Escrito por: Redação CUT

Depois da vitória de Bolsonaro, indígenas denunciam ataques em MS e PE

Os ataques ocorreram na madrugada de segunda-feira (29). Foram usados armas de fogo e balas de borracha, e uma escola e um posto de saúde foram incendiados

Reprodução Facebook
Escola da terra indígena dos Pankararus, localizada no município de Jatobá, foi destruída

Foram registrados pelo menos dois ataques a comunidades indígenas em Mato Grosso do Sul e em Pernambuco, após o resultado das eleições, que elegeu como presidente da República Jair Bolsonaro (PSL), um crítico aos direitos dos índios, como a demarcação para reserva, e que prometeu acabar com o que chamou de “ativismo ambiental xiita”.

Os ataques às comunidades indígenas foram confirmados pelas autoridades e pela Fundação Nacional do Índio (Funai). O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) recebeu relatos de duas ações violentas em Mato Grosso do Sul, onde os índios foram atacados com armas de fogo, que Bolsonaro defende liberar para toda a população, e balas de borracha. Além disso, atearam fogo em uma escola e um posto de saúde. Não há registros de mortes, mas de feridos.

De acordo com os relatos, os ataques ocorreram na madrugada de segunda-feira (29). O caso mais violento, confirmado pela Funai, foi contra moradores da aldeia Bororó, uma das várias existentes no interior da Reserva Indígena Dourados, no município de Dourados, em Mato Grosso do Sul. Localizada no perímetro urbano, a Reserva é a área indígena de maior concentração populacional étnica do País, com cerca de 13 mil habitantes distribuídos por uma área de cerca de 3 mil hectares (cada hectare corresponde às medidas aproximadas de um campo de futebol oficial).

Índios guarani-kaiowá da aldeia Bororó relataram a missionários do Cimi que foram surpreendidos durante a madrugada pelo ataque de agressores que se aproximaram da aldeia em caminhonetes e com um trator. Alguns deles dispararam contra o grupo.

Além de pelo menos quatro feridos com balas de borracha, dois jovens foram atingidos por projéteis de armas de fogo. Uma das vítimas, que levou um tiro na perna, foi atendida no Hospital da Vida e já teve alta. Por medo, um outro indígena também baleado na perna não quis ser socorrido fora da aldeia e, de acordo com um missionário do Cimi, continuava com a bala alojada até a tarde de ontem.

A secretaria estadual de Justiça e Segurança Pública informou que a Polícia Civil instaurou procedimento para apurar o caso, mas, segundo informações concedidas à Agência Brasil, “as informações preliminares dão conta de que houve um possível conflito entre indígenas”. No entanto, missionários do Cimi que pediram para não ter seus nomes divulgados por questões de segurança pessoal classificaram a manifestação como “precipitada”.

“Ela [a secretaria] não leva em conta a complexidade da situação local, inclusive a situação de vulnerabilidade das comunidades que vivem na área e em seu entorno. Uma situação que obriga muitos índios a se sujeitarem a interesses maiores”, comentou um dos missionários do Cimi à Agência Brasil, lembrando que muitos índios trabalham para fazendeiros da região. Segundo os missionários, isso acontece porque o “confinamento” das comunidades em meio à área urbana e áreas de plantio as impede de desenvolver atividades tradicionais necessárias à manutenção de seu crescimento populacional.

“Parte deste conflito interno se deve à grave situação local, uma situação de crise humanitária. Houve um ataque, pessoas foram baleadas e quem os atacou deve ser identificado e levado à Justiça. O risco é considerar isso única e exclusivamente como um conflito interno, como já aconteceu antes”, destacou um dos missionários, revelando que, há cerca de um mês, a mesma aldeia já tinha sido atacada. Parte das fotos que circularam nas redes sociais nas últimas horas são do ataque anterior, segundo este missionário.

Ainda no Mato Grosso do Sul, o acampamento Sebastião Bilhar, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), localizado às margens da BR-262, próximo a Dois Irmãos do Buriti, no Mato Grosso do Sul, foi alvo de incêndio criminoso.

Na noite de sábado (27), homens em uma caminhonete atacaram o acampamento aos gritos do nome de Bolsonaro. Um dos barracos foi incendiado pelos agressores. Apesar da grande perda material, os moradores conseguiram conter as chamas e ninguém se feriu. Com 240 famílias, o acampamento foi criado em julho do ano passado. 

DivulgaçãoAcampamento Sebastião Bilhar, com 240 famílias, foi destruído pelo fogo

"Bárbarie"

Em Pernambuco, uma escola e um Posto de Saúde da Família de uma aldeia foram incendiados na madrugada de ontem. Os dois prédios públicos funcionavam na aldeia Bem Querer de Baixo, uma área de conflito entre índios e posseiros não-índios no interior da Terra Indígena dos Pankararus, localizada no município de Jatobá.

Segundo a comunidade, o fogo destruiu documentos, equipamentos e comprometeu quase que integralmente a estrutura das duas construções. A equipe médica do posto de saúde fazia cerca de 500 atendimentos mensais.

“Pouca coisa se salvou”, informam representantes da comunidade em uma página na internet, pedindo investigação e punição aos responsáveis. “O momento pede cautela e calma. As investigações estão acontecendo, o local foi isolado pela polícia e, em breve, teremos mais notícias.”

Em nota, a prefeitura de Jatobá confirma que os prédios foram "praticamente 100% destruídos e o prejuízo é incalculável". E acrescenta que o "ato de vandalismo criminoso" prejudica toda a comunidade, "que ficará carente por vários meses, sem atendimento médico e escolar". As polícias Militar e Civil foram acionadas e a Polícia Científica inspecionava a área no início da tarde.

Intimidação

Ainda de acordo com os missionários do Cimi, índios de outras duas comunidades de Mato Grosso do Sul denunciaram ter sido alvo de ações intimidatórias no fim de semana. Em Caarapó, no sudoeste do estado, os indígenas afirmam ter presenciado caminhonetes rondando a terra indígena com homens exibindo armas e gritando, o que os levou a acionar a Funai e o Cimi.

A área de Caarapó reivindicada pelos indígenas está em disputa há anos. Em 2016, cerca de 300 índios ocuparam uma área de 490 hectares que afirmam ter pertencido aos seus antepassados. Dias depois, homens armados e encapuzados atacaram o local e incendiaram todos os pertences indígenas. Um índio morreu, cinco foram baleados e ao menos outros seis foram feridos. Procurada, a Funai informou não ter registro do ataque.

O segundo caso divulgado pelo Cimi teria ocorrido em Miranda, na aldeia Passarinho, uma das existentes no interior da Terra Indígena Pilad Rebua. A Funai também disse não ter sido comunicada a respeito.

 

*Com informações Agência Brasil e Observatório do Agronegócio no Brasil