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Decreto de Bolsonaro enfraquece fiscalização de frigoríficos

Medida pode piorar qualidade do produto nos mercados interno e externo

Publicado: 22 Julho, 2020 - 11h48

Escrito por: Nara Lacerda Brasil de Fato | São Paulo (SP)

Ministério Público do Trabalho/RS
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A fiscalização de frigoríficos brasileiros foi modificada por um decreto do governo de Jair Bolsonaro, que abre a possibilidade de terceirização do serviço. Antes da nova determinação, a vigilância era feita obrigatoriamente por auditores fiscais públicos e concursados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Agora, será possível contratar profissionais temporários e até mesmo de forma autônoma.

Esses auditores são responsáveis por acompanhar todos os processos do setor, da chegada dos animais ao despacho do produto final e emissão de certificados. A justificativa para a mudança na contratação é a pressão do próprio setor, que alega impossibilidade de aumento na produção frente ao número insuficiente de fiscais.

Os servidores, no entanto, apontam que a nova forma de atuação vai enfraquecer a fiscalização e causar consequências na qualidade do produto e na saúde pública. A medida também podem prejudicar a qualidade da produção brasileira e gerar dúvidas quanto a qualidade e a segurança dos produtos em países importadores.

Em transmissão online para debater o assunto, o consultor do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical) Luiz Alberto dos Santos, afirma que o decreto reforça as tentativas de diminuir a presença do estado no setor privado.

“Esse decreto tem uma perspectiva de consolidar um modelo de privatizar ou aproximar da esfera privada a inspeção agropecuária. Até mesmo descaracterizando essa função como uma função exclusiva de estado, por meio de artifícios interpretativos, atendendo assim a uma pressão do próprio mercado, a uma pressão do agronegócio, particularmente do setor exportador, que não quer depender da atuação do estado para poder colocar seu produtos no mercado", afirma Santos.

"Com isso desprezando a própria função estratégica da fiscalização agropecuária como instrumento de defesa da saúde pública”, completa ele.

Guilherme Coda, dirigente da Anffa Sindical, explica que há déficit no quadro de auditores frente à abertura de novas indústrias e aumento na exportação. Ele ressalta que o papel do estado nesse cenário seria a realização de novos concursos.

Mas nos últimos anos, diversos estados passaram a atender à demanda, sem necessariamente a presença das equipes do Ministério da Agricultura.

Segundo Coda, as contratações temporárias e precárias já eram realidade e em alguns casos e há até mesmo situações em que as próprias indústrias frigoríficas pagavam pelo serviço de médicos veterinários que faziam a fiscalização, em acordos com cooperativas de trabalho. Esses modelos de atuação começaram a ser questionados por tribunais de conta e Ministério Público. 

“Ficou constatado que esses profissionais em muitos casos eram remunerados indiretamente pelo próprio interessado para fiscalizar, o que é uma função do estado. O servidor tem que estar investido de poder de polícia, deve ser um agente público. Não pode ter um contrato que o deixa vulnerável ao tomar alguma medida, um auto de infração, uma interdição, uma apreensão de produtos”, afirma Coda. 

O dirigente sindical afirma ainda que um profissional não concursado pode ser pressionado “O grande problema é que um servidor, ao tomar uma medida, sofre muitas pressões. Um profissional contratado fica muito vulnerável. Até porque o contrato dele é temporário, ele não tem garantias de estabilidade " explica Coda.

O conflito de interesse também é outro problema aprontado: "ele pode ser contratado pela própria empresa, inclusive já pode ter sido seu funcionário. Nos municípios, há poucos profissionais disponíveis. Ele pode estar trabalhando com perspectiva de ser contratado, de se tornar um diretor dentro da própria empresa. Então é importante que o servidor que esteja ali seja um agente público.”

O decreto do governo de Jair Bolsonaro prevê ainda a possibilidade de criação de serviços sociais autônomos para fazer as contratações, sem autorização do Congresso Nacional, o que fere a Constituição. Na semana passada, o deputado federal Carlos Veras (PT), protocolou um Projeto de Decreto Legislativo para tentar sustar os efeitos do texto do governo federal.