Escrito por: Redação CUT com informações de Comunidade Amazônica
Produção idealizada pelo Movimento em Defesa do Tocantins e da Vida revela os desafios enfrentados por comunidades ribeirinhas e a oposição ao projeto da hidrovia que ameaça o Rio Tocantins no Pará
O Movimento em Defesa do Rio Tocantins e da Vida lançará no próximo domingo (6), paralelamente ao evento Diálogos Amazônicos, parte integrante da Cúpula da Amazônia, um documentário que expõe os severos prejuízos ambientais e sociais que serão causados pelo projeto da Hidrovia Araguaia-Tocantins, caso seja construída.
A produção, fruto de uma caravana que percorreu 11 municípios ribeirinhos entre janeiro e fevereiro de 2022, tem como objetivo denunciar os riscos que a implantação desse megaprojeto representa para o segundo maior rio do Brasil, o Tocantins, e para a vida das populações que dele dependem.
O filme apresenta relatos de especialistas, pesquisadores, lideranças comunitárias, pescadores e moradores das regiões que seriam afetadas, denunciando a degradação dos modos de vida, da biodiversidade e dos recursos naturais que a hidrovia deve causar. Os depoimentos também abordam questões relativas à saúde pública, tratando de impactos do avanço de indústrias e empresas na região, resultando em doenças graves.
O evento será um momento de ampla discussão e conscientização sobre os riscos da hidrovia, buscando ampliar o debate e incentivar ações, além de ser uma oportunidade para compreender a luta em defesa do Rio Tocantins e dos povos da região. A entrada é gratuita e após a exibição, será realizado um debate sobre o tema. O lançamento será trannsmitido pelas páginas da Comunidade Amazônica no Facebook e no Instagram.
Nas redes sociais, a atriz Dira Paes fez um convite para o lançamento:
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Impressões
Para Carmen Foro, liderança histórica da região, ex-Secretária Geral da CUT Nacional, idealizadora da Caravana que originou o documentário, os desafios são inúmeros já que a comunidade terá sua vida profundamente afetada e “não sabe o que estão pensando para a vida delas”. Carmen reforça que as comunidades não são ouvidas sobre suas realidades e necessidades. “Quem decide sobre a vida delas não conversa com elas”, ela diz.
“Esse é o principal e maior desafio. Temos enfrentado isso incorporando outros atores neste diálogo: a universidade, que está estudando sobre isso, os grupos sociais que fazem estudos, buscando informação nos órgãos que estão tomando essa decisão. Então, tem sido esse o caminho que garante com que a população saiba um pouco mais”, detalha Carmen.
Ela destaca que, ao mesmo tempo, a comunidade entende muito mais sobre sustentabilidade e sobre a preservação dos recursos naturais daquela localidade.
“É uma estratégia permanente. A defesa, a resistência em preservar esse lugar de vida, de sustentabilidade, de cultura, de preservação para garantir com que tenha alimento, possibilidade de vida e de vida digna”, pontua.
O caminho é sempre a mobilização, a formação, o diálogo com os principais interessados, que são a população que vive à margem do rio secularmente. Esta é a estratégia mais eficaz- Carmen ForoDireitos humanos
Para a Secretária de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT Nacional, Jandyra Uehara, o lançamento do documentário é muito significativo. Ela considera que a luta em defesa do rio, da vida e das comunidades é uma síntese da luta pela preservação da Amazônia e do combate ao modelo predatório de desenvolvimento.
Com a implementação da hidrovia, a probabilidade é de que o plantio de soja e da agropecuária, modelos devastam locais de plantio e pasto, se expandam para a região.
“A hidrovia é um exemplo de grande empreendimento baseado em um modelo de desenvolvimento agroexportador que viola direitos humanos e precisa ser superado na região Amazônica. “Esta luta, portanto, é de resistência e a favor de um desenvolvimento que respeite os rios, a floresta, a fauna, a flora e os povos amazônicos”, diz a dirigente, complementando que o respeito se estende, principalmente, aos “direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais do povo que vive na região”.
A luta pela defesa do Rio Tocantins é uma luta pela preservação da Amazônia e pela vida de todos nós- Jandyra Uehara
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Luta histórica
A defesa do Rio Tocantins é permanente e já teve outros episódios como a construção da Hidrelétrica de Tucuruí. A presidenta da CUT-Pará, Euci Ana, conta que desde esse empreendimento, as populações tradicionais vêm resistindo e amargando os impactos irreparáveis para os territórios.
Ela destaca que a luta acumulou ‘bagagem’, ou seja, formação e informação sobre o rio e seus recursos que culminaram na realização da caravana em 2022.
“Fomo a 11 municípios conversar com as comunidades. Um dos maiores desafios é a ausência de escuta e a realização de consulta, pois os quilombolas, ribeirinhos, indígenas, agricultores e pescadores não foram ouvidos, como determina a convenção 169 da OIT [Organização Internacional do Trabalho].
Essa hidrovia não representa progresso para nós, mas sim destruição. E vamos resistir até o fim- Euci Ana
União de forças
As comunidades ribeirinhas, extrativistas e quilombolas, juntamente com movimentos sociais e movimento sindical como a CUT e sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras rurais do Sistema Contag e da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará (Fetagri), têm se organizado para resistir aos impactos do projeto.
Já foram realizados diversos seminários e discussões nas comunidades para conscientizar sobre os efeitos negativos da hidrovia. A caravana foi uma das ações em que a região foi percorrida para este diálogo e para questionar a compensação pelos danos causados.
Somos contra a hidrovia”, ressalta Ângela de Jesus, presidenta da Fetagri Pará. Ela afirma que a resistência é fundamental porque o propósito de transformar o Tocantins num canal de transporte de grãos já existe – e é uma ameaça – há anos.
“Essa rede para defender o rio e a vida existe porque o rio é importante para as pessoas que vivem naquele território, que faz parte da região amazônica e garante a segurança alimentar das pessoas”, diz a dirigente
O projeto da hidrovia altera todo o processo da biodiversidade e da segurança alimentar das pessoas que ali vivem. Ameaça a nossa segurança alimentar e nossa forma de vida. Vamos lutar até o fim- Ângela de Jesus
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Meio ambiente e os impactos da hidrovia
A hidrovia, se implementada, afetará as matas às margens do rio, perturbará o fluxo de peixes, pela movimentação das grandes barcaças e balsas ao longo rio e mudará os modos de vida das comunidades locais, como os ribeirinhos, as comunidades extrativistas, os quilombolas e os pescadores nos vários municípios da região como Baião, Mocajuba, Oeiras, Limoeiro do Ajuru, Cametá e Marabá.
Outro ponto do projeto que gera protestos é a derrocada do Pedral do Lourenção, formação geológica histórica, de cerca de 42 quilômetros, cuja implosão causará danos irreparáveis não somente à vida marinha na região, mas também às comunidades que vivem no entorno.
As compensações pelos impactos são limitadas e não resolvem os problemas a longo prazo, explica o professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), Doriedson Rodrigues.
“A região continuará com desigualdades sociais. Apesar da hidrelétrica iniciada ali na década de 1970 e finalizada na década de 1980, ainda temos a energia mais cara deste estado”, diz o professor.
O projeto da hidrovia não é do interesse da região, pois prejudica os modos de vida e a produção na Amazônia, priorizando o lucro econômico em detrimento do meio ambiente e da qualidade de vida das pessoas- Prof. Dorielson Rodrigues
Como resultado de projetos semelhantes no passado, como a hidrelétrica Tucuruí, “as comunidades atingidas foram obrigadas a se deslocar para as periferias das grandes cidades, sofrendo com condições precárias e marginalização social”, diz o integrante da Coordenação Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB),Yuri Paulino, que também fez parte da caravana em 2022.
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O projeto da Hidrovia Araguaia-Tocantins.
O projeto da hidrovia remonta à década de 1970, durante o período do regime militar no Brasil. A ideia de criar uma rota navegável ligando os rios Araguaia e Tocantins surgiu com o objetivo de impulsionar o desenvolvimento econômico da região norte do país, facilitando o transporte de cargas e fomentando a integração regional.
No entanto, o projeto foi pensado e construído de costas para a Amazônia, sem consultar os principais interessados numa mudança tão importante e estrutural: os povos que vivem e se mantém a partir do Rio Tocantins.
Além da resistência de movimentos populares, as obras da hidrovia também enfrentaram contestações jurídicas e protestos de ativistas ambientais. A regularização fundiária e a demarcação de terras tradicionais foram centrais nas discussões, já que uma vez que a expansão das áreas de propriedade dos latifundiários poderia levar ao deslocamento e desapropriação forçada das populações tradicionais que vivem às margens dos rios.
As críticas e os questionamentos levantados ao longo dos anos têm colocado em xeque a viabilidade e a sustentabilidade do projeto. Em determinados momentos, o projeto foi paralisado ou teve sua continuidade questionada por órgãos ambientais e pela sociedade civil.
Em 2020, por exemplo, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou a suspensão da licença prévia para o derrocamento do Pedral do Lourenço, alegando que o estudo de impactos ambientais realizado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) apresentava omissões e insuficiências de dados.
Onde e quando ver o documentário
O lançamento do documentário que denuncia estes e outros aspectos do projeto de construção da hidrovia será realizado no próximo domingo (6), às 18h30, no Hotel Princesa Louçã.
O evento conta com a participação de representantes dos movimentos que integram a luta em defesa do Tocantins, entre eles a CUT Brasil; CUT Pará; Fetagri Pará; Diocese de Cametá; Conselho Pastoral dos Pescadores/CPP; Universidade Federal do Pará/UFPA - Campus Tocantins/Cametá; Levante Popular da Juventude, Movimento dos Atingidos por Barragens - MAB, Organizações de Pescadores e organizações de Quilombolas da região, com o apoio de Solidarity Center/AFL-CIO, entidade sindical internacional e Associação de Apoio às Comunidades Amazônicas.