Escrito por: André Accarini, Isaias Dalle e Luiz Carvalho
A dois dias da greve, coordenador da Federação dos Petroleiros ressalta que governo precisa assumir papel estratégico da estatal para economia
Nada de aumento salarial, participação nos lucros ou aumento de benefícios. A 5ª Plenária Nacional da Federação Única dos Petroleiros (FUP), que define a pauta de reivindicações da categoria, tirou como eixo central a defesa da Petrobras e deixou de lado a pauta meramente corporativa.
A decisão incomum demonstra o compromisso com os trabalhadores e o quanto a federação confia no poder de recuperação da estatal que exerce papel fundamental para a economia brasileira.
Porém, conforme destaca o Coordenador da FUP, José Maria Rangel, a estatal precisa também acreditar nisso. “O cara tem que ter firmeza, tem que chegar lá e dizer que a Petrobrás está preparada e tem competência para isso”, disse, referindo-se à postura dos diretores da empresa. Como diz a máxima popular, ajude-me a te ajudar.
Rangel destaca que essa firmeza é fundamental para combater o projeto do senador José Serra (PSDB-SP), que propõe a retirada da companhia como operadora única do pré-sal, e motivará uma greve de 24 horas que os petroleiros realizam nesta sexta-feira (24).
Em entrevista ao Portal da CUT, Rangel defende ainda a retomada dos investimentos pela empresa, ameaçados pelo plano de ajustes do governo federal, e explica como essa manutenção pode representar ao Brasil um papel de protagonista político.
Os petroleiros decidiram neste ano não brigar por uma pauta trabalhista e definiram propostas econômicas para fortalecer e defender a Petrobras dos efeitos negativos da investigação da Lava-Jato. Por quê?
José Maria Rangel – Tivemos a clareza de entender que no momento pelo qual passa nossa empresa, com milhares de trabalhadores e prestadores de serviço perdendo seus empregos, não seria justo da nossa parte travar a disputa olhando para o nosso umbigo e deixar de olhar para esses companheiros que também contribuem para fazer a grandeza da Petrobras. Partimos para a discussão de uma pauta política que visa, basicamente, a retomada dos investimentos contrapondo o recente plano de negócios que ela apresentou.
Isso significa que os trabalhadores vão abrir mão do aumento e das reivindicações neste ano ou esse é só o ponto de partida?
Rangel – É o ponto de partida. Colocamos essa pauta política como prioritária para a Petrobras na última quarta-feira (15 de agosto) e vamos retomar no início do mês de agosto a pauta corporativa. Todas as conquistas e avanços que tivemos nos últimos 12 anos, oito anos de governo Lula e quatro anos de governo Dilma, foram fruto de uma Petrobras pujante, que gerava emprego, gerava renda, investia R$ 300 milhões no país por dia, caminhava para ser uma das maiores empresas de energia do mundo. A gente tem muito claro isso. Para voltar a ter nossas conquistas e vantagens, temos que retomar essa caminhada da Petrobras e, obviamente, isso também obriga a olhar para o companheiro ao lado, o companheiro terceirizado e dizer que terá um emprego e como chegar ao final do mês e dar o sustento para sua família.
É incomum uma categoria se preocupar mais com os efeitos sobre toda a população do que propriamente com seus salários. Alguns diriam que é fraqueza, outros que é solidariedade. Como você definiria?
Rangel – Eu não teria coragem de olhar para meu companheiro terceirizado e ver no semblante dele a preocupação em ser demitido e eu ficar brigando por salário e vantagens. Não teria coragem de encarar esse companheiro, isso seria tudo, menos solidariedade de classe. Isso foi o que norteou nossos debates na 5ª Plenária da FUP. Temos uma máxima que diz, somos todos petroleiros, e as assembleias que fazemos em todo o país têm nos respaldado para isso, aprovado os indicativos e encaminhamentos que a FUP fez.
A pauta é ousada, mas nesse momento é a melhor atitude para sair dessa dificuldade que enfrentamentos. Estamos dispostos a ser ousados para reverter esse quadro que se apresenta em nosso país, em queda de investimento, dos abutres querendo abocanhar a Petrobras. Agora, é necessário também que a Petrobras tenha vontade para isso. Tenho participado de debates na Câmara dos Deputados e no Senado e os representantes da Petrobras que vão lá para falar sobre a Lei da Partilha ficam igual chuchu. Se você coloca camarão, o chuchu pega gosto de camarão, se você bota carne, pega gosto de carne. O cara tem que ter firmeza, tem que chegar lá e dizer que a Petrobras está preparada e tem competência para isso. Não ficar dizendo que vai cumprir a lei que for aprovada. Claro que terá de cumprir a lei, mas tem de assumir postura de empresa que alcançou destaque mundial não por acaso no segmento do petróleo.
A FUP apresentou ao governo uma pauta de reivindicações e vocês estão pedindo para que o Comperj (Complexo Petrolífero do Rio de Janeiro) seja concluído, o mesmo em relação à refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e que o governo também não pare as obras da indústria de fertilizantes para manter empregos. Qual a expectativa de vocês? Vão conseguir falar com a presidência da Petrobras e reverter essa decisão de cortar investimentos?
Rangel – Seguindo até a máxima da nossa Central, a gente vai mobilizar e negociar. Já estamos em um processo de mobilização nas bases da Federação Única dos Petroleiros, no próximo dia 24 faremos uma paralisação de 24 horas em todo o país contra plano de negócio da Petrobras. Fazendo um debate não só com os petroleiros, mas com a sociedade como um todo sobre quão pernicioso é o projeto do senador José Serra. Outra coisa é chegar até o governo. Já enviamos documentos para o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Já conversamos com o ministro Miguel Rossetto (Secretário-Geral da Presidência da República) para sermos recebidos pela presidenta Dilma e apresentarmos nossas propostas.
Temos propostas, queremos retomar as obras do Comperj sim, concluir Abreu e Lima, porque o Brasil vai continuar sendo importador de derivados se não concluir essas obras. Por mais que hoje o preço do derivado esteja baixo, o mercado de petróleo é uma coisa de maluco. Não é porque hoje está baixo que continuará o tempo todo. A Petrobras tem que concluir as obras também porque o custo de manutenção para que os equipamentos não se deteriorem é muito grande. Tem que concluir a obra da fábrica de fertilizantes que está 80% pronta no Mato Grosso do Sul. Tem que retomar obras nos estaleiros para construir plataformas para o pré-sal, navios para nossa frota. O governo é acionista majoritário na Petrobras, tudo que investir, receberá na frente em forma de dividendos. Tem que ter essa clareza e investir.
Temos propostas para que isso seja feito. Se o governo abre mão da sua parcela que vai para a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), deixará de receber por ano mais R$ 6 bilhões. Se você falar em quatro anos, que é o tempo de validade do plano de negócios da Petrobras, estamos falando em R$ 24 bilhões. E isso vai ter de volta. Para a Petrobras, neste momento, teria um impacto bastante positivo e seria uma demonstração do governo de que, de fato, quer ajudar a Petrobras o caminho dos investimentos.
Você diz que a Petrobras passa por um momento difícil, mas continua muito forte. O que observamos todos os dias e ouvimos nas rádios, assistimos na TV é a Petrobras associada a denúncias de corrupção. Você acredita que é possível fazer a investigação, punir os corruptos e, ao mesmo tempo, não prejudicar a empresa?
Rangel – Eu não tenho dúvida que a sociedade brasileira clama pela punição das pessoas que fizeram algum mal feito, desviaram recursos da companhia. Isso é uma coisa. A outra coisa é que a sociedade brasileira também clama para que a empresa não pare. Se você for analisar hoje, quem está pagando o preço por todas essas denúncias na companhia são os trabalhadores, que estão perdendo o emprego. Não tenho dúvidas em afirmar que tudo isso é uma estratégia muito bem montada para enfraquecer a empresa. Não é por acaso, por exemplo, que passado o período eleitoral, os senadores e deputados já entraram com um projeto para modificar a Lei da Partilha. E o ponto central é a fragilidade econômica da Petrobras, na visão deles. A mídia bombardeia a imagem da Petrobras e isso traz dificuldade em conseguir crédito. E na outra ponta você tem aqueles que sempre foram inimigos da empresa tentando mudar a lei que possibilita à empresa operar o pré-sal e ter, no mínimo, 30% de cada campo.