Escrito por: Walber Pinto
Em várias regiões do país, valor do botijão chega a R$ 120 - 12% do salário mínimo. Alta dos preços no governo Bolsonaro penaliza famílias brasileiras, que recorrem a opções que costumam causar acidentes
A disparada dos preços do botijão de gás em meio à pandemia do novo coronavírus, que agravou a crise econômica e aumentou as taxas de desemprego e de informais sem renda, está levando mais famílias brasileiras a cozinhar com carvão, álcool e no fogão à lenha, correndo os riscos de acidentes que essas opções costumam causar.
Enquanto as chances de conseguir uma recolocação ou até mesmo renda de bicos fica mais distante por falta de um projeto de governo e em consequência da desastrosa polícia econômica da dupla Jair Bolsonaro (ex-PSL)/Paul Guedes, ministro da Economia, em várias capitais do país, o valor do botijão chega a R$ 120, o que equivale a 12% do salário mínimo.
Temas como as disparadas dos preços dos alimentos e do gás de cozinha estão entre as pautas do 1º de Maio da CUT, que neste momento de drama social vai defender a redução do preço do gás de cozinha no Congresso Nacional.
O 1º de maio será um momento de reflexão e também de denúncia sobre a situação da classe trabalhadora brasileira e uma das principais preocupações dos trabalhadores e trabalhadoras do país neste momento é o custo absurdo do preço do gás, avalia Roni Barbosa, petroleiro e secretário nacional de Comunicação da CUT.
“Está inviabilizado para milhares de famílias brasileiras. Por isso, nesse 1º de Maio esse tema também será debatido. O Brasil tem que dá um jeito de abastecer as famílias brasileiras, que não seja obrigando-as a pagar esse valor absurdo, que muitos sequer têm”.
A situação piorou depois do golpe de 2016, que destituiu a presidenta Dilma Rousseff. Nos governos Lula e Dilma, a variação dos preços dos combustíveis seguia um cálculo baseado em vários fatores que possibilitava um controle maior dos preços. Depois do golpe, a gestão da Petrobras adotou a política chamada de PPI, ou Preço de Paridade de Importação, que nada mais é do que a paridade com os preços do mercado internacional.
Entre 2016 e 2019, houve um aumento de quase 30% no número de famílias que usam lenha ou carvão para cozinhar, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Há dois anos, uma em cada quatro famílias brasileiras usava lenha em algum momento para cozinhar seus alimentos. Por causa dos cortes no orçamento feitos pelo governo Bolsonaro, o IBGE não divulga esses indicadores há quase dois anos.
Mãe de seis filhos, a maranhense Lucenilce Ramos, 43 anos, da cidade de Cururupu, que fica a 220 km da capital São Luís, voltou a cozinhar no carvão devido ao aumento do preço do gás. Ela sustenta toda a família com apenas com R$ 300 do Bolsa Família. Lucenilce não foi contemplada pelo auxilio emergencial que Bolsonaro reduziu de R$ 600, sendo R$ 1.200 para mães solo, pagos no ano passado, para R$ 150 (pessoas que moram sozinhas), R$ 250 (famílias com mais de duas pessoas) e R$ 350 (mães solo), a partir de abril deste ano.
Segundo ela, o dinheiro que recebe não dá para quase nada. “A situação aqui em casa é crítica, com essa crise eu estou cozinhando no carvão porque meu gás acabou. Tem lugar aqui que o gás está 100 reais. Até procurei o preço dele esses dias e estava mais de 100 reais. Está difícil, ruim demais”, relata à reportagem do Portal CUT.
A alta dos preços do botijão de gás tem deixado mães e pais de famílias desalentados. Famílias de uma pessoa só, que tem acesso a apenas R$ 150 de auxílio emergencial, por exemplo, terão dinheiro apenas para comprar itens de higiene pessoal, que vai custar em média R$ 76,26 e limpeza da casa (R$ 46,81). Sobra apenas R$ 28,93, que dá para comprar um pacote de 5 quilos de arroz e menos de 1 quilo de feijão. Só para comprar alimentos básicos, como arroz, feijão, carne e outros 25 itens que entram na composição da cesta de comida, o valor ultrapassa os R$ 800.
Mesmo no Sudeste, onde historicamente o uso de lenha é mais raro, os dados do IBGE revelam que o aumento foi ainda maior, mais de 60% das famílias passaram a usar alternativas ao botijão de gás par a cozinhar.
Este é o caso da cabeleireira Antônia Ladislau dos Santos, 41 anos, mãe de duas crianças, que está desempregada e mora com seis pessoas, todos sem emprego nem renda. Antônia mora na periferia de Poá, na Grande São Paulo, e conta como ficou difícil a situação dentro de casa depois da pandemia.
“Fiquei um mês cozinhando com álcool. Fiz fogo a lenha no quintal e era onde eu cozinhava. Estou me alimentando porque ganho cestas básicas. A situação está difícil, eu não trabalho há mais de um ano. Recebi uma doação de um pouco de gás, agora estou cozinhando no fogão”.
No desgoverno de Jair Bolsonaro, é a mobilização social pelo país em busca comida para as pessoas em situação de vulnerabilidade social. Por todo o Brasil, nas comunidades e favelas, são as mulheres negras, chefes de cozinha, que se viram como podem para levar alimentos à família. A maioria delas depende de doações de cesta básicas.
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O drama de Antônia também se repete com sua amiga. “A minha dificuldade é a mesmo, quando o gás acaba aqui a gente também junta uns dinheirinhos e compra álcool para cozinhar”, afirma a diarista Edilene de Souza Lima, que quando trabalhava ganhava R$ 100 por dia.
Tanto Edilene como Antônia recebem doações de alimentos semanal da Coalizão Negra e da Uneafro.
Segundo Cloviomar Cararine Pereira, técnico do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) na subseção da Federação Única dos Petroleiros (FUP), o que está acontecendo com o preço do gás de cozinha é que a Petrobras, que produz o gás nas refinarias, tem adotado a paridade internacional na hora de reajustar.
“O que a Petrobras faz, a cada momento, é que ela olha lá fora como está a variação do preço. Olha o câmbio, quanto que está relação real e dólar, e ela olha custo de importação. Daí o valor que aparece para a Petrobras é a referência que ela usa para reajustar o gás”, diz
A Petrobras produz o gás, mas quando vai vender o produto, não vende pelo preço que custou para produzir e, sim, o preço de concorrência com alguém que está importando o gás de fora. Cloviomar Cararine Pereira- Cloviomar Cararine PereiraCom isso, os reajustes do gás de cozinha têm sido constantes, diz o técnico do Dieese. Em março do ano passado, o preço do botijão e gás era R$ 69, em média. Hoje já chega a R$ 120 em várias regiões do país, como Norte e Centro-Oeste.
A Petrobras usa a paridade internacional não só para reajustar os preços do gás de cozinha, mas também o diesel e todos os combustíveis.
A fome está piorando em 2021 com o agravamento da crise sanitária, a alta do desemprego, que atinge mais de 14,3 milhões de trabalhadores e trabalhadoras e a disparada dos preços dos alimentos, que veem subindo mais do que a inflação.
Em meio a esse caos, depois de três meses, o novo auxílio emergencial, que volta a ser pago, vai comprar apenas meio bife, meio copo de leite, três colheres de arroz, segundo o Dieese.
“A pobreza cresceu, a miséria cresceu, o desemprego cresceu e o gás deveria diminuir e não aumentar. Por isso, vamos debater esses temas importantes no 1º de Maio. Muitas famílias estão cozinhando seus alimentos em latinhas com álcool para fazer arroz para seus filhos”, finaliza Roni.