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Dono de fazenda de arroz de Uruguaiana (RS) que usava trabalho escravo é reincidente

Jorge Milano Bergallo, sócio-administrador da Agropecuária Santa Adelaide, foi até condenado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2020, mas pena prescreveu

Publicado: 29 Março, 2023 - 12h34 | Última modificação: 29 Março, 2023 - 18h21

Escrito por: CUT-RS

MPT / Divulgação
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trabalhadores resgatados em plantação de arroz

Um dos donos de uma fazenda de arroz, em Uruguaiana, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, que está sendo investigado após o resgate de 54 trabalhadores em situação análoga à escravidão em 10 de março, é reincidente. Ele já foi até condenado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelo mesmo crime previsto no artigo 149 do Código Penal, mas a execução da pena prescreveu.

Trata-se de Jorge Milano Bergallo, ainda hoje sócio-administrador da Agropecuária Santa Adelaide, conforme informações registradas no CNPJ da Receita Federal, segundo reportagem na edição desta terça-feira (29) do jornal Zero Hora, de Porto Alegre.

Ele exercia a mesma função entre janeiro e março de 2009, quando o Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em fiscalização na Santa Adelaide, resgataram dois trabalhadores que estavam atuando em Trabalho análogo ao escravo no carregamento e no empilhamento de madeira.

O MTE confirmou que as fiscalizações de 2009 e de 2023, ambas com resgate de trabalhadores, ocorreram na mesma fazenda Santa Adelaide, em Uruguaiana.

Trabalho degradante, jornada exaustiva e alojamento sem banheiro

Considerando que o MPT e o MTE atuam na esfera trabalhista, o Ministério Público Federal (MPF) deu continuidade ao caso na esfera criminal, denunciando Bergallo pela prática do crime de redução dos trabalhadores à condição análoga à escravidão, usando duas normas previstas em lei para essa classificação: situação degradante de trabalho e jornada exaustiva.

A denúncia foi recebida pela Justiça Federal em abril de 2011. Na ocasião, os trabalhadores ficaram por dois meses em um barraco construído com tábuas e lona, tomado por frestas, com telhado de zinco e palha, na propriedade rural.

Eles trabalhavam de domingo a domingo, recebiam menos de um salário mínimo, não tinham registro de emprego em carteira nem direito ao vale-transporte. O alojamento não tinha banheiro ou mesa para refeição. Também não havia água potável.

Primeira condenação em 2016

A sentença da primeira instância foi concedida em 2 de junho de 2016, sete anos após o resgate dos trabalhadores. O proprietário da fazenda foi condenado por manter trabalhadores na condição análoga à escravidão.

A pena foi estabelecida em dois anos e dois meses de reclusão, em regime aberto, substituída por multa e prestação de serviços à comunidade.

Bergallo apelou ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), mas não obteve sucesso. A decisão foi mantida em 7 de fevereiro de 2018.

Segundo o desembargador João Pedro Gebran Neto, "as fotografias que compõem o relatório de fiscalização bem demonstram a situação de moradia dos obreiros, que eram alojados em barracos incapazes de protegê-los das intempéries, além de possibilitar a entrada de insetos e outros animais".

Acompanhado da maioria, o relator avaliou que foi "plenamente possível a verificação do crime imputado" e "comprovada a autoria, a materialidade e o dolo".

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STJ mantém condenação em 2020, mas execução da pena prescreve

O fazendeiro recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, onde a condenação foi mantida, em agosto de 2020, com reforma da pena final para dois anos e quatro meses de reclusão.

No entanto, o ministro Joel Ilan Paciornik, do STJ, determinou que havia ocorrido a "extinção da punibilidade", na medida em que, diante do tempo de pena, a pretensão punitiva se encerraria em quatro anos.

Para calcular a prescrição da punibilidade, o magistrado considerou individualmente a pena-base para cada um dos dois delitos praticados, sem somá-las, fixada em dois anos. Por causa disso, o prazo de aplicação da sanção expirou em quatro anos, de acordo com a previsão do Código Penal.

Como a denúncia do MPF foi recebida em abril de 2011 e a condenação em primeira instância veio em junho de 2016, passaram-se pouco mais de cinco anos, levando à prescrição da execução da pena. O caso teve trânsito em julgado no STJ em agosto de 2020.

54 trabalhadores resgatados em 2023

No último dia 10 de março, a fazenda Santa Adelaide foi novamente alvo de operação de resgate de trabalhadores em situação análoga à escravidão. Desta vez, a ofensiva alcançou também outra propriedade, a estância São Joaquim, igualmente em Uruguaiana.

Após a fiscalização, foram resgatados 54 trabalhadores na Santa Adelaide, que atuavam no corte do arroz vermelho, um inço que cresce mais do que o grão cultivado e limita o rendimento das lavouras. 

Os homens trabalhavam sem equipamentos de proteção individual, não dispunham de banheiro ou local para refeição e tampouco tinham lugar para acondicionar a comida. Havia 10 adolescentes trabalhando na Santa Adelaide.

 

Acordo com MPT

No dia 21 de março, a Santa Adelaide assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) emergencial com o MPT, assumindo o compromisso de pagar uma indenização de R$ 228,9 mil aos 54 trabalhadores que atuavam na propriedade a título de verbas rescisórias.

O MPT também inseriu no acordo uma cláusula para que os proprietários custeiem o atendimento médico do adolescente que, após sofrer um acidente com um facão, perdeu parcialmente os movimentos do pé.

O documento estabelece que a fazenda se responsabiliza por despesas médicas, hospitalares, fisioterápicas e, se necessário, cirúrgicas, até a pronta recuperação do jovem.

Já a reparação de danos morais será apurada pelo MPT posteriormente, dando continuidade à averiguação da responsabilidade de todos os elos da cadeia produtiva envolvidos no ato ilícito, o que inclui também os agenciadores, chamados de “gatos”.

Na Santa Adelaide, assim como na estância São Joaquim, o MPT investiga os resgates de trabalhadores e a empresa compradora do arroz colhido, a multinacional Basf.