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Denúncia contra Glenn é inepta e autoritária, diz criminalista

Associação Brasileira de Juristas pela Democracia protocola na PGR uma representação contra o procurador Wellington Oliveira e aponta ”desvio de conduta"

Publicado: 23 Janeiro, 2020 - 10h15 | Última modificação: 23 Janeiro, 2020 - 10h19

Escrito por: Eduardo Maretti, da RBA

VINICIUS LOURES/CÂMARA DOS DEPUTADOS
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A denúncia assinada pelo procurador da República Wellington Divino Marques de Oliveira contra o jornalista Glenn Greenwald, por crimes relacionados à invasão de celulares de autoridades, “parece completamente inepta e autoritária, porque o ministro Gilmar Mendes já tinha proferido uma decisão proibindo a investigação dele”. Para o advogado criminalista Leonardo Yarochewsky, a atitude do procurador “parece uma tentativa de driblar a decisão do Supremo”.

A situação poderia ser juridicamente absurda? “É, mas a gente vive no país do absurdo”, diz Yarochewsky. “Glenn não foi alvo da investigação, porque havia sido proibida pelo ministro Gilmar Mendes. A denúncia me parece uma coisa teratológica (anômala, anormal). O contexto vai contra os princípios mínimos do Direito penal e do processo penal.”

Mais do que isso, observa o advogado, atenta contra a Constituição, que assegura a liberdade de imprensa e o direito à informação. “Como disse a ministra Cármen Lúcia no passado, ‘cala a boca já morreu’. Não houve por parte do jornalista nenhum crime, nada que possa caracterizar uma conduta criminosa.”

Em junho de 2015, o Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, autorizou as biografias não autorizadas, em julgamento em que a liberdade de expressão era o tema principal. Na ocasião, relatora do caso, Cármen Lúcia usou a expressão “cala a boca já morreu”, para justificar seu voto.

A questão é saber se a denúncia contra Glenn terá vida curta. “Espero que tenha, que essa denúncia não seja recebida pela Justiça Federal de Brasília e que prevaleça a justiça, a Constituição da República e os princípios fundamentais que norteiam a democracia”, diz Yarochewsky.

Mesmo parecendo óbvio que prevaleça a decisão cabal do ministro Gilmar Mendes, de agosto de 2019, proibindo investigação do jornalista cofundador do site The Intercept Brasil, Yarochewsky é cauteloso. “Vamos aguardar os passos. O próximo é verificar se a Justiça Federal vai receber ou não a denúncia.”

Na decisão, Gilmar Mendes argumentou que a liberdade de expressão garante o direito de obter, produzir e divulgar fatos e notícias por quaisquer meios e anotou: “O sigilo constitucional da fonte jornalística impossibilita que o Estado utilize medidas coercivas para constranger a atuação profissional e devassar a forma de recepção e transmissão daquilo que é trazido a conhecimento público.”

O novo caso pode chegar ao STF. Mas a defesa de Glenn não deve recorrer ao Supremo no momento, segundo a coluna Painel da Folha de S. Paulo. Como o tribunal está em recesso, o ministro de plantão é Luiz Fux, considerado “lavajatista”. Os advogados do jornalista trabalhariam com a estratégia de esperar a volta do relator do caso, Gilmar Mendes, ou mesmo trabalhar pela derrubada da denúncia na primeira instância, de acordo com o jornal.

Representação na PGR

A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) protocolou, nesta quarta-feira (22), na Procuradoria Geral da República (PGR), uma representação contra o procurador Wellington Divino Marques de Oliveira, pedindo seu enquadramento por evidente “prática de abuso de autoridade” na denúncia contra Glenn.

O ato de Oliveira “tenta criminalizar a livre manifestação do pensamento e a divulgação de informações, atingindo em cheio o direito fundamental à liberdade de expressão, liberdade de informação e liberdade de imprensa”, aponta a ABJD.

Para a entidade, o procurador deu “vazão à sua posição político-ideológica” e, assim, agride a Lei 13.869/2019, “com evidente abuso de autoridade”. Oliveira tem revelado uma conduta contra cidadãos “que atuam dentro dos limites da democracia, mas que conflitam com o pensamento de autoridades com as quais o procurador possui afinidade ideológica”, diz a ABDJ, para a qual o ato do procurador configura “um desvio de conduta inaceitável”.

O procurador Oliveira é o mesmo que denunciou o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, por calúnia contra o ministro Sergio Moro.

Em entrevista à Rádio Brasil Atual, a presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Maria José Braga, afirmou que a “preocupante” ação do procurador “é uma tentativa de intimidação do jornalista e de restrição do trabalho da imprensa”.

Para ela, desde que o Intercept Brasil passou a divulgar as conversas do ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sergio Moro, e procuradores, “começou a haver perseguição ao jornalista”. Estão em jogo, no caso, o princípio constitucional da liberdade de imprensa e o sigilo da fonte, observou a dirigente.