e anunciam resistência contra retrocessos em 2019

Publicado: 20 Dezembro, 2018 - 11h50 | Última modificação: 20 Dezembro, 2018 - 12h46

Escrito por: Andre Accarini

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Políticas essenciais para o desenvolvimento agrário sofreram reduções drásticas após o golpe de 2016 e correm riscos ainda maiores com o futuro governo de Jair Bolsonaro (PSL). Algumas dessas conquistas, construídas durante os governos Lula e Dilma, como a consolidação do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), já sofreram reveses depois que Michel Temer (MDB) usurpou o cargo da presidenta Dilma Rousseff. Uma das primeiras medidas do ilegítimo foi transformar o MDA em secretária especial, cortando investimentos para o setor.

Duas das maiores entidades de representação dos trabalhadores e trabalhadoras rurais já se preparam para reforçar a luta para barrar os ataques às políticas públicas voltadas à agricultura familiar. A escolha da deputada Tereza Cristina (DEM-MS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, para o Ministério da Agricultura, indicou o caminho que Bolsonaro pretende seguir em sua gestão. E este, com certeza não é o de apoio à agricultura familiar, aos pequenos agricultores.

Conquistas em risco

Bolsonaro já sinalizou que vai centralizar as políticas rurais no Ministério da Agricultura, diz Aristides Veras, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).

“Um absurdo. É como se existisse apenas o mundo do capital, e não o do trabalho”, afirma o dirigente.

Seremos chefiados pelo fazendeiro
- Aristides Veras

Para ele, o futuro governo parece ignorar que mais de 70% do que o brasileiro come vem da agricultura familiar. “Se não houver incentivo a esses pequenos agricultores, os preços vão aumentar, porque as grandes corporações estarão no comando”.

O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Contraf-Brasil), Marcos Rochinski,  concorda com a avaliação de Veras e diz, ainda, que medidas dessa natureza beneficiam apenas as grandes empresas porque desconstroem as conquistas das políticas públicas.

“Remeter toda a política de desenvolvimento rural para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) é ter políticas para a agricultura familiar sendo construídas justamente por quem disputa o modelo de produção. E, historicamente, o Mapa sempre desenvolveu políticas para os grandes”, afirma Rochinski.

Segundo Rochinski, a Contraf-Brasil investirá na tentativa de diálogo, mas tem consciência de que as expectativas são preocupantes.

Se não tiver conversa, nossa mobilização vai aumentar
- Marcos Rochinski

O dirigente explica que desde o golpe, quando começaram todas as tentativas de retrocesso, a ação da entidade foi concentrada em manifestações em estados e municípios, criando um ambiente no Congresso Nacional que mobilizou parlamentares para pressionar o governo para não extinguir políticas de agricultura familiar.

Essa foi a mesma linha de atuação da Contag, que defende a construção de uma frente ampla com participação da sociedade para que a pressão popular possa minimizar os efeitos nefastos “de um governo centralizado, autoritário, que não valorizará nem a agricultura familiar nem a classe trabalhadora como um todo”, afirma Veras.

Segundo o presidente da Contag, “se Bolsonaro mantiver a linha Temer de governar (ou se for pior), as consequências para a soberania e para a democracia brasileira serão desastrosas”.

Bons tempos

Tanto Veras quanto Rochinski lembram como as políticas construídas nos governos do PT foram fundamentais tanto para o desenvolvimento agrário quanto a melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores e trabalhadoras do campo.

Veras destaca que o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) só começou a trabalhar de verdade no primeiro mandato do ex-presidente Lula. Antes de 2003, o orçamento do MDA era pequeno.

Com Lula houve avanços importantes na reforma agrária e em políticas de inclusão de jovens, mulheres e outros segmentos do campo
- Aristides Veras

Para ele, a partir desse período, ações como o Plano Safra, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar se tornaram realidade. Trabalhadores e trabalhadoras rurais também passaram a ter acesso à previdência.

“Essas políticas eram necessárias para que pudesse haver planejamento no campo. O pequeno produtor conseguiu crédito e assistência técnica” lembra o dirigente.

Trabalhadores e trabalhadoras rurais também passaram a ter acesso à Previdência Social. O MDA expandiu o atendimento e o governo abriu postos do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) nos municípios mais distantes dos grandes centros. O resultado foi o aumento do número de benefícios nessas localidades e consequente aumento de renda da população e desenvolvimento, lembra Veras.

Já Rochinski, destaca como conquista do período petista a implantação da Lei 11.326/2006 que reconhece o conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras do campo como categoria econômica e profissional. “Isso foi um marco para os rurais. Antes havia políticas, mas não existia uma lei que estabelecia quem era esse público”.

A iniciativa instituiu programas de habitação rural, o ‘Luz Para Todos’, além de políticas de comercialização, como o Plano Nacional de Educação Alimentar, que determina que um mínimo de 30% do valor repassado a estados, municípios e Distrito Federal, seja destinado à aquisição de produtos da Agricultura Familiar.

Aí veio o golpe

“Essas políticas foram conquistadas por meio de muito diálogo, que deixou de existir depois do golpe”, diz Rochinski, lembrando que no governo do ilegítimo Temer só se conseguiu manter relações com órgãos específicos como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Secretária Especial de Agricultura Familiar. Em outros órgãos, como o Ministério do Planejamento, onde eram tratadas questões orçamentárias, por exemplo, Ministério das Cidades e a Casa Civil, as negociações foram interrompidas.

“O governo [Temer] teve a postura de inviabilizar a continuação de conselhos como o de Desenvolvimento Rural, que ficou estagnado por quase um ano. E quando voltou, as pautas ficaram apenas no papel”, diz o sindicalista.

Programas como PAA (Aquisição de Alimentos) sofreram reduções drásticas. “Antes, o orçamento era de R$ 300 milhões. Caiu para R$ 50 milhões e para 2019, o valor indicado no Orçamento Geral da União é de apenas R$ 750 mil”, critica o presidente da Contraf-Brasil.

Eles desconstruíram boa parte de nossas conquistas. Viraram as costas para a sociedade civil
- Marcos Rochinski 


O presidente da Contag, Aristides Veras, considera a tentativa de reforma da Previdência uma das maiores ameaças do golpe contra os trabalhadores e trabalhadoras  rurais.

“As confederações e sindicatos de trabalhadores rurais, em conjunto com a CUT, centrais e movimentos sociais, impediram que o governo fizesse a reforma que acabaria com a aposentadoria”, diz o dirigente se referindo aos atos e a maior greve da historia do Brasil realizada contra a reforma da Previdência.

Entre os retrocessos impostos aos trabalhadores pelos golpistas, Veras cita também a retração de recursos, provocada pelo fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário. “Acabar com o MDA significou acabar com a articulação de políticas e dar visibilidade para o setor. Sem recursos o pequeno produtor para, e o trabalhador migra para a cidade para tentar trabalho porque no campo não tem”.

Ano novo, política velha

Para os dirigentes da Contag e da Contraf-Brasil, a concepção de governo implantada por Temer e os golpistas é de Estado mínimo, em que a classe trabalhadora é alvo do ataque aos direitos conquistados. E isso coloca as confederações em estado de alerta, já que a expectativa com o próximo governo é “aprofundar para pior o que Temer fez”, diz Veras, da Contag.