CUT repudia Itaú por considerar cliente culpada pelo próprio estupro e roubo
Mulher conseguiu indenização na Justiça de São Paulo após o banco alegar que a vítima foi violentada e roubada por não estar acompanhada do namorado
Publicado: 02 Março, 2018 - 16h41 | Última modificação: 02 Março, 2018 - 17h35
Escrito por: CUT Nacional
A Secretaria Nacional da Mulher Trabalhadora da CUT se solidariza com a cliente do Banco Itaú, vítima de roubo e estupro após sequestro relâmpago, que conseguiu uma indenização na Justiça depois de solicitar reembolso do valor roubado e ser acusada pelos defensores da instituição de imprudência por ter saído sozinha, sem o namorado.
Para a CUT, a atitude dos advogados do banco Itaú ao afirmar que a mulher foi “imprudente” e, portanto, “culpada”, quando na verdade é vítima, reforça o preconceito e a misoginia. Julgar uma mulher estuprada como se a culpa fosse dela potencializa e fortalece a naturalização da violência contra a mulher e a cultura do estupro.
“No mês em que são lembradas as lutas das mulheres, somos violentadas mais uma vez por esse sistema financeiro que visa somente o lucro e, que sequer tem a dignidade de se solidarizar com um ser humano”, diz Junéia Batista, secretária Nacional da Mulher Trabalhadora, da CUT.
Segundo Junéia. “a atitude do banco reforça a ideia de que a mulher só pode sair acompanhada de um homem. Isto é inadmissível”!
O caso
A cliente do Banco Itaú conseguiu na Justiça uma indenização de R$ 9.370,00 após sofrer um sequestro relâmpago, seguido de estupro e roubo.
A mulher havia pedido o reembolso do valor sacado pelos bandidos, de apenas R$ 628,40. No entanto, o banco sustentou que o crime ocorreu por imprudência da vítima que saiu sozinha, sem o namorado.
Para o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), José Luiz de Jesus Vieira, a atitude do banco e de seus representantes é de um “absurdo incomensurável”.
Em sua decisão ele diz, entre outras coisas, que além de demonstrarem uma imensa dissonância cognitiva, para dizer o mínimo, a eventual presença do namorado em nada garantiria que os crimes não seriam praticados. Para o desembargador, “em muitos casos, o estupro ocorre na frente do namorado, como forma de afronta e humilhação, que quando tenta defender a vítima não raro é morto e em alguns casos também violentado a fim de ser ainda mais humilhado pelos algozes delinquentes”.
E segue afirmando: “o que se esperaria de uma sociedade minimamente civilizada é que os prepostos de uma instituição financeira do porte do Itaú Unibanco S/A tivessem um mínimo de discernimento para analisar o caso com alguma razoabilidade, verificassem as circunstâncias em que sua cliente teve sua conta acessada indevidamente pelos criminosos, que retiraram parte do numerário guardado no banco, e providenciassem administrativamente o ressarcimento“.
A violência contra a mulher no Brasil
No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, são cometidos por dia 10 estupros coletivos, inclusive de crianças e adolescentes. Em 2017, as mulheres de 16 a 24 anos foram as maiores vítimas: 45%.
Só no Estado de São Paulo, uma a cada quatro mulheres são assassinadas por seus companheiros dentro de casa. Em 2011 e 2016, as notificações de estupros subiram de 1570 para 3525. Números, que segundo o Ministério da Saúde, podem ser maiores já que apenas 30% dos casos são notificados.
Outro lado
Em nota, o Itaú afirmou que “errou ao deixar que esse caso chegasse à esfera judicial, sem uma solução imediata no primeiro contato da cliente”.
Segundo a nota, “o discurso utilizado pelo escritório de advocacia contratado afronta os nossos princípios e valores éticos, que exigem respeito e empatia com situações de vulnerabilidade“.
Na nota, o banco se comprometeu “a revisitar seus processos internos e seus procedimentos com prestadores de serviço para que situações desse tipo não voltem a ocorrer”.
A nota diz, ainda, que “o banco cumprirá integralmente a decisão da Justiça, indenizando a cliente”, e pede desculpas: “Pedimos desculpas à nossa cliente, a todas as mulheres e à sociedade em geral”.