Escrito por: Gabriel Valery, da RBA
Instalação no Parque Ibirapuera, em São Paulo, recebe 180 mil pessoas por ano, e mantêm acervo de 7 mil peças. "Não querem que a sociedade se posicione politicamente", diz coordenadora de Educação
O Museu Afro Brasil, que fica no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, corre o risco de fechar as portas. O cenário é reflexo da política do governador João Doria (PSDB), que anunciou um corte de até 23% no orçamento da secretaria de Cultura do estado. Agora, os trabalhadores do museu estão mobilizados para tentar reverter tal decisão, além de estarem contando cada real na ponta do lápis para manter o mínimo do funcionamento.
O problema é que a instituição já funciona no limite desde 2015. A coordenadora do núcleo de Educação do museu, Neide Almeida, conversou com a RBA sobre o cenário de terra devastada que o corte deve deixar na cultura do estado mais rico do país. "Quando vemos uma postura como esta de um governo, vejo como um sinal de que não querem que a gente reflita, não querem questionamentos, não querem que a sociedade se posicione politicamente", disse.
O museu recebe, anualmente, 180 mil visitantes, um total de quase 2 milhões de visitantes desde 2009. Além de dezenas de exposições por ano, a entidade conta com um acervo de mais de 7 mil obras, uma biblioteca com 12 mil títulos, além de um teatro (Ruth Souza). Do total anual de visitantes, por volta de 40 mil são estudantes, o que é relevante pela relação entre cultura e educação.
"Sabemos que, quando a cultura é atingida, como agora, a educação também é", afirma Neide. "A grande parte dos estudantes que recebemos são de escolas públicas. Quando vemos um equipamento cultural fechar, isso reflete negativamente nos processos educativos. O papel da cultura é fundamental, tanto do ponto de vista do que podemos produzir, como o que refletimos a partir da produção", completa.
Além do Museu Afro Brasil, que desempenha papel essencial na preservação e divulgação da história negra no Brasil, estão sob risco outros tantos aparelhos culturais, tais como outros museus, bibliotecas, orquestras e corais, centros culturais, companhias de dança, escolas de música, conservatórios, fábricas e casas de cultura.
O número de pessoas afetadas com o corte será um preço alto a pagar pela sociedade, ainda mais colocando na balança quanto o estado gasta com o setor. A cultura é a área com menor fatia do orçamento paulista, representando apenas 0,35%.
Em 2015, após um corte de 12%, o Museu Afro Brasil já demitiu 25 pessoas, além de ter terceirizado parte dos serviços. "Não temos margem para nada, esse novo corte vai impossibilitar nosso trabalho. Estamos estudando como poderemos lidar, mas existe sim o risco de não ser possível manter o museu aberto. É impossível bancar nossas atividades com esse impacto de quase um quarto nas verbas", disse Neide.
Para evitar o pior, os trabalhadores estão mobilizados e em busca de apoio na sociedade civil. "Nos organizamos para participar de uma audiência pública que acontece hoje (ontem, dia 4) na Assembleia Legislativa, para pensar formas de mobilização e reivindicar a revisão dessa decisão. Estamos atuando tanto por meio das redes sociais, como em contato com outros equipamentos e parceiros comprometidos para ampliar a resistência e reverter este quadro", completou.
Em nota, o museu afirma que cultura e memória são direitos dos cidadãos. "O Museu Afro Brasil, assim como todos os equipamentos estaduais de cultura – é um patrimônio de toda a sociedade. Por meio de nosso compromisso e dedicação temos assegurado à população paulista e brasileira um direito inalienável. Este museu é conquista do povo brasileiro e da população negra deste país. Sua existência, a existência da cultura no estado de São Paulo, está ameaçada. Somos contra o contingenciamento e nos levantamos para revoga-lo."
Assista reportagem do Seu Jornal, da TVT, sobre consequências dos cortes do orçamento da Cultura pela gestão João Doria: