Escrito por: Rosely Rocha
Superior Tribunal de Justiça decidiu que empresas de plano de saúde não precisam dar o atendimento prescrito se o mesmo não estiver na lista da Agência Nacional de Saúde. Decisão afeta 49 milhões de usuários
A decisão dos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a favor das empresas de plano de saúde que não serão mais obrigados a atenderem decisões judiciais de cobrir o tratamento de pacientes com doenças que não estão no rol da Agência Nacional de Saúde (ANS), vai ser contestada pela direção da CUT.
A secretária da Saúde do Trabalhador da CUT Nacional, Madalena Margarida da Silva, diz que nada impede que a entidade entre como amicus curae na ação civil pública que deverá ser impetrada junto ao Superior Tribunal Federal (STF), que contestará a decisão do STJ, aprovada nessa quarta-feira (8) por seis votos a três.
“Podemos subscrever essa ação civil pública que é de interesse de 49 milhões de usuários, sendo que 60% desses planos são coletivos. Ou seja, são direitos do trabalhador conquistados, em sua maioria, em acordos coletivos de trabalho”, diz Madalena.
Embora caiba recurso no STF, a decisão já impacta diretamente nos tratamentos de saúde como cobertura de exames, terapias, cirurgias e até fornecimento de medicamentos de alto custo para tratamento de doenças raras por exemplo, ainda mais, agora com todo impacto da pandemia no agravamento das condições de saúde.
“Essa medida dificultará o acesso para quem entrou com novas ações, pois os planos de saúde farão tudo pra não se responsabilizar com o tratamento de seus clientes, mas o governo pode apresentar leis para que as empresas ampliem o rol de procedimentos, inclusive, no Congresso Nacional já existem leis para ampliar o acesso a tratamentos de saúde, pois o direito já existe está na Constituição”, afirma a dirigente CUTista.
Decisão afeta o SUS
De acordo com Madalena Margarida, fica evidente que haverá um aumento da demanda para o Sistema Único de Saúde (SUS), pois se os planos negarem o pedido, seus usuários buscarão na rede pública seus tratamentos, inclusive, com pedidos judiciais para que a saúde pública garanta esse atendimento.
“O SUS já vive sobre carregado, sem financiamento e sob ataques desde o golpe de 2016 e, não pode ser penalizado com a não cobertura dos planos, que veem a saúde como mercadoria. Continuaremos lutando para ter um SUS pleno em seu funcionamento e financiamento de modo que ele atenda a população em suas necessidades, mas é necessário que os planos de saúde que já cobram tão caro, atendam a demanda de seus clientes”, ressalta Madalena Margarida.
O que é o rol taxativo
O chamado rol taxativo da ANS, que prevê mais de 3,7 mil procedimentos, vinha sendo considerado exemplificativo pela maior parte de decisões judiciais sobre o tema.
Os pacientes que tivessem negados procedimentos que não constassem na lista poderiam recorrer à Justiça para ampliar o atendimento.
Agora com este novo entendimento, o que não está na lista, não precisa ser coberto. Confira a lista aqui.
O rol de procedimentos da ANS é bem básico e não contempla muitos tratamentos importantes como, por exemplo, alguns tipos de quimioterapia oral e radioterapia, medicamentos aprovados recentemente pela Anvisa e cirurgias com técnicas de robótica.
Além disso, a ANS limita o número de sessões de algumas terapias para pessoas com autismo e vários tipos de deficiência. Muitos pacientes precisam de mais sessões do que as estipuladas para conseguir resultado com essas terapias e por isso, no atual modelo, conseguem a aprovação de pagamento pelo plano de saúde.
Entendimento do STJ
- O rol da ANS é, em regra, taxativo;
- a operadora não é obrigada a custear um procedimento se houver opção similar no rol da ANS;
- é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de um aditivo contratual;
- não havendo substituto terapêutico, ou após esgotados os procedimentos incluídos na lista da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente.
Para que essa exceção prevista no quarto tópico seja aplicada, é preciso que:
- a incorporação do tratamento desejado à lista da ANS não tenha sido indeferida expressamente;
- haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências;
- haja recomendação de órgãos técnicos de renome nacional, como a Conitec e a Natijus, e estrangeiros;
- seja realizado, quando possível, diálogo entre magistrados e especialistas, incluindo a comissão responsável por atualizar a lista da ANS, para tratar da ausência desse tratamento no rol de procedimentos.
Artistas e políticos de oposição criticam decisão do STJ
Desde a noite da quarta-feira as redes sociais foram utilizadas por artistas e políticos de partidos de oposição ao governo Bolsonaro criticando a decisão do STJ.
O apresentador de TV, Marcos Mion, foi um deles. O artista tem um filho diagnosticado com transtorno do espectro autista, criticou os ministros que votaram a favor dos planos de saúde em seu Instagram.
Ver essa foto no Instagram
Uma publicação compartilhada por Marcos Mion (@marcosmion)
A hashtag #RolTaxativoMata ficou entre as mais comentadas no Twitter. O médico infectologistane ex-ministro da Saúde deputado Alexandre Padilha (PT-SP) foi um dos opositores ao governo Bolsonaro a criticar a medida.
O STJ desobrigou os planos de saúde de cobrir procedimentos fora da lista da ANS. Só ano passado a receita dessas operadoras cresceu R$ 10 bilhões. Esse é mais um retrocesso que prejudicará milhares de trabalhadores. #RolTaxativoMata
— Alexandre Padilha (@padilhando) June 8, 2022O parlamentar também usou seu Instagram para dizer que não descansará até que a decisão seja revista.
Ver essa foto no Instagram
Uma publicação compartilhada por Alexandre Padilha (@padilhando)
Ações judiciais
As ações na Justiça cresceram quatro vezes em uma década, em um ritmo mais acelerado que o aumento da população coberta por convênios, segundo o estudo publicado por um blogueiro do Estadão. Em 2021, foram proferidas 16.268 decisões em segunda instância pelo TJ-SP. Em 2011, houve 4.793 decisões desse tipo.
Quase a metade das ações foi motivada por negativas de coberturas assistenciais pelos planos de saúde. Entre elas, cirurgias, hemodiálise, radioterapia, internações hospitalares em UTIs, tratamentos domiciliares e psiquiátricos, sessões de fisioterapia e fonoaudiologia. Muitas decisões também mencionaram o não fornecimento de medicamentos, órteses, próteses e materiais cirúrgicos.
Com informações do G1, CNS e site do PT