• Kwai
MENU

CUT-MG, MST e movimentos sociais exigem...

Audiência pública pede o fim da impunidade dos latifundiários e urgência na reforma agrária em Minas Gerais

Publicado: 21 Novembro, 2012 - 11h49

Escrito por: Rogério Hilário, com informações da ALMG

notice

Representantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), dirigentes da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais (CUT-MG) e de outros movimentos sociais participaram, na manhã desta terça-feira (20), de audiência pública sobre o Massacre de Felisburgo, no Jequitinhonha. Na chacina, que completou oito anos de impunidade, cinco trabalhadores rurais sem terra do acampamento Terra Prometida foram assassinados. Membros do Incra, Ministério Público e órgãos de defesa dos direitos humanos também estiveram presentes ao debate.

 

O autor do requerimento que motivou a audiência, deputado Rogério Correia (PT), lembrou que, no dia 20 de novembro de 2004, o empresário e latifundiário Adriano Chafik, acompanhado de 15 pistoleiros, invadiu o acampamento, localizado na Fazenda Nova Alegria, matando cinco trabalhadores e ferindo outras 20 pessoas, entre elas uma criança. Ele exigiu a condenação dos criminosos, a indenização das famílias e a regularização da terra, que já teria sido contemplada em decreto do ex-presidente Lula.

 

“Os tiros foram à queima-roupa, com a intenção de execução e, após o crime, foi colocado fogo nos barracos. As ameaças aconteciam desde 2002 e, apesar de várias queixas registradas, nada foi feito para impedir o fato”, lamentou. Rogério Correia afirmou que os acusados estão em liberdade e que o julgamento acontece no dia 17 de janeiro de 2013. “Conseguimos transferir o júri para Belo Horizonte para que se evitasse a influência política do empresário no Vale do Jequitinhonha”, completou.

 

O deputado Durval Ângelo (PT) também recordou que, há oito anos, encontrou, em Felisbusgo, um triste espetáculo, retrato de uma tragédia anunciada. Segundo ele, foram pedidas providências às autoridades com relação às ameaças do fazendeiro Adriano Chafik. “Ainda assim, foram arquivados processos contra os policiais que deveriam ter evitado o ocorrido. A ocupação se deu apenas com o objetivo de pressionar o Governo do Estado e a União para a desapropriação da terra, que era devoluta”, salientou.

 

A presidenta da CUT-MG, Beatriz Cerqueira, criticou a política que o Estado e a União tem dado aos jovens e à reforma agrária. Para ela, nenhum país tem condições de se desenvolver sem dar atenção e prioridade a estes dois pontos. Ela lembrou que Minas Gerais não investe praticamente nada em reforma agrária, por isso, motiva a resolução do problema na base do conflito. “Um Estado que não dá valor a esse grave problema está provocando chacinas como a de Felisburgo”, disse.

 

Beatriz Cerqueira acrescentou que os conflitos agrários são consequência da criminalização dos movimentos por parte do governo do Estado. “A criminalização dos movimentos sociais é real e concreta em Minas Gerais. O governo do Estado prefere tratar os problemas sociais como caso de polícia. O assassinato dos trabalhadores do campo não é problema apenas do MST, é de toda a sociedade”, enfatizou.

 

Segundo a presidenta da CUT-MG, o Mapa da Exclusão Social, elaborado pelo IBGE, aponta que entre os 19 milhões de mineiros, 3 milhões estão socialmente excluídos. “O orçamento e as políticas do Estado não promovem a inclusão social. Cerca 17,7% da população do campo não tem acesso à educação.”

 

Para Beatriz Cerqueira, os movimentos sociais têm como desafio não só sensibilizar a sociedade, mas também os veículos de comunicação para a violência no campo e a reforma agrária. “Nosso desafio é dialogar com os veículos de comunicação, que neste momento priorizam o julgamento de uma celebridade acusada de matar uma ex-amante. Veremos se esta mídia dará o mesmo tratamento ao júri do Massacre de Felisburgo, se vão entrevistar as pessoas comuns, que sobreviveram à chacina.”

 

Beatriz Cerqueira reiterou o apoio da Central à luta dos trabalhadores rurais sem terra. “A CUT está junto com o MST na perspectiva de que haja punição em janeiro, todos precisam pagar quando tiram a vida de alguém, seja de uma modelo, seja de quem é morto na luta pela reforma agrária. Me perguntaram porque a CUT está apoiando o MST nesta luta. Isso é óbvio. A CUT sempre está do lado da classe trabalhadora. Onde houver injustiça social, a CUT estará presente. Nenhuma sociedade se desenvolve com a violência e sem reforma agrária.”

 

Desocupações violentas

Membro do acampamento Terra Prometida, Maria Gomes Soares, destacou que o que aconteceu em 2004 é reflexo da política dos “coronéis” na região. De acordo com ela, a fazenda teria sido adquirida há muitos anos, por meio da expulsão e morte de outros posseiros. “O que Adriano Chafik fez é uma tradição da família de tirar as pessoas da terra à bala. Até hoje não houve indenização e estamos sujeitos a todos os tipos de impunidade”, afirmou. Ela lembrou, ainda, que cerca de um mês antes do massacre, os delegados da região foram avisados e nada foi feito. “As mesmas ameaças da época, acontecem hoje. Pode haver novas chacinas e despejos de terras que já foram concedidas pelo Governo Federal se nada for feito”, alertou.

 

“Nós não vamos desistir. Só saio de lá se for arrastada, se for morta. O sangue de nossos companheiros não foi derramado em vão. Vivos nós não vamos sair. A polícia só nos tira mortos. Melhor a gente morrer na luta, do que morrer de fome”, afirmou Maria Gomes Soares.

 

O procurador de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Conflitos Agrários do Ministério Público, Afonso Henrique de Miranda Teixeira, reforçou que além dos cinco mortos, ocorreram 12 tentativas de homicídio em Felisburgo. Em sua participação, ele explicou como se dará o julgamento da ação penal, em janeiro do próximo ano, e alertou que é preciso que se tomem providências a respeito de ameaças atuais, uma vez que a situação deverá ficar mais tensa em virtude da aproximação do julgamento.

 

Morosidade

O representante do setor de Direitos Humanos do MST, Aton Fon Filho, criticou a organização do Poder Judiciário, que torna lento o processo de julgamento dos criminosos. Para ele, há uma legislação que beneficia os latifundiários e os mais ricos. O membro da Arquidiocese de Montes Claros, Alvimar Ribeiro dos Santos, reforçou as palavras de Aton, e pediu que os movimentos sociais aumentem a pressão sobre o Poder Público para que a justiça seja feita.

 

Renato Barros, da direção do Sind-Saúde e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS), comparou o sofrimento dos trabalhadores do campo ao massacre que sofrem os servidores e servidoras da saúde em Minas Gerais. “Desejamos que no dia 17 de janeiro os responsáveis pelo massacre sejam condenados. Somos solidários com o MST e temos a responsabilidade de fazer uma discussão conjunta da classe trabalhadora no Estado. Sofremos o assédio moral, o corte de ponto e com a falta de segurança. Fizemos denúncias e não obtivemos respostas. Recentemente, um homem tomou o revólver de um segurança no Galba Veloso e colocou em risco os servidores. O Estado não nos dá segurança”, denunciou.

 

O presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Conedh), Emílcio José Lacerda, também ponderou que os trabalhadores sem terra de Felisburgo foram vitimas de exclusão, antes de serem massacrados em 2004. Para ele, é preciso defender a reforma agrária e clamar para que as condenações de crimes como o de 2004 sejam exemplares.

 

União

O deputado Adelmo Carneiro Leão (PT) defendeu que o movimento social precisa estar mais unido para reforçar a luta pela reforma agrária. Para ele, a justiça brasileira usa sua força para sustentar o poder dos mais ricos e punir os mais pobres. “Temos que buscar o assentamento com condições para que os trabalhadores possam produzir e viver com dignidade”, salientou.

 

O deputado federal Padre João (PT-MG) afirmou que há muito esforço a ser feito para que a reforma agrária seja prioridade, mas ponderou que está dando um voto de confiança ao Governo Federal para que isso aconteça ainda este ano. “O Judiciário tem sido o maior entrave para mudar essa realidade e Felisburgo é exemplo disso. São milhares de terras devolutas em Minas Gerais, mas existe um aparato do Estado para garantir que este locais sejam encaminhados para empresários de monocultura”, criticou.

 

Ao final, o superintendente regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Carlos Alberto Menezes de Calazans, disse compartilhar os sonhos e desejos de milhares de pessoas pela reforma agrária, mas ponderou que o desafio é grande, já que o Poder Judiciário é moroso e atende a interesses dos grandes empresários e latifundiários. “O massacre de Felisburgo e o de Unaí, que vitimou quatro servidores públicos, ambos em 2004, continuam impunes e isso é o mais grave. Os acusados são fazendeiros, por isso vemos tanta demora nos julgamentos”, finalizou.

 

Providências

O deputado Durval Ângelo afirmou que a Comissão de Direitos Humanos vai mandar as notas taquigráficas da reunião à Secretaria de Estado de Defesa Social, pedindo garantias de segurança no acampamento; ao juizes da varas agrárias estadual e federal; ao Ministério de Desenvolvimento Agrário, com pedido para seja feito novo decreto, com base na Lei Federal 4.132/61, que trata da desapropriações em Felisburgo; realizar uma audiência pública para debater as varas agrárias; e pedir para que a TV Assembleia faça a cobertura do julgamento do dia 17 de janeiro e produza reportagem sobre a chacina de Felisburgo.