Escrito por: Luiz Carvalho, do Rio de Janeiro

CUT na Rio+20: Ensine seu filho que a...

Evento sobre consumismo infantil fez parte da Cúpula dos Povos

 


Diante de um auditório do Sindicato dos Engenheiros do Estado do Rio de Janeiro completamente lotado, o Frei Betto avisou: é fundamental que a família e a escola apresentem às crianças referências de admiração que não sejam aquelas mesmas apresentadas pela TV.

A observação fez parte da palestra organizada pelo Instituto Alana sobre infância, ética e valores, que o escritor, frade dominicano e pilar da luta contra a ditadura no Brasil comandou na tarde dessa quarta-feira (21).

O evento fez parte da programação da Cúpula dos Povos e destacou os pilares que sustentam o consumismo infantil, além das consequências dessa forma de controle sobre as crianças.

Betto iniciou apontando qual o caminho para tornar uma criança consumista. Segundo ele, o primeiro passo é destruir o caráter sonhador, substituindo pela erotização precoce. “Se vocês prestarem atenção, as crianças de quatro, cinco anos, já prestam atenção demasiada no próprio corpo e já apresentam um grande salto para o consumismo: começam a se pintar, exigir produtos, marcas e grifes. Assim, o que deveria acontecer na cabeça aos sete, começa aos três. Está biologicamente infantil, mas psicologicamente adulta.”

Com isso, explicou, há a transferência do universo onírico para a televisão, que passa a sonhar pelo pequeno telespectador. Isso faz com que a infância seja excessivamente solitária, já que na TV prevalece o processo do monólogo, não há interação.

Frei Betto também ressaltou que a obsesidade infantil e a banalização da agressão e da violência são outros resultados da pressão dos meios de comunicação sobre as crianças..

O processo – Domesticada a se tornar consumista precocemente, Frei Betto explicou que a criança passa a ter medo de entrar no mundo real e se sente muito vulnerável porque não esgotou o universo onírico. “Essa é a candidata ideal às drogas”, defendeu.

Nesse processo, ressalta, o valor é atribuído aos objetivos e dão vazão a uma frustração muito difícil de ser sanada, quando não é possível ter acesso a um produto. Aí começam os conflitos entre o desejado e o não alcançado. “Na minha geração não tínhamos tanto dependentes porque éramos viciados em utopia”, comentou, ao abordar a importância de manter os sonhos vivos na mente das crianças.

A publicidade, por sua vez, joga do outro lado, minando a autoestima. “Ficamos o tempo todo ouvindo que somos uns merdas porque não fizemos a viagem, porque não temos o carro, porque não compramos a bebida”, explica.

Ele define esse mecanismo como hipnose coletiva. “No início, a TV emitia cultura e logo percebeu que isso não atraia tanto público. Daí, descobriu que o negócio é o entretenimento, que não toca a consciência, como a cultura, mas os sentidos.”

O que fazer

Como em outros debates nas tendas da cúpula, no Aterro do Flamengo, Frei Betto destacou que não há outra saída a não ser lutar pela mudança de paradigma da sociedade, nocivo à felicidade humana. Um processo que envolve muitas dificuldades.

“É uma dura batalha árdua, eles querem formar consumistas, nós queremos formar cidadãos. Chegamos ao ponto em que, ao invés de levar a um parque, aos finais de semana os pais levam ao shopping. Para a pós-modernidade, fundada no Mercado, os únicos valores são pecuniários”.

O Estado, por sua vez, deve promover a regulamentação da publicidade infantil, como forma de combater a exploração do consumismo sobre um público ainda em formação. Medida que países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e Alemanha já adotaram e que é fundamental ao desenvolvimento sustentável por definir uma nova forma de produção e consumo

Globalização da solidariedade

Para Betto, a saída à essa forma de opressão é a organização e o debate coletivo. “O que faz uma pessoa se sentir bem é o sentido, que imprime em seu caminho, o seu valor. E quem incute esses valores são a família, a religião, a escola e o Estado. Acontece que a pressão da mídia, o primeiro poder, influi nesses quatro. Por isso, precisamos estar enturmados para ter pensamento crítico. Isolado a gente vira presa fácil da proposta do Estado”, definiu, apontando a importância de organizações como sindicatos.

Sobre a escola, Frei Betto acredita ainda a publicidade deveria ser discutida nas salas de aula. E, para os pais, ele alerta sobre a necessidade de fortalecerem princípios que estabeleçam metas ancoradas em grandes sonhos.

“É preciso resistir para não trocar os sonhos por desejos palpáveis. É preciso não ficar indiferente aos milhões que não tiveram a mesma sorte biológica que nós e compõem a imensa maioria de pobres. E é preciso incutir no seu filho que a humanidade só pode ser feliz se todos forem felizes. Temos que curtir a globalização da solidariedade.”