Escrito por: Leonardo Severo
“Prisões de sindicalistas atendem interesses da Hyundai e da Samsung”
José Celestino Lourenço (Tino) representou a CUT nas manifestações de solidariedade em Seul
Das barbaridades presenciadas em Seul, qual a que mais chamou a atenção?
A decisão da “Justiça” sul-coreana de condenar a cinco anos de prisão o presidente da KCTU, Han Sang Yun, encarcerado desde dezembro de 2015, é realmente um absurdo. Vale lembrar que Han já estava detido desde o ano passado por “obstrução especial de dever público”, “obstrução geral do tráfego” e “incentivar a luta contra a reforma da lei trabalhista que flexibiliza direitos dos trabalhadores”. Eu acompanhei o julgamento ao lado dos companheiros, uma arbitrariedade sem limites. A defesa ficou sentada, não se pronunciou. O juiz entrou, leu a legislação e logo já emitiu a sentença. Temos também o fato da secretária-geral da entidade, Lee Young Joo, estar detida na sede da KCTU desde novembro do ano passado, também ameaçada de prisão por lutar em defesa de direitos sociais e trabalhistas.
Alguma similaridade com o Brasil?
Há muita semelhança na criminalização aos movimentos sociais e, particularmente, nos ataques à educação no Brasil, com a lei da mordaça que busca impedir a liberdade de expressão e uma educação libertadora, tentando retirar sociologia e filosofia do ensino médio. Quando eu denunciei o que estava acontecendo, eles me diziam: o Brasil é aqui, é isso o que a presidente Park Geun-Hye vem fazendo. Não é mera coincidência, há uma profunda identidade neoliberal.
A quem serve o governo sul-coreano?
Quem determina a política do Estado na Coréia do Sul são as grandes transnacionais Samsung e Hyundai, que conseguem forçar o governo a impor uma legislação que retira direitos, como o aumento da jornada com redução salarial e que reprime violentamente manifestações de quem se insurge contra as empresas. É terrível.
Visitaste alguma destas empresas?
Estive em um acampamento da Hyundai em que os trabalhadores se manifestavam em defesa de um dirigente sindical filiado à KCTU e que enfrenta não só uma perseguição a nível pessoal, como familiar. A empresa criou um sindicato amarelo, que é como eles chamam os sindicatos pelegos, para vender a imagem de que negocia com os trabalhadores. Uma completa mentira. Também estive no acampamento de trabalhadores da agricultura familiar em frente a um hospital onde um companheiro encontra-se internado, em coma, após ter sido atingido por um jato de canhão d’água. Além disso, participei da greve geral e da manifestação que reuniu mais de 25 mil trabalhadores na capital lutando pela jornada de 8 horas diárias, pois lá elas variam de 12 horas diárias, até mais. Depois da manifestação dos operários da construção, eu estava na lanchonete com o presidente interino da KCTU quando os advogados ligaram e disseram que ele também estava indiciado, com sentença para ser emitida por cinco anos, pelos mesmos crimes.
Alguma recordação especial?
A determinação daqueles milhares de companheiros e companheiras, que são muito solidários. Recordo também a coreografia muito especial, que imitava guindastes e lutas, de uma forma animadora. As manifestações são muito organizadas, bastante caracterizadas por uma mística em que sobressai o espírito de combate coletivo, de homens e mulheres que não se deixam intimidar, mostrando firmeza e coerência entre discurso e prática. O nível de repressão entra em contradição com um país que tem apenas 0,3% de analfabetismo, que é o terceiro do mundo em tecnologia de ponta e tem uma economia altamente desenvolvida. A luta dos trabalhadores sul-coreanos é para que tudo isso seja colocado a serviço de todos e que o governo abandone ações medievalescas contra quem busca melhorias. Não é à toa que os trabalhadores chamam a Samsung de demônio.
Quais os próximos passos da solidariedade e da luta por justiça?
A CUT vai acionar os organismos internacionais, como a comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), e fortalecer a ação da KCTU, em um processo que já está na Organização Internacional do Trabalho (OIT), denunciando o governo da Coreia do Sul. Este é o momento de estreitarmos ainda mais os nossos laços de solidariedade com a KCTU.